Quem não for trans, ponha o dedo no ar

Numa certa ordem do dia, está a recusa de Miguel Sousa Tavares em casar com a vencedora do concurso de Miss Portugal, recusa essa secundada por José Alberto Carvalho. Não sei, aliás, se podemos falar em recusa, porque, que se saiba, nenhum dos dois foi pedido em casamento pela pessoa com quem não querem casar. No mundo tantas vezes incerto das relações amorosas ou conjugais, ter uma recusa como antecipadamente certa não deixa de ser refrescante. Deste modo, Marina Machete já sabe que não vale a pena insistir com estes dois senhores e assim não se perde tempo.

Segundo Miguel Sousa Tavares, Marina é o resultado de uma operação e não propriamente uma mulher. Devo dizer que penso muito pouco sobre essências, por ser um relativista empedernido, sempre na dúvida do que é isso de ser e de não ser. A biologia é um facto, mas isto de ser humano não é só biologia. Os órgãos sexuais existem, como existe o cérebro, como existe a sociedade, com todos os seus fechamentos e aberturas. [Read more…]

Ser Mulher

Apesar de isto não ser nada mais que algo não essencial no enorme leque de problemas que enfrentamos por estes tempos, acho que é altura de chamar os “bois pelos nomes” mesmo numa questão apenas acessória. Até porque não deixa de ser simbólica e demonstrativa de outras questões bem mais relevantes.

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A representação e a representatividade

Keyla Brasil, artista trans, invadiu o palco de uma peça no Teatro S. Luiz, protestando contra aquilo que denomina de ”transfake” (uma expressão, julgo, importada dos Estados Unidos da América), por um actor, que se identifica com o género masculino, estar a interpretar, na peça, o papel de uma mulher trans.

O argumento das activistas centra-se na questão da representatividade e do “lugar de fala”, exigindo, e bem, que mais artistas trans sejam contratadas para o teatro, artes performativas e para outros trabalhos onde, sabemos, há ainda discriminação e desigualdade no acesso; argumentam, também, e é aqui que a minha discórdia se apresenta, que só actores ou actrizes trans possam representar os papéis ficcionais de personagens trans. Nada mais errado, a meu ver, pois a representação não é um sinónimo de representatividade. Vejamos as definições dos dois conceitos, aplicados à questão em discussão:

1 – Representação: (teatro) “exibição em cena”, “espectáculo teatral”, (cinema, teatro, televisão) “desempenho de actores; interpretação; actuação”;
2 – Representatividade: “qualidade do que é representativo”; Representativo: “que representa”; “que envolve representação”; “constituído por representantes”.

Analisando as duas expressões, podemos concluir que as mesmas se inter-ligam. A representação pode ser representativa de alguma realidade, pode é ser, apenas, representação e, como tal, o teatro reveste-se apenas da premissa da interpretação de textos e personagens, não sendo raras as vezes que uma estória, sendo ficcional, retrata partes da realidade em que nos inserimos. A falta de representatividade no que à presença de pessoas trans na vida social e no mundo laboral, as suas dificuldades no acesso a direitos que são comuns, ou deviam ser, a todos os Seres Humanos, é real e não a podemos escamotear. [Read more…]

Transparência

Os nossos políticos não se dão muito bem com a transparência. Digamos que não lhes está no sangue, não compreendem o que isso é. Ou não querem compreender. Isto explica o facto de serem poucas e tímidas as tentativas de mudar o estado de coisas.

Felizmente, os movimentos de cidadania multiplicam-se, um tema constante desses movimentos é exactamente a transparência.

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