As descobertas da direita portuguesa ou mesmo mundial

Quando o mesmo homem, num país, desempenha, em anos seguidos e alternadamente, as funções de Presidente da República e de Primeiro-ministro, dificilmente poderíamos falar em democracia consolidada ou mesmo em democracia. Vladimir Putin nunca foi flor que se cheirasse, tal como os oligarcas e mafiosos que o rodeiam e que andam pelo mundo a comprar clubes de futebol e empresas e casas e iates. Putin é um escarro tóxico que aprendeu muito do que sabe no mundo soviético, para, hoje, ser chefe de um bloco capitalista e imperialista, porque o primeiro implica o segundo, a cavalo de uma globalização inevitável e cavalgada por gente muito pouco recomendável, sempre salvaguardada, no entanto, por quantos defendem a pureza de um capitalismo imaginariamente assente numa aparência de meritocracia.

A direita portuguesa ou mesmo mundial descobriu, com a invasão da Ucrânia, que o Putin era mesmo mau. De caminho, aproveitou para continuar a normalizar o Chega, indignando-se muito com a posição equívoca do PCP (que consegue condenar e relativizar, ao mesmo tempo, a invasão russa), como se o PCP não tivesse, há muitos anos, posições equívocas sobre algumas ditaduras, usando de uma linguagem tortuosa para fugir a comentários sobre excrescências como a antiga oligarquia angolana ou a ditadura norte-coreana.

Aliás, o PCP e a direita portuguesa ou mesmo mundial andam eventualmente baralhados: o primeiro, diante de uma invasão criminosa (como a larga maioria das invasões), perde demasiado tempo a falar da NATO (que, na verdade, não é uma organização menos criminosa que o federação russa); a segunda quer transformar os habituais erros do PCP na análise da política mundial em ameaças à democracia portuguesa, como se esses erros fossem uma novidade (na realidade, os ataques da direita portuguesa e mesmo mundial aos comunistas portugueses fazem parte de uma alergia já velhinha, sempre latente) ou como se a democracia portuguesa não tivesse uma dívida para com o PCP pela luta contra o Estado Novo, mas especialmente pelo contributo para a democracia portuguesa em que vivemos.

A direita portuguesa ou mesmo mundial até poderá estar, em parte, preocupada com os ucranianos, mas este ataque desenfreado à esquerda portuguesa é só politiquice. Poderá fazer parte de uma estratégia de comunicação que queira pisar ainda mais essa mesma esquerda, enquanto tenta preparar a legitimação de alianças com o Chega (que, no mínimo, e curiosamente, está ligado a quem tem ligações fortes com Putin) – aproveito para relembrar: essa estratégia de comunicação, no dia 30 de Janeiro, fez com que muita gente de esquerda entregasse a maioria absoluta a António Costa.

Comments

  1. JgMenos says:

    O penso rápido do Chega para atenuar o escarro esquerdalho do verdadeiro e único socialismo.

    • António Fernando Nabais says:

      Ó menos do meu coração, “Escarro” será o título da tua biografia. Não tens nada que agradecer.

      • José Peralta says:

        Ó “menos”

        “Putin é um escarro tóxico que aprendeu muito do que sabe no mundo soviético, para, hoje, ser chefe de um bloco capitalista e imperialista”

        Ficaste tão dorido ! Porquê ?

        Porque o escarro tóxico Putin, financia a Le Pen, o Salvini, o Abascal, e o Ventrôlhas ?

        E desconheces que o escarro tóxico Putin, no mundo soviético, desempenhou a “putriótica” tarefa de agente do KGB, com o “pelouro” do Estrangeiro ?

        Tu nem sequer queres ver que, aqui, só serves para …escarrador ?

      • POIS! says:

        Tem a certeza, Nabais, que o Menos não está aí próximo? Sim, próximo de si!

        Será que o Menos terá adquirido, por vias místico-salazarescas, o dom da ubiquidade?

        É que cada vez que você comenta alguma coisa que meta a Venturosa Legião ele reage como se estivesse a queimar-lhe o cú!

        Isto é muito esquisito! Eu não acredito em bruxas, mas o certo é que, ainda anteontem, quis comprar uma vassoura e estavam esgotadas!

        • António Fernando Nabais says:

          Porra, Pois! Agora, até fiquei com medo! Já fui fazer uma ronda à casa toda e fechei portas e persianas. Isso da “reacção não passará” é muito bonito, mas, com esta malta, qualquer frincha serve!

    • Paulo Marques says:

      Ó filho, se queres “verdadeiro e único”, ainda te faltam uns quantos a bater a economia dos teus meninos só nos últimos anos.

  2. balio says:

    Quando o mesmo homem, num país, desempenha, em anos seguidos e alternadamente, as funções de Presidente da República e de Primeiro-ministro

    Refere-se a Cavaco Silva?

    • António Fernando Nabais says:

      O Cavaco não é gente das minhas preferências, mas, ainda assim, teve um percurso semelhante ao do Mário Soares. Nenhum deles, no entanto, andou a alternar entre cargos.

  3. Fernando Moreira de Sá says:

    Grande Nabais, existe uma direita que não suporta o Chega, a direita anti fascista e anti comunista. E até vou citar com adaptações:

    Sim, felizmente sou anti-nazi primário, secundário e, como tenho estudos, terciário. Para o comunismo é o mesmo. De nada. A propósito sou a favor dos comunistas dizerem o que lhes aprouver e se organizarem como eles entenderem. Chama-se democracia.
    Eu sei que eles não entendem.

    • António Fernando Nabais says:

      Grande Fernando, eu, apesar de ter poucos estudos, sou terciário em quase tudo – isso leva-me a acreditar que haverá pessoas de direita que não suportam o Chega e que há muitos comunistas portugueses que sabem muito bem o que é a democracia.

    • José Peralta says:

      Fernando Moreira de Sá

      Eu também não suporto o CH. e intuo que hajam muitos comunistas portugueses que sabem muito bem o que é a democracia.

      Com uma “pequena” diferença : Por medo de discutirem ou pôrem em causa (no Comité Central) os dogmas “indicutíveis” da vulgata comunista de 1917, calam-se prudentemente, para não sofrerem a “purga” como os “renovadores”, muitos dos quais, na luta contra o fascismo, sofreram a prisão a tortura, a clandestinidade e emigração forçada, o opróbrio !

      E o Comité Central (constituido depois do 25 de Abril,além de alguns históricos sobreviventes da “velha guarda”, por alguns militantes recentes, que não passaram por tais “provações”) nem esse passado respeitou…

Trackbacks

  1. […] de Novembro, relembro que a normalização do Chega, através das tretas da falsa equivalência, levou a que muitos votantes de partidos de esquerda tenham dado a maioria absoluta ao PS – se houve calculismo, houve, portanto, inabilidade. Se se tratar apenas uma questão de fé, […]

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