Entre colegas de trabalho e no comentário político de direita, a alguém que ouse falar de direitos logo se lhe aponta o estigma de ser um moinante calaceiro.

Naomi Klein documentou que os neoliberais advogam o uso de crises para impor políticas impopulares enquanto a população está distraída. Fotografia: Anya Chibis para The Guardian.
O cidadão de hoje, produto de uma construção ideológica apenas suspensa durante curtos períodos, como a revolução francesa, é, antes de cidadão, um trabalhador. Faça-se a experiência de juntar algumas pessoas, pedindo-lhes que se apresentem. Não falarão das suas raízes familiares, nem das suas convicções. Definir-se-ão pelo que fazem, numa visão calvinista da sua existência.
Este argumentário ganhou novos sound bites nos últimos anos, tais como sair da zona de conforto e direitos adquiridos, variações semânticas da mesma ideia. Subjacente a estes conceitos está a pressão para que os cidadãos aceitem como naturais os contextos que lhes são desfavoráveis, como que ovelhizando o lobo adormecido. Ficou sem emprego porque algures, noutro país, alguém aceitou trabalhar mais horas por menos? A culpa não é de quem fechou o negócio aqui, para o abrir acolá. É sua, porque não saiu da sua zona de conforto, teimando nesses direitos imerecidos. Com variável grau de explicitação, políticos, bem-pensantes, comunicação social e patronado têm propagado esta mensagem, acabando, inclusivamente, repetida e assimilada pelos próprios visados.
Aceitar que os direitos são flutuantes, e mesmo um entrave à preservação do emprego, é uma enorme vitória do capital sobre o trabalho. O medo, em paralelo com a propaganda, é um potente factor de aceitação dessa degradação, e gerador do clima para mudanças que, de outra forma, seriam rejeitadas. A crise financeira que nos caiu em cima há 10 anos – o tempo passa! – foi um deste factores que permitiu implementar políticas de perda sem contestação social. É uma estratégia global, tal como se lê no The Guardian:
Tal como Naomi Klein documentou em “A Doutrina de Choque“, os teóricos neoliberais advogam o uso de crises para impor políticas impopulares enquanto as pessoas estão distraídas: por exemplo, no rescaldo do golpe de Pinochet, na guerra do Iraque e no Furacão Katrina, o qual Friedman descreveu como “uma oportunidade para reformar radicalmente o sistema educativo” em Nova Orleans. [The Guardian, 2016-04-15]
Fazendo uso deste chavão da moda, é tempo de sairmos da zona de conforto mental, aproveitando para reflectir sobre o que parecem lugares comuns vendidos através de rectângulos 16:9, quando, na verdade, fazem parte de um processo de formatação colectiva.
E o que custa ver é que grande parte dos jovens, via internet, já vêm formatadinhos para encaixar nesse esquema. O sistema produz o material de que precisa.
Fossem só os jovens. Entre colegas de trabalho, 95% com formação superior e idades acima dos 40/45 anos o panorama é o mesmo. Vazio, superficialidade e falta de pontes para analisar e perguntar. Porquê?
Boa pergunta! será que podia perguntar directamente aos seus colegas, para ficarmos a saber? Isto não é cínico, é que gostava mesmo de perceber.
Pensar faz doer a alma.
Essa frase faz-me lembrar alguma coisa, seria “As Redacções da Guidinha?” Ganda frase, Jorge. Aliás, ganda post!
Mas além de trabalhador o cidadão é visto como consumidor. E aí, até tem um bocadinho a dizer.
Verdade,,…uma desgraça dos novos ignorantes acomodados porque tudo lhes é dado, especialmente pelos papás….miséria lamentável