O pobre da Jonet

O pobre também é uma pessoa e as pessoas são todas diferentes umas das outras, normalmente para pior. Há pobres e pobres, naturalmente, mas já lá iremos.

Para os privilegiados como eu, o pobre é uma abstracção que, às vezes, sai da sombra das ideias distantes e aparece nas esplanadas, a fazer aquelas coisas de pobres, como não ter tomado banho ou pedir dinheiro, que é algo que os pobres insistem em não ter, como o banho.

A consciência do meu privilégio obriga-me, de uma maneira geral, a perceber que mal posso imaginar o que seja ser pobre, porque, entre uma ou outra dificuldade, a comida está no prato e o colchão não é nada mau. Do mesmo modo, aprendi a ter vergonha de usar a palavra ‘fome’, quando o meu mal é ter saltado uma ou outra refeição porque fiquei à conversa com um amigo que, não por acaso, raramente é pobre.

Ser pobre implica, imagino eu, depois de raciocinar, ter dificuldades em pagar contas. Mais: implica frequentemente não conseguir pagar contas, negociar adiamentos, pedir empréstimos baixíssimos para ter luz em casa. O pobre e o dinheiro existem, mas raramente coexistem: onde está um, não está o outro, num jogo das escondidas em que o dinheiro raramente aparece, fugindo divertido enquanto o pobre está encostado a contar até dez, antes de ir à procura de um adversário tão esquivo.

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Os fracos, os mais fracos e os mais fracos dos mais fracos

hqdefaultO Estado Social, segundo Isabel Jonet, deve limitar-se a ajudar os mais fracos dos mais fracos. O Estado Social não deve, portanto, ajudar os que são apenas fracos, porque os fracos, no fundo, são fortes e fortes do pior tipo. O fraco é um forte que se limita a fazer força para parecer fraco. Não é por acaso que dos fracos não reza a História: não porque não sejam fortes, mas porque não são suficientemente fracos. Para Isabel Jonet, fraqueza é algo que se resolve com um copo de água e açúcar.

E os mais fracos? Não deveria o Estado Social ajudá-los? Os mais fracos são só fraquinhos, gente tão desprezível que é olhada de lado pelos fracos. Cálculos recentes permitem, aliás, saber que um fraco terá a força de dez mais fracos.

Os mais fracos terão, todavia, força suficiente para, pelo menos, pedir esmola, o que isenta o Estado Social do dever de os ajudar. Se os mais fracos, aliás, tiverem deficiências físicas, Isabel Jonet poderá, até, dizer-lhes: “Vá lá pedir esmola, que tem muito mau corpo para isso!” Não há, afinal, como uma boa chaga para que o mais fraco não vá chagar o Estado Social. [Read more…]

O Estado Agradece

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a boa cristandade dos portugueses e aos 23% de IVA dos bens alimentares que comprarem nos sítios do costume.
Um bom negócio para muita gente.

Jonet: “O pior inimigo dos desempregados são as redes sociais”

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Isabel Jonet [presidente do Banco Alimentar Contra a Fome] considera ainda que “o pior inimigo dos desempregados são as redes sociais. Muitas vezes as pessoas ficam desempregadas e ficam dias e dias inteiros agarradas ao Facebook, ou agarradas a jogos, agarradas a amigos que não existem e vivem uma vida que é uma total ilusão”. Isabel Jonet recomenda que os desempregados procurem fazer trabalho voluntário que, apesar de tudo, os mantém activos e com mais possibilidade de encontrar um novo emprego. [RR]

O que se aprende com gente culta. Eu que pensava que o maior inimigo era a falta de dinheiro. Afinal, vamos a ver, e estes agarrados do Facebook despedem-se de propósito para se andarem a amigarem na net.

Antologia jonetiana:

A Xoné

xoneOlá, eu sou a ovelha Xoné.
Vivi acima das minhas possibilidades, comi bifes todos os dias, lavei os dentes com a água a correr.
Sê bom cidadão, pratica a caridadezinha para comigo e, ao mesmo tempo, entrega 23% dela ao Estado.

O Bife

O BIFE JÁ NÃO AGUENTA
Pertenci a um grupo de pessoas que podia comer bife de vaca todos os dias, embora, por razões de saúde, o não fizesse. Hoje pertenço aos que o não podem fazer por razões económicas.
As carnes vermelhas, em excesso, fazem mal. As de porco também, e muitos outros alimentos o fazem de igual modo. Mas na realidade o que está na ordem do dia é o consumo do bife da vaca.
Por falta de dinheiro, já o foi por causa das vacas loucas, o consumo deste tipo de carne nos dias de hoje está em crise.
Do mesmo modo que na nossa vida de cidadão Português, em Portugal, quem vive do comércio da dita carne ganha menos dinheiro, e as vacas vivem mais tempo. É a crise na sua visão mais simplista.
As declarações da senhora Presidente do Banco Alimentar Contra a Fome provocaram uma azia quase geral nas gentes que pensam tudo saber e poder dizer. [Read more…]

O Banco Alimentar haja fome

Isabel Jonet voltou a abrir a boca, e não tendo entrado mosca também não disse nada que não tivesse dito anteriormente, a velha k7 do vivemos acima das nossas possibilidades em versão bife. Mas aproveitemos para pensar no Banco Alimentar e em toda a cadeia das IPSS, cada vez mais sustentada pelo benemérito Mota Soares com os nossos impostos.

Explica Paulo Pedroso:

Em 2011 as campanhas de recolha em supermercados contribuíram apenas com 10% do valor dos produtos recolhidos pelo Banco Alimentar de Lisboa. A indústria agro-alimentar, reciclando os seus excedentes, doou 43%. A reciclagem de excedentes da UE contribuiu com 22%. O Mercado Abastecedor da Região de Lisboa (de novo, os excedentes) doou  11%. As retiradas de fruta pelo IFAP (ainda os excedentes)  renderam 6%. Ou seja, ao todo, o escoamento de excedentes correspondeu a 82% do valor dos produtos distribuídos. [Read more…]

O Banco Alimentar

 

No último fim-de-semana, tive de ir duas vezes ao Pingo Doce e lá contribuí duas vezes como manda a (minha) tradição.

Da segunda vez, enquanto esperava que a família chegasse, estive a observar durante alguns minutos. Havia gente que comprava alguma coisa para si e deixava muito mais para o Banco Alimentar; havia gente que levava muito para si e deixava alguma coisa; outros levavam pouco para si e não deixavam nada para os outros; alguns levavam os carros cheios mas não deixavam nada; outros ainda recusavam-se a receber os sacos logo à entrada; e ainda outros pegavam no saco e enfiavam lá as suas coisas (que assim não tinham de comprar saco), não deixando nada para o Banco Alimentar.

Chamou-me especialmente à atenção um casal com putos que levou o carro cheio, incluindo brinquedos e montes de chocolates e doces e foi incapaz de oferecer o que quer que seja. Nem um pão. E o daquela velhota, loira pintada e com um animal morto às costas (leia-se casaco de peles),  que recusou o saco, vociferando que «também ninguém me dá nada».

Há casos e casos e há pessoas que vivem com dificuldades – o que ganham mal chega para si. Compreende-se que nada dêem. O que já não se compreende é que quem vive bem, sem dificuldades, assuma desde logo que não quer dar e que tudo o que ganha é para si e assim é que está bem. E que ensinem isso aos seus filhos.

Curiosamente, porque o mundo é muito pequeno, conheço o casal de que falei acima e sei que vai todas as semanas à missa. Lá dentro, muito provavelmente batem no peito e clamam por Deus. Cá fora, é o que se vê.