A luta dos professores

Os professores são, provavelmente, aqueles que mais têm sido prejudicados, não só, em termos de carreira.

Outras profissões também têm sido desprezadas, sim. Mas, no caso dos professores estamos perante uma clara opção de subdesenvolvimento, de uma opção de desvalorizar o ensino, a cultura, o conhecimento, de modo a moldar um povo menos demandante, porque mais ignorante e sem matriz de exigência.

E isto, torna tudo mais grave.

Até por isso, os professores têm vindo a ser desprezados: valorizar o papel do professor na sociedade é valorizar o conhecimento e a cultura de modo a construir gerações mais esclarecidas e, assim, mais exigentes. E isto não interessa muito a quem quer manter os moldes de exercício do poder político que desde a monarquia até hoje não mudou muito em termos de mentalidade.

Exemplo disso, é o fraco investimento na ciência, nas artes e no conhecimento até pela nossa burguesia, mesmo nos píncaros das riquezas dos Descobrimentos, salvo muito raras excepções. Em razão inversa ao resto da Europa, com relevo para a Flandres, Itália, França e Espanha, por cá valiam os “investimentos” em ostentação, fossem farpelas, jóias, quintas, palácios, coches ou amantes (à hora ou por conta).

Ao contrário, em cada conjuntura, a preocupação maior foi sempre doutrinar, mudando-se o teor do breviário de acordo com os ventos do momento.

Não são à toa os negócios e os interesses privados à sombra protectora do Estado e a sorver o erário público; nem os lucros privados com prejuízos públicos. São, antes, manifestações e efeitos dessa mesma mentalidade de pequenez, do “rouba mas faz obra”, do “se estivesse lá, também comia”, do “não faças ondas”. Tal como o primado da habilidade sobre o saber, da esperteza sobre a inteligência, da cunha sobre o mérito.

Hoje, uma multidão vai para a rua para manifestar a sua indignação contra a descriminalização dos maus-tratos a animais. Mas, não vai pelos constantes escândalos de autênticos sorvedouros do dinheiro de todos para riqueza e proveito de poucos, da banca (BPN, BES, BANIF, etc) à TAP (uma vez companhia de bandeira que tem de ser do Estado, para milhares de milhões de euros públicos depois já estar na calha para ser privatizada). Ou por todos os famosos mega-processos que não deram em nada, a não ser tornar impune o crime que enriquece uns poucos à custa da delapidação do país e respectiva sobrecarga de impostos.

Não é, pois, difícil perceber que este longo percurso de condicionamento mental, tem resultado. E não é de agora. É de há séculos. Pois muito antes de Pavlov, já se percebera as vantagens dos condicionalismos. Pôr cães a salivar a toque de sineta, é brincadeira de meninos, face a tantos milhões de cobaias humanas mentalmente condicionadas à submissão.

A luta dos professores, não é apenas de classe profissional, como se quer fazer crer. É muito mais do que isso.

É uma luta contra muitos séculos de instauração de uma mentalidade desprezível e castradora. Uma luta contra uma mentalidade tão terrífica quanto a realidade de que para espíritos e mentes amputados, não há próteses que valham.

É uma luta civilizacional.

Comments

  1. francis says:

    nunca entendi porque é que em 40 anos nunca ninguem, convidou o Nogueira para ministro da Educação. Tenho a certeza que ele, com a batata quente nas mãos, resolveria TUDO o que aflige essa classe profissional com maior devoção ás baixas medicas. Ás verdadeiras e ás falsas.

    • Paulo Marques says:

      Sabe, sabe. Não andou nas juventudes partidárias de bem, nem tem a formação profissional em propaganda neoliberal.

  2. Luís Lavoura says:

    Os professores são, provavelmente, aqueles que mais têm sido prejudicados, não só, em termos de carreira.

    O mal da carreira de professor é, precisamente, o facto de ela existir.

    Por que razão deve um professor com 60 anos de idade ganhar duas vezes e meia aquilo que ganha um professor com 25 anos de idade? É injusto! O professor de 60 anos tem mais experiência, é certo – mas também tem menos energia, menos vontade (e capacidade) de trabalhar duramente.

    Aquilo que é preciso acontecer à carreira dos professores é ela ser, em grande parte, desmantelada e simplificada – no sentido em que todos os professores passem a ganhar, mais ou menos, o mesmo.

    Temos que deixar de ser um país em que ser velho é um posto!

    • Paulo Marques says:

      Rais parte a peste grisalha, que ainda por cima vai receber pensão a seguir!

    • Ana Gualberto says:

      “O mal da carreira de professor é, precisamente, o facto de ela existir.”
      Claro, como é que nunca ninguém tinha pensado nisto? Claro que o sonho de qualquer pessoa é trabalhar durante 40 e tal anos e ganhar aos 60 o mesmo que ganhava aos 20. É perfeito! Eis aqui a resposta à pergunta de um milhão de euros: Como atrair os melhores para a profissão de professor?
      Também podíamos matá-los. Quando os professores chegassem aí aos 50 anos, 55, vá, dava-se-lhes um tiro e arrumava-se a coisa. Poupava-se um dinheirão em reformas, que sempre se podia gastar noutra coisa mais de encher o olho.

  3. Anonimo says:

    Os polícias, médicos, enfermeiros, funcionários públicos em geral, do privado em particular, jovens e idosos discordam dos professores serem os mais prejudicados.

    • Paulo Marques says:

      O problema de quem trabalha é andar a medir a pilinha de quem é mais prejudicado que o outro, enquanto são todos cada vez mais. Continuem.

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