Postcards from Greece #33 (Galatistá)

Todas as aldeias têm o mesmo cheiro

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especialmente no inverno. A frio e a lareira. Uma mistura que para mim é como voltar a casa dos meus avós, nas aldeias em que nasceram os meus pais. Hoje cheirava assim, tal e qual em Galatistá (Γαλάτιστα), a aldeia onde vive uma das minhas colegas, a uns 40 quilómetros de Salónica. Mas é absolutamente o campo. As montanhas imponentes e a seguir os vales ora verdes, ora carregados de oliveiras. As azeitonas na Grécia são, provavelmente, as melhores do mundo. Quanto ao azeite tenho dificuldades em decidir entre o nosso, o italiano e o grego. De qualquer maneira é bom, tal como é boa a comida grega, especialmente a que comemos hoje ao almoço na pequena taverna da aldeia, onde toda a gente fuma, pois claro. A refeição, abundante, composta por diversos pratos gregos, muito queijo feta (com tomate, no forno), souvlaki de galinha, carne de porco frita em azeite e regada com sumo de limão, salada com molho doce, barriga de porco grelhada, regada com mais sumo de limão, batatas fritas caseiras como já não há, uma espécie de salsicha enorme grelhada de que não sei o nome. Tudo bem acompanhado com retsina, um vinho branco ao qual é adicionada resina de pinheiro durante o processo de fermentação. Depois, café grego e uns bolinhos de mel tradicionais nesta altura do ano. Os bolinhos, tal como o é, geralmente, a sobremesa aqui na Grécia, foram oferecidos. Outro dia também me ofereceram o café no Zythos. Filoxenía, portanto, já sabemos.
 

Trabalhámos um bocadinho de manhã, discutindo projetos entre muitas gargalhadas e olhando as montanhas em frente, ao longe, e antes delas os campos verdes. O campo. Não era eu, capaz de viver no campo, já se sabe. O rural interessa-me como objeto de estudo sobretudo, como local de visitas temporárias e também, ainda agora o escrevi, como lugar de memórias de que faz parte o cheiro, o reconhecimento desta mistura de lenha que arde nas lareiras, ar frio e erva ou qualquer coisa vegetal. É assim para muita gente, suponho. Depois do trabalho passeámos pela aldeia, não muito grande, cheia de gatos como todos os lugares na Grécia, algumas casas em ruínas e igrejas. Há umas ruínas de um antigo castelo, alguns grafitis bem bonitos nas paredes que representam a aldeia e a vida rural. Há muitas casas brancas, salpicadas ali e aqui de pedra, flores e abelhas. Não se vê muita gente na aldeia, excepto na pequena taverna, que tem à entrada uma latada, como têm muitas nas aldeias na Grécia e em Portugal. Como tinha a casa da minha avó Berta também. Uma latada que, de verão e de inverno, mas especialmente no verão estava carregada de moscas e pequenos cachos de uvas que haveriam de amadurecer lá mais para o fim de setembro, mal se anunciava o outono. As aldeias são também isto, ou eram, os lugares onde as estações do ano têm mais sentido do que em qualquer outro lugar. Especialmente quando há agricultura, coisa que vai escasseando nas áreas rurais portuguesas, mas que na Grécia ainda tem bastante expressão.
 
Em Galatistá há muitas cabras. O nome da terra têm aliás a ver com a abundância de leite. E oliveiras. E é sobretudo disso que vivem as pessoas. Outras há que trabalham na cidade, não muitas, porque apesar dos apenas 40 quilómetros de distância até Salónica, ainda se demora uns bons 45 minutos a chegar. Não que seja demasiado, bem entendido, mas se tivermos de o fazer todos os dias, duas vezes por dia, talvez nos cansemos em pouco tempo. Bem sei que há pessoas que demoram bastante mais que 45 minutos, em Lisboa, ou noutra cidade grande, como em Salónica, a chegar de casa ao emprego, todos os dias. Mas a verdade, sei-o por experiência própria, é que a distância não nos parece tão grande dentro de uma cidade como quando viajamos, mesmo que sejam apenas 40 quilómetros para fora dela. Claro que em passeio não custa nada, o tempo é diferente e passa de modo diferente. Tal como é diferente o tempo nas aldeias e nas cidades, por mais que alguns digam que é igual. O tempo e o resto. O imenso espaço. O espaço aberto. A paisagem a perder de vista. O céu sem obstáculos a não ser as montanhas. As nuvens que o sol transforma de outra maneira, às várias horas do dia. O por do sol nas montanhas. As pessoas que se cumprimentam sempre, mesmo que não se conheçam. As pessoas que se conhecem, no entanto, quase todas. A comida. O vinho. A água. Os sabores. O cheiro.

Comments

  1. Pedro says:

    Olá, Elisabete. Acabei de ver a aldeia no Google Earth. Não se vê ninguém, devem ter apanhado a hora da sesta… Não é muito diferente de qualquer aldeia portuguesa, excepto talvez pelo maior uso da madeira na construção, sobretudo nas varandas.
    Os gregos não bebem vinho “a sério”, em vez do resinado do retsina? Eu sei que eles até já têm um vinho muito razoável, sobretudo branco.


    • Olá Pedro

      Bebem vinho a sério, pois. E têm vinho bem bom. Falo do tinto que branco não sou muito apreciadora, apesar de ter bebido o retsina. 🙂