Postcards from Greece #21 (Thessaloniki)

«Se um dia alguém perguntar por mim…»

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ouvi hoje, passava pouco das 10 da manhã, no café ‘Os Piratas’, aqui na esquina da rua de São Nicolau com a Rua de São Demétrio. Chovia torrencialmente e mal saí de casa fui beber um café antes de apanhar o 16, por causa da chuva, para ir para a AUTH. Lá dentro estava quentinho e o café era menos mau. A senhora ao balcão estava com cara de poucos amigos e bebericava qualquer coisa. A música estava baixa e era variada. Vi um cinzeiro em frente da senhora do balcão e pedi um para a mesa. A senhora tira o vaso das flores de dentro de um potezinho verde alface, que estava a enfeitar a mesa e diz-me para por a cinza ali.

Fiquei espantada com aquilo, com aquele cinzeiro original, digamos assim. Um cinzeiro onde se poem flores? Na verdade nem eu, nem ela, nem ninguém deveríamos estar a fumar ali, nem a por cinza e beatas em cinzeiros que são vasos de flores. É ilegal. Mas é a Grécia. Estava a pensar nisto quando começo a ouvir o Salvador Sobral a cantar o Amar pelos Dois. Claro que comecei imediatamente a cantar, de tal forma que a senhora do balcão chegou mesmo, no meio da sua cara de poucos amigos, a esboçar um sorriso. Foi a primeira vez que ouvi português fora de casa, desta vez na Grécia. Não sei quantos portugueses existirão em Salónica. Vi algures num blog que são pouco mais de cinco dezenas. Mas nunca me cruzei, até ver, com nenhum. Não que queira ver portugueses, evidentemente, que portugueses já eu vejo até demais na minha vida normal, por assim dizer. E vir a Salónica para ver outros portugueses, digamos que seria tempo mais ou menos mal empregado. Mas pode haver exceções, obviamente.
Com a canção do Salvador Sobral na cabeça apanhei o 16, que me deixou quase em frente da Faculdade de Agricultura. Continuava a chover muito e estava um frio de rachar, um frio como ainda não tinha apanhado aqui. O meu gabinete que, como já disse, é basicamente a biblioteca, estava gelado como um frigorífico. O aquecimento está estragado, andam a arranjá-lo em toda a faculdade. Há um aparelho de ar condicionado que não funciona muito bem, de maneira que fico ali a arrefecer. A certa altura tenho de vestir o casaco, a minha doudoune quentinha, que o ano passado em Paris foi a minha salvação e, palpita-me, sê-lo-á novamente aqui, para poder continuar a trabalhar ali. Às 17h30 mais coisa menos coisa, desisto. Assim como assim, já todos tinham saído por volta das duas da tarde. O campus está ainda iluminado e com bastantes pessoas. Não me parece nada perigoso, ao contrário do que me dizem no Departamento. De toda a maneira não penso arriscar a sair muito mais tarde que esta hora de hoje.
Já não chove mas está muito frio. Tanto que nem pensar regressar a pé. Apanho o 16 e dou uma volta enorme, mas não importa. Dentro do autocarro está quente e deixa-me passado quase meia cidade, praticamente à porta de asa. A casa cheira a limpo, porque a Sotiria veio limpar. Já não me lembro da música que ouvi hoje de manhã há muito tempo. Ligo o aquecimento e vejo a minha casa verdadeira, lá longe, e fico também mais quentinha por dentro.
Amanhã estará mais frio. Não penso sair desta casa enquanto não arranjarem o aquecimento da Faculdade, ou até aquecer o tempo, coisa que, diz-me a aplicação do telemóvel, acontecerá na quarta-feira. Hoje não há fotografias, amanhã provavelmente também não. Está demasiado frio para tirar as mãos dos bolsos e por o nariz de fora. À falta de fotografias deixo o Salvador, que também trauteio neste momento, a ver se me esqueço do frio.