A maioria dos clubes foi erguida por massas e estas devem continuar a manter poder sobre as instituições, por muito difícil e instável que por vezes isso possa ser, pois petrodólares e fundos de investimento não são a minha praia.
E isto não se mercantiliza!
A simples proposta é já uma provocação inaceitável. Tal seria o ponto máximo da mercantilização do futebol e juntaria numa competição corporações e não clubes, representadas por prestadores de serviços e não jogadores, com onzes liderados por celebridades e não capitães. Tudo para um evento e não num jogo, servido a consumidores e não adeptos, que dão ratings a estádios sem os sentir como a sua segunda casa e aonde vão para a selfie e menus standardizados que pecaminosamente trocam pela bifana regada com mini. No final, avaliam os craques pelos posts nas suas redes sociais e não pelo seu suor em campo. Consumidores travestidos de adeptos que rapidamente trocarão de clube se o outro lhes oferecer um voucher mais valioso. Falso, tudo isto soa a falso. Isto não é futebol.
Se o empreiteiro Florentino Perez quer fazer dinheiro, está no seu direito. Mas eu sugeria-lhe antes que aproveite a boleia do foguetão do Elon Musk e que vá construir casas para Marte, levando também com ele o Sr Glazier do United e os demais CEOs que se juntaram a esta proposta. Podem até aproveitar a colonização do planeta para lançar novos clubes, fazê-los crescer do nada e explorar um mercado virgem pelo qual tanto salivam. Dá trabalho, mas é a vida.
E o que é que o jogo FC Sheriff Tiraspol contra Cercle Sportif Fola Esch tem a ver com isto? Neste jogo, os moldavos pobres eliminaram os luxemburgueses ricos. Nessa noite, acredito que os adeptos moldavos terão celebrado efusivamente e sonhado com a possibilidade de ver uma equipa do seu país pisar o Santiago Bernabéu, a Allianz Arena ou outro santuário do futebol. Viveram com a esperança numa presença na maior competição de clubes e com uma participação meritória alcançada pelos “seus” jogadores e não por causa de um wild card ou dos préstimos de uma agência de lobbying. Uma semana depois, na segunda eliminatória, o FC Sheriff Tiraspol acabaria eliminado pelo Qarabag do Azerbaijão e o sonho dos moldavos era adiado. Adiado, se a Champions League se mantiver. Porque se o caminho calha a ser o da Superliga, o sonho dos moldavos não fica apenas adiado. Ele será cancelado. O deles e o de muitos europeus.
O único que ainda podia surpreender já não era nenhum desses, só mesmo o outro vermelho. Mas nem esse, sinal de mais uma indústria que se alimentou de especulação, até graças a emires e oligarcas que andamos a alimentar, até correr mal. Se ao menos os chineses gostassem da bola, ainda se alimentava mais um bocado.
Azarito, tá tudo falido, e a falta de circo juntar-se-à à falta de pão nos burgos ordoliberais. Tempos interessantes, diria quem ganha em não se meter nisto.
Concordo com o Marques, discordo do Franzini.
Todo o desporto profissional é nocivo, o futebol leva a palma. Quanto maior o clube, quanto mais profissional a ‘gestão’, leia-se mama, mais nocivo se torna e menos falta cá faz. Pão e circo.