A mercantilização da medicina e a gestão economicista da Saúde

transformam os hospitais em linhas de montagem de fazer doentes para a morte. Mal chegam e lhes são retiradas as roupas, os doentes (e não disse clientes) «começam a perder a sua identidade; passados uns dias, mergulham num corpo passivo». Nos EUA, como em Portugal. Ora leiam.

Comments

  1. José Meireles Graça says:

    O texto, palavroso e desnorteado, para o qual o post remete, diz alguma coisa sobre desumanização do exercício da medicina, mas não suporta consistentemente nenhuma conclusão sobre “gestão economicista da saúde”. E tanto pode servir para defender o que a Sarah – e quase toda a gente – defende, que é a medicina exercida por funcionários públicos para contribuintes, como o que eu defendo, que é a competição entre serviços e médicos para conquistar e conservar clientes.

    • Sarah Adamopoulos says:

      *Competição* e *clientes* são palavras que justamente definem o estado de degradação a que chegaram os cuidados de saúde – públicos uns e privados outros. Lamento que tenha vindo aqui para desqualificar um texto relevante para a compreensão da lamentável experiência hospitalar de tantos e da relação médico/doente que lhe subjaz: médicos extenuados pela *competição* a que os obrigam administrações compelidas à austeridade ou à ganância, diagnósticos ao lado, indiferença, mediocridade.

      • José Meireles Graça says:

        Se por desqualificação se refere à expressão “palavroso e desnorteado”, mantenho. O autor diz pouco com muito, em vez de muito com pouco, que seria o ideal. A frieza do trato por parte de alguns (a maioria) dos médicos e pessoal auxiliar pode ser acentuada pela pressão a que são submetidos pelas administrações, por sua vez coagidas a não gastar recursos que não existem. Mas o principal factor é, e será sempre, não terem diante de si um cliente que os ajuda a viver, mas um contribuinte que prefeririam não ter que aturar. O mesmo fenómeno pode acontecer em instituições privadas, sobretudo se grandes, mas aí há a possibilidade, e o incentivo que a concorrência daria, se existisse realmente, para melhorar. Num serviço público – não.

    • António Fernando Nabais says:

      Já eu defendo que a Medicina deve ser exercida por funcionários públicos em benefício dos doentes e não dos contribuintes. Para além disso, a aplicação de palavras como “competição” ou “competitividade” a áreas como a Saúde é uma perversão. Perdoe-se-me a autocitação: http://osdiasdopisco.wordpress.com/2014/02/10/o-que-e-o-melhor-hospital-do-pais/ e http://aventar.eu/2014/08/12/o-campeonato-dos-hospitais/.

      • José Meireles Graça says:

        A competição existe na área da saúde e em alguns casos o Estado está em boa parte, felizmente, ausente, como na investigação farmacêutica (salvo na fase de aprovação); não é possível tratar os doentes com absoluto descaso dos interesses dos contribuintes porque estes em algum momento cessam de poder ser mais espremidos; a perversão não consiste em haver competição – consiste em não haver; competição entre hospitais públicos segundo critérios mais do que discutíveis, com as correspondentes simplificações jornalísticas, sempre é melhor do que nada.

        • Competição na saúde parece-me muito saudável.
          – Ali na clínica xpto fazem umas endoscopias com um molho fabuloso.
          – Acredito, mas a colonoscopia da optx é que me enche as medidas.
          Enfim, muito dialogante. Infelizmente o problema dos doentes não é bem o de serem tratados como clientes, mas mais o de não morrerem. E de serem tratados por igual, e não de acordo com o cartão de crédito ou seguro de saúde. Eu cá prefiro antes de mais não adoecer, mas quando acontece confio num médico que é pago para servir utentes. Os merceeiros guardo para outras ocasiões.

        • António Fernando Nabais says:

          Se é certo que não estamos no patamar desejado, Portugal, nos campos da Saúde e da Educação, tem vindo a melhorar e convém não perder de vista que está a recuperar de dezenas de anos de atraso. Isso conseguiu-se graças à noção de serviço público (mesmo no privado): um médico tem a obrigação de tratar de doentes e um professor tem a obrigação de ensinar os alunos. Nenhum deles tem de andar a perder tempo a pensar em clientes, contribuintes ou competição. Dito isto, nada me move contra a existência de instituições privadas em ambas as áreas, desde que o serviço público seja respeitado. Defender que as instituições só funcionam bem se forem privadas e se concorrerem umas contra as outras é simplista.

  2. Sarah Adamopoulos says:

    Tentando arrumar algumas ideias: o texto para que remetem as curtas linhas do post foca-se nas *consequências* de uma prática médica que deixa muito a desejar. Refere especialmente a relação médico/doente, que perdeu várias das suas qualidades intrínsecas e que julgávamos eternas. Como seja a confiança (confiança por parte do doente, que entrega a resolução do seu problema de saúde nas mãos do médico em cujas capacidades confia), actualmente em grande crise, na sequência, também, de comportamentos eticamente muito questionáveis por parte de alguns médicos facilmente corrompidos pelas indústrias. Por outro lado, assistimos nos últimos anos a uma queda do estatuto social (lato senso) e poder do médico, cujo trabalho é hoje muito mais escrutinado, por sociedades em que a prática médica deixou de estar envolvida por uma aura demiúrgica que fazia dos médicos deuses – apesar do atraso formidável (ironizo) que a Medicina leva em tantas áreas, por falta de investimento em investigação. Relativa/ à Saúde Pública e Privada, dizer ainda que concordo com o Fernando Nabais: sobretudo se falando de Portugal, não restam nenhumas dúvidas de que tudo melhorou graças ao Serviço Público e a uma ideia de Estado constitucionalmente empenhado no desenvolvimento de uma população maioritariamente pobre e sem oportunidades de mobilidade social (aqui entra a Educação). Sem querer alongar-me muito mais: um médico não deve ser um mercador das suas competências, e nesse sentido não deveria encarar um doente como um cliente. Nem tudo na vida é negócio, mesmo que alguns ofícios se prestem a sê-lo, como é o caso.

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