(Milton Nunes, Conselheiro Económico da Aliança Progressista dos Socialistas e Democratas no Parlamento Europeu)
O 25 de abril marcou o início do namoro entre Portugal e a CEE, que acabaria em casamento em 1986. É inegável o papel que a Europa desempenhou no processo de estabilização política e na construção das traves-mestras do nosso estado de direito e democracia. Para isso, os parceiros europeus negociaram um conjunto de exigências, seguindo a estratégia do “pau e da cenoura”, rumo ao cumprimento exemplar dos critérios de adesão. Não é por acaso que na campanha das primeiras eleições constitucionais de 1976, Mário Soares e o PS tenham escolhido como slogan de campanha o célebre “Europa connosco”. O entusiasmo do povo português pelo processo de integração fervilhava nos primeiros anos de democracia e prova disso foram os níveis de participação nas primeiras eleições europeias em 1987, que continuam a ser os mais elevados de sempre. A chama da paixão foi, a pouco e pouco, substituída por um casamento de conveniência, apesar de o amor persistir. Portugal continua a ser um dos países mais pró-europeus na UE, mas fica a sensação de que o portugueses ainda não perdoaram a “traição” dos anos duros de austeridade. Sem chama e sem fulgor, atingimos os níveis mais elevados de abstenção de sempre em 2019 e sente-se no ar uma preocupante desconfiança em relação às instituições.
É preciso restabelecer a confiança e isso passa, em primeiro lugar, por reafirmar o valor acrescentado da UE na vida das pessoas e agir sem tréguas para dar resposta à crise, rumo a um futuro em que o bem-estar humano e a sustentabilidade ambiental sejam o foco da atividade política. Isso requer coragem, ambição e investimento sem precedentes, quer ao nível nacional, quer ao nível europeu. Não é possível falar de forma séria sobre estes objetivos sem falar dos vários instrumentos que continuam a faltar na UE para possibilitar mais investimento nos serviços públicos, mais criação de emprego ou para reduzir as desigualdades. Ao mesmo tempo, não podemos cair nos erros do passado porque a desconfiança também advém daí. O futuro da UE não depende de uma Conferência sobre o seu Futuro para deixar tudo na mesma. Parece-me que o Futuro da Europa dependerá sim, a curto prazo, de uma receita para a recuperação que não envolva austeridade e, a médio-longo prazo, da introdução de processos mais democráticos e transparentes para que as pessoas sintam o retorno direto do seu voto nas europeias. E tudo isto é possível alcançar nos limites dos atuais tratados.
Acertar na receita certa começa, antes de tudo, por acertar no diagnóstico. É necessário primeiro de tudo reconhecer que estamos a viver uma crise que afeta todos os países, mas que não afeta todos da mesma maneira. Espantam-me aqueles que acreditam que “estamos todos no mesmo barco”. Talvez estejamos todos a passar pela mesma tempestade. Mas há barcos, como o alemão ou o holandês, que tem outro tipo de capacidade para ultrapassar a mesma tempestade porque beneficiam da arquitetura inacabada da zona euro. Falta tanto um orçamento comum europeu digno desse nome, como um sistema de impostos justo que impeça os paraísos fiscais de prosperar com os recursos dos vizinhos. Além disso, como poderemos reganhar a confiança dos cidadãos se são esses mesmos países, os que mais beneficiam com a moeda única e com o mercado interno europeu, que constantemente bloqueiam o avanço de soluções e instrumentos mais solidários e sustentáveis? Precisamos de completar a construção de um navio comum, mais forte, que nos garantirá tempos de bonança no futuro. A Europa não pode ser um “menu” desenhado à imagem dos que mais beneficiam com o atual status quo. Precisamos de instrumentos comuns para concretizar a dupla transição, climática e digital, com uma forte componente social.
Mas a Europa é muito mais que dinheiro. Fosse a obsessão pelo défice democrático a mesma que a UE demonstra com o défice orçamental e não teríamos chegado à situação política insustentável em países como a Polónia ou Hungria. A UE foi criada para acabar com regimes protofascistas e autocráticos. Não foi criada para os engordar com fundos europeus. A Europa que foi tão dura na imposição de políticas de austeridade em países como a Grécia ou Portugal, devia ser implacável com o respeito dos mais elementares valores democráticos e do estado de direito. O inofensivo mecanismo consagrado no Art. 7.º do Tratado da União Europeia é um bom exemplo da necessidade de reformar alguns procedimentos: basta que dois países se encontrem em igual processo de deriva antidemocrática para que a UE seja incapaz de punir qualquer um. A Hungria e a Polónia agradecem. A Eslovénia e a Bulgária ameaçam juntar-se à “festa do bloqueio”.
Além disso, precisamos de uma Europa com processos mais transparentes. E quando se fala de falta de transparência a conversa desagua obrigatoriamente no Conselho e no Conselho Europeu. Por exemplo, o Eurogrupo, uma configuração informal e sem o devido enquadramento nos tratados europeus, passou a servir de fórum por defeito de deliberação dos ministros das finanças, ou seja, consegue agir sem que exista dever de resposta perante o cidadão. O Presidente do Eurogrupo não é obrigado a responder perante o Parlamento Europeu, ao contrário, por exemplo, do comissário europeu que detém a mesma pasta. E já agora, para quê um comissário para os assuntos económicos quando é o Presidente do Eurogrupo que dá a cara pelas principais decisões? Não seria preferível acumular estas duplas funções num só representante, que acumule o cargo de comissário com a presidência do Eurogrupo, para que esteja desta maneira submetido ao escrutínio democrático do Parlamento Europeu? Não faria sentido a introdução de uma espécie de Ministro das Finanças Europeu?
A verdade é que o atual enquadramento institucional não garante sequer uma tradução direta da vontade popular na definição das prioridades e dos líderes europeus, e o exemplo extremo disso foi o processo de nomeação de Ursula von der Leyen, uma autêntica desconhecida do cidadão comum que não passou pelo crivo eleitoral nas europeias de 2019. A negociação de bastidores tem de dar lugar a um processo democrático e transparente para que as pessoas sintam que o seu voto conta. É isto que as poderá motivar a ir às urnas.
Por último, quero aproveitar esta oportunidade para fazer a distinção entre um “euroexigente” de um “antieuropeu”. Um europeu exigente, categoria em que me incluo, é um pró-europeu convicto, de corpo e alma, que vive na busca incessante de uma Europa melhor. No meu caso específico, influenciado por numa visão progressista e tendencialmente federalista. Um antieuropeu é alguém que tem como único objetivo acabar com o projeto europeu e que defende que a solução para todos os males no mundo é o regresso às fronteiras nacionais. Quero com isto dizer que a União Europeia é demasiado importante para que as exigências e críticas sejam um monopólio dos movimentos extremistas antieuropeus ou nacionalistas. Rejeito a difusão de culpas a Bruxelas guiada pelo interesse eleitoralista míope, gerando assim um sentimento antieuropeu a médio longo prazo. Foi isso que aconteceu no Reino Unido durante décadas e sabemos bem como acabou. Mas rejeito igualmente a atitude situacionista dos que consideram que tudo o que emana das instituições europeias tem um estatuto bíblico, imune a julgamentos, e criam um ambiente em que não há lugar para críticas e em que, quem ousa contradizer a orientação, é facilmente acusado de antieuropeísmo. Considero que esses são tão culpados pela crise de confiança em relação ao projeto europeu como os próprios antieuropeus.
Há que haver um esforço para dar um salto qualitativo no debate das questões europeia e democratizá-lo. E não podemos esperar a cada cinco anos, no contexto da campanha para as eleições para o Parlamento Europeu, para que este défice de participação cívica seja relembrado cada vez que esbarramos nos baixíssimos níveis de participação. O longo casamento entre Portugal e UE resultou da paixão de abril. O amor nunca deixou de existir, há que reafirmá-lo.
“Atingimos os níveis mais elevados de abstenção de sempre”.
Porque será?
O Selmayrgate pode ser uma das razões, a incapacidade de apresentar alterações legislativas pelos deputados pode ser outra, a total ausência de possibilidade de intervenção popular idem, as políticas neoliberais plasmadas nos tratados de fundação, a aprovação no maior secretismo de acordos internacionais, etc.
É preciso mais?
É verdade a europa connosco na verdade só está connosco para nos impor as suas politicas no interesses do eixo Berlim Paris por isso os ingleses disseram by by e foram tratar da vida deles sem ficarem nas mão dos decisores nomeados pelos monopólios económicos alemães porque chamar democrática à UE é continuar a enganar as pessoas, na verdade a UE existe para desmantelar as funções sociais do estado, aumentar como aumenta a riqueza dos mais ricos contra o interesses dos mais pobres sejam pessoas ou países e nós sabemos bem do que fomos vítimas mas a propaganda continua a vender-nos a EU como democrática quando alguns dos seus estados já levam à prática uma politica de índole fascista e apoiam com milhões a toda a hora um país tomado num golpe de estado por nazis confessos. Não foi por acaso que o nosso aparelho produtivo foi destruído e ficámos sem indústria, sem agricultura, sem pescas sem banca pública e sem os monopólios naturais do estado por imposição da UE e hoje toda a nossa politica está dependente dos humores dos tecnocratas de Bruxelas.
Se tivéssemos votado em Der Leyen, continuávamos sem saber quem era, e esta continuava ser poder nenhum porque não há dinheiro, e violar o artigo 123º é só para a coisa não colapsar.
Podíamos, precisámos, devíamos, a verdade é que é o que é, e a coesão e os valores comuns continuam a ser amanhãs que cantam, apoiados em cima de leis que precisam de unanimidade para que não paguem os mais fracos. (e que, não, não é a bazuca, façam as contas) Não há povo europeu.