Visto à distância

Fora do país, chegam-me ecos sobre uma suposta polémica em torno da eventual renovação de mandato da Procuradora-geral da República, Joana Marques Vidal. Lendo o Expresso, fica-se com a sensação que o PR e o PM andam às turras. Já segundo o JN, nada se passa. E segundo o próprio PR, também não. “Até ao momento em que tiver de exercer o meu poder constitucional, o tema não existe. O PR não se debruçará sobre o assunto um minuto, nem sobre ele dirá o que quer que seja”, afirmou Marcelo em declarações à SIC.

Visto à distância, isto parece ser mais uma tentativa para criar uma intriga entre Costa e Marcelo. Mas poderá dar-se o caso de apenas não chegarem até aqui os ecos devidamente ampliados. Uma coisa é certa, o mandato da PGR dura seis anos, diz a Constituição, e caberá ao PR nomear o/a PGR sob proposta do Governo. É a vida. O resto é politiquice, daquela de quem não tem assunto para trazer ao país, procurando viver de tretas que apenas interessa à clique que vive das nomeações.

Pelo caminho, aproveitem para ler a crónica de Ferreira Fernandes titulada “Escândalos para tansos“. Para huguinhos, diria eu.

Tendo-lhe sido perguntado, em entrevista na TSF, a ministra da Justiça, Francisca van Dunem, respondeu: “A Constituição prevê um mandato longo e um mandato único, penso que era essa a ideia subjacente à criação [do mandato] e portanto na perspetiva da análise jurídica que faço há um mandato único e um mandato longo.” Falava-se do mandato do procurador-geral da República. Lembro que a Constituição diz (artigo 220.º, 3.º) o seguinte: “O mandato do procurador-geral da República tem a duração de seis anos (…)” Ora bem, estava montada a minhoquice do dia (pois estava já esgotada a do Centeno, o maganão que papava jogos no camarote Benfica a troco de apagar os IMI do filho do dono do camarote. [Ferreira Fernandes, DN, 10/01/2018]

Onde é que já se viu, alguém emitir opiniões fundamentadas. Que escândalo! Investigue-se.

Entretanto, o Mirone conhecido por observador tem feito uns títulos sobre o “verdadeiro momento Watergate da democracia portuguesa”, como lhe chama o dizedor de coisas Rui Ramos. Para quem também assina como historiador, não lhe ficava mal procurar inteirar-se sobre o que foi o escândalo Watergate. Mas um título sonante tudo perdoa. E qual é o grande assunto, merecedor de tais parangonas? Parece que a Constituição não impede a renovação do mandato da PGR. Mas, acontece, que também a tal não obriga. Não será má ideia olhar para a lei.

É só clicar nas imagens, não custa nada.

O articulista Rui Ramos tece um enredo sobre obstrução de justiça com base nas suas suposições. Tem algum facto? Não. Escreve ele que “[s]e em Portugal impera a lei, ou apenas o arbítrio da oligarquia — eis o que podemos descobrir este ano.” E resulta esta espantosa observação de se vir a aplicar a lei.

A continuar assim, vamos ter dois anos de intriguinhas.  Costa e companhia agradecerão.

Comments

  1. Ohnidlan Iur says:

    “Em política, o que parece é”.
    António Oliveira Salazar.

    O que o Minstra disse ontem, não foi inocente. Quem pensar o contrário, a meu ver, está porofundamente enganado. E até foi Rui Rio que deu à ministra a oportunidade de se manifestar sem receios. Ou será que um candidato à liderança do maior partido, agora na oposição, se pode manifestar, e a ministra não?
    Acrescento, que mesmo a esta distância, concordo com um único mandato para a/o PGR. Independentemente de ser esta, ou outro qualquer. Discordo no entanto da ideia peregrina que se tem vendido, de que esta Senhora enfrentou os poderosos. Tretas! Não vi ainda nenhum deles preso. E não estou a falar dos mais recentes. Falo apenas daqueles, que andam na ribalta vai para dez anos, como os do BPN e do BPP. Eu, como provavelmente a maioria dos portugueses, nem os quereria presos, porque só vão é dar mais despesa. Queria é que os obrigassem a ressarcir os outros contribuintes, por exemplo, na personalidade jurídica do Estado, devolvendo tudo o que roubaram à Autoridade Tributária e Aduaneira.
    Ora, Joana Marques Vidal está para o PSD, digo lá o que disserem, da mesma forma que Pinto Monteiro estava para o PS. E para mim não há volta a dar-lhe. Foram ambos, e cada um para seu lado, cartas ocultas de um baralho bem escondido dentro da mais alta magistratura, em que Presidentes da República não são de todo alheios, mesmo fazendo-se de sonsos, e que, tentaram com decisões suas, condicionar o processo politico. Dizer que a PGR não está politizada, já, mas pode vir a estar, apenas porque se prolonga o mandato, é ser muito benevolente com uma justiça que chafurda há muito dentro da luta politica. A própria reconhece que um novo mandato lhe retira alguma capacidade de distância dos factos ocorridos.

  2. joão lopes says:

    quando é que se faz um fact check ao mirone(eh,eh,eheh)?outra:quando é que o Explicador ,explica o mirone? ou qual o objectivo do mirone e quem paga? e já agora,quando é que ensinam a matos a escrever?

  3. As leis, para alguns, são como a reprodução de árvores, com a agravante que entendem que todas, como a oliveira, pegam de estaca e dão frutos. A lei diz que o mandato do titular em procurador-geral da República tem a duração de 6 anos. Tal significa que, do ponto de vista do legislador e, certamente, pela especificidade da função, não seria recomendável o seu prolongamento para além desse período de tempo; por outro lado, tal como está escrito, ao admitir essa hipótese, ter-se-ia de aceitar também – descontando as restrições colocadas, por exemplo, pela idade – a possibilidade de estar a assinar um contrato sem fim à vista; a caminho de uma situação, tipo Governador do Banco de Portugal. Mas não! Como até, por vezes, algumas árvores, por condições especiais, até acabam por pegar de estaca e dar frutos, nada melhor que criar essas condições, na esperança que tal aconteça. Aliás, à semelhança do que acontece no geral, onde a estaca que é a lei, começa pelo empenho e desempenho dos seus agentes (procuradores e juízes) a desabrochar e a transformar-se em árvore frondosa e quase impenetrável; por vezes, igualmente, em certos quintais, a dar frutos completamente inesperados – quiçá, de ramo resultante de enxerto lá colocado pelas jurisprudências e variegadas interpretações!

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