Deus, Pátria, Família e Trabalho: a tetralogia da treta, por André Ventura, parte I – DEUS

Faltavam cinco dias para as eleições presidenciais. A caravana de André Ventura estava em Coimbra e parou na Igreja de Santa Cruz, onde jaz D. Afonso Henriques. Se o nosso primeiro viajasse na máquina do tempo até ao presente, e visse Ventura todo excitado a gritar “Viva a Espanha”, no comício de um partido político espanhol que faz propaganda eleitoral com montagens de mapas em que Portugal e as suas antigas colónias surgem anexadas pelo país vizinho, aplicar-lhe-ia, seguramente, o mesmo tratamento que aplicou à sua mãe. Portugal não se fez com palermas a gritar “Viva a Espanha” num arraial de gajos que nos veem como anexáveis. Mas deixemos isto para o capítulo sobre a Pátria e voltemos a Janeiro deste ano.

Cinco dias para as eleições, Ventura pára na igreja onde está sepultado o primeiro rei de Portugal e entra por ali adentro, com missa a decorrer, acompanhado pela sua esposa, dois ou três seguranças, um fotógrafo e um cameraman. Ventura entrou, fez o sinal da cruz, ajoelhou-se sobre o genuflexório, que aparentemente não sabe utilizar porque estava recolhido e recolhido ficou, rezou para as câmaras e ainda teve tempo de ouvir um fiel que participava na celebração dizer ao membro do seu staff que estava a filmar: “O senhor não se importa de parar de filmar? É que isto é a missa por alma da minha mãe”. Deus, a existir conforme assegura a mitologia, deve ter adorado este momento em que um político, que usa o ódio como arma de arremesso, instrumentalizou a fé católica para efeitos de criação de conteúdos de campanha para as redes sociais, a poucos dias de uma eleição presidencial à qual concorria. Repito: usou e manipulou a igreja e a fé para fazer posts para o Facebook.


Nos dias que se seguiram, a revista Sábado contactou uma fonte não identificada da igreja, que confirmou, ao contrário daquilo que já circulava nas redes, que Ventura não teria interrompido uma cerimónia fúnebre. Não é isso que ouvimos da boca do crente que se indigna, mas vale para perceber quem faz fretes à extrema-direita. A mesma fonte revelou que a visita havia sido combinada com a igreja, o que torna a situação ainda mais embaraçosa para todos. Ventura queria visitar a igreja a título oficial? Sim senhor, deve poder fazê-lo. Mas não a meio de uma cerimónia. E se a justificação se prendia com a disponibilidade de André Ventura, então temos uma igreja que opta por permitir que uma cerimónia seja perturbada por motivos de propaganda política no âmbito de uma campanha eleitoral, colocando os interesses da comunidade católica abaixo da agenda do líder do CH. Ninguém fica bem na fotografia. Mas fica claro que Ventura, que mente e difama Deus ao apresentar-se como seu escolhido, e ao qual algumas das principais figuras do seu partido se referem com termos messiânicos e expressões como “anjo da guarda”, é tão católico que é capaz de usar, distorcer e manipular os princípios mais basilares da religião católica para obter ganhos políticos pessoais. Se isto não é desrespeitar a religião católica e o Cristianismo em geral, não sei o que será.

Senão vejamos: no terceiro mandamento, inscrito nas placas que Deus entregou a Moisés, podemos ler o seguinte: não invocarás o santo nome de Deus em vão. Só por aqui, Ventura vai direitinho parar ao Inferno, por muito crente que seja, algo que parece pouco provável, a julgar pela forma como desrespeita a religião que diz professar. Até porque uso de Deus, neste contexto, não tem como finalidade a fé, as causas originais do cristianismo, ou sequer o desapego e desprendimento do materialismo (sim, eu sei, nem 1% o pratica. Mas desse 1%, 99% não usa a religião e a fé para angariar votos). Mais ainda quando é usado por alguém que lidera um partido estruturalmente autoritário, xenófobo e racista, pregador do ódio, da divisão e da discórdia. Deus, no CH, é um meio para atingir um fim, independentemente de haver quem acredite e quem não acredite nele no partido. E Deus, segundo reza a educação católica que tive, não é meio para coisa nenhuma. É o princípio e o fim de todas as coisas. Já o CH, e todos os partidos de extrema-direita, são a sua total negação. E um voto no CH é um voto num partido liderado por um punhado de pessoas que usam Deus e a religião para benefício próprio.

Comments

  1. Sérgio says:

    Há muita medicação para a azia
    Prepara-te porque dia 30 azia pode virar gastrite

    • POIS! says:

      Pois pois!

      Resta saber quem é que vai precisar de pastilhas. Quem vive da azia dos outros…

      De qualquer modo, em democracia, mesmo qualquer gastrite é temporária.

      Em democracia! Não noutro regime, por mais Venturoso que seja.

  2. Joana Quelhas says:

    O Programa do Chega começa assim:
    Primado da moral. O CHEGA filia-se à tradição civilizacional portuguesa, europeia e ocidental por pressupor que o primado moral da autorresponsabilidade antecede e determina tudo o resto na condição humana. No campo religioso, a autorresponsabilidade deriva da matriz milenar judaico-cristã e, no campo intelectual, deriva da matriz milenar greco-romana.

    O Ventura até pode não ser religioso e praticante (como eu própria não sou), mas o partido que representa respeita os sentimentos da maioria da população portuguesa que é católica. E isso vai consequentemente trazer-lhe votos.
    Mas o mais importante que o Chega trouxe À cena política portuguesa foi a possibilidade de se ser anti-comunista.
    O Chega abriu essa brecha. Hoje em dia já se pode adjectivar as teorias comunistas tal qual elas são. Isso era tacitamente proibido no nosso pais.
    Todos os comunistas tem medo dos partidos que respeitam a família, a tradição e a religião, pilares de qualquer comunidade. O respeito por essas instituições não é um mal , pois constituem os pilares de uma comunidade sadia.
    Mas então porque é que os comunistas tem ódio a quem respeita esses pilares fundamentais da nossa comunidade / nação / povo ?
    Porque os comunistas não gostam da nossa cultura nem da nossa sociedade.
    E porque não gostam da nossa cultura nem da nossa sociedade ?
    Porque eles querem uma outra sociedade, idealizada pelos seus “intelectuais” . E essa sociedade dirigida por mão de ferro por esses “intelectuais” será o paraíso sobre a terra .
    Mas para isso têm que destruir esta nossa sociedade que tanto odeiam .
    E eles sabem que para isso tem que destruir essas nossas instituições: religião , família, e as nossas tradições.
    É por isso tanto odeiam o Chega, daí este comportamento insultuoso e falso com que classificam as pessoas deste partido que apenas é um partido Conservador e liberal na economia.

    Joana Quelhas

    • POIS! says:

      Pois desta vez vou contestar à moda das quelhas…

      Mais uma que é discípula do Padreco Gonçalo Portocarrero de Almada!

      Isto para não ser exaustivo. É um palavreado deveras ridículo.

      Tenho dito!

    • Tuga says:

      “Primado da moral. O CHEGA filia-se à tradição civilizacional”

      Sim, principalmente a dar tiros de caçadeira a autocaravanas com 7 crianças la dentro

      É uma tradição mas não civilizacional

      • POIS! says:

        Sim, é a tradição civilizacional.

        Da caça ao forasteiro! O Viriato dizem que era especialista!

    • balio says:

      Acho uma certa graça a pessoas como a Joana Quelhas, que não são católicas mas defendem as tradições católicas… para os outros.
      É contraditório. Se uma pessoa não é católica, então não deve defender as tradições católicas. Acho eu…
      Aparentemente, para a Joana Quelhas o catolicismo é uma excelente religião… para os outros seguirem. Ela, não.
      Eu não sou católico, por isso considero todas as tradições católicas superstições sem sentido. De forma nenhuma as defendo, bem pelo contrário. Somente defendo a liberdade de as pessoas as terem e praticarem, mas de forma nenhuma defendo a sua bondade.

    • JgMenos says:

      Um bom comentário, que vale por si; mas largamente excede o que é devido como resposta a um aborto na construção lógica de um argumento.

      • POIS! says:

        Pois!

        Donde se depreende que a Dona Quelhas foi o primeiro ser na História a engravidar à conta de um aborto alheio.

        O espanto é tal que a todos espanta! Tudo é tão inesperado que ninguém estava à espera de tal esperar!

        A Ciência avança a olhos vistos mas as nossas almas ficam parvas!

      • José says:

        Aborto é o menos. Mas um aborto é o fim de alguma coisa, e Ásia caixa de comentários não é o princípio nem o fim de coisa alguma: apenas um lodaçal.

    • Paulo Marques says:

      Nem essa é a matriz cristã, nem esses são os valores portugueses, onde a maioria sabe tanto o que é genoflexório como o coisinho, porque põe lá os joelhos com a mesma frequência.
      Espero que fique explicado o ódio ao mito.

  3. Filipe Bastos says:

    Não sabia que tinha tido uma educação católica, Mendes. As minhas condolências.

    Que a religião tenha ainda tantos carn…seguidores é deprimente q.b.; que tantos tolerem ainda a Igreja, esse Everest de hipocrisia, é revoltante q.b.; mas que alguém possa ter como critério de voto a devoção à religião ou à Igreja subverte até a democracia.

    Isto se tivéssemos democracia para subverter, claro. Na falta dela, o que temos é uma partidocracia ainda mais podre, cuja carneirada direitista e religiosa se deixa agora enrabar por um pulha armado em beato. Como pessoa racional, ver isto de fora tem a sua piada. Como contribuinte desta choldra, nem por isso.

  4. Oh malta, já é tempo de deixar a cãzoada latir à vontade que a caravana segue sempre em frente. Basta de dar trela a rafeiros(as) que não valem o tempo perdido a dar-lhes nas orelhas. Apelo a que paremos de dar abébias a quem passa vida a repetir a cassete porque o único neurónio ainda a funcionar já não dá mais…

  5. Parem de dar palco a miseráveis

    • Tuga says:

      Tambem acho que sim. O Neonazi envergongado não merete tanta leria

  6. balio says:

    Mais um post a dizer mal do Chega.

    Vocês não são capazes de posts mais positivos, em que façam alguma proposta concreta, em vez de se limitarem a dizer mal do Chega?

    É que toda a gente diz mal do Chega, pelo que, dizer mal do Chega não é diferenciador.

    • Pior: com tanta coisa para pegar no Chega (tipo o Ventura de camuflado) continuam a bater na treta do mapa do Vox, que, como qualquer espanhol que se preze, se estão perfeitamente nas tintas para Portugal, que só serve para se comer bacalhau.

      • balio says:

        como qualquer espanhol que se preze, se estão perfeitamente nas tintas para Portugal

        Claro. Toda a Espanha está economicamente inclinada para leste. Toda a parte oeste da Espanha, com a possível exceção de partes da Galiza, é relativamente atrasada e é genericamente desprezada pelo poder central. Portugal é somente uma continuação dessa parte oeste da Espanha, sem grande interesse para o poder espanhol. Portugal não vale o esforço de a Espanha olhar para ele.

    • Filipe Bastos says:

      É verdade que passam a vida a malhar no Chega, como se o bandalho Ventura merecesse tanta atenção.

      Mas o que falta não são “posts mais positivos”, com Bambis e borboletas; o que falta é malhar mais no resto.

      Nada há de positivo nesta esterqueira pulhítica. A primeira e única proposta possível é começar a limpá-la; para isso há que perseguir e malhar esta canalha. A canalha toda.

      Que tal isto para ‘diferenciador’: em vez pulhitiquice, discutir como podemos responsabilizar os eleitos; como investigá-los ao cêntimo; como participar nas decisões relevantes.

  7. JgMenos says:

    Béu, Béu…
    A matilha sempre faz um corais de latidos para se tranquilizar pelo numero.
    Os posts sobre o Chega servem esse propósito, que tudo que se aproxima de um argumento é puro acidente.
    Mantenham-se nos insultos que é a vossa praia…

    • Paulo Marques says:

      Espelho meu, espelho meu, vai ali ao Cruz que contínua sem um depois do Costa o roubar.

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