Ontem errei. Escrevi um texto com o título: Mariana Mortágua, a moral e a Lei entram num bar…. e, sem saber, induzi em erro os leitores. Passo a explicar:
Dei a entender que a deputada em causa desconhecia a Lei. E com isso, erradamente, desculpei-a em parte. Acontece que fiquei a saber hoje de um dado que desconhecia: a deputada Mariana Mortágua foi uma das subscritoras da lei em causa. Não tendo, por isso mesmo, qualquer desculpa para não a ter cumprido. Pelo meu erro, mesmo tendo sido involuntário, peço desculpas aos leitores e ao Aventar.
Há aqui qualquer que desconheço.
O deputado do PSD, Duarte Marques, escreve no Expresso desde 2015. A deputada do PCP, Paula Santos, também escreve no Expresso. A deputada Isabel Moreira, no Expresso e na Visão. Mas há maus alguns. Falo apenas nos que escrevem com regularidade. Atenção que estou a falar de deputados no exercício de funções até ao final da última legislatura.
Esses não são pagos? Aquilo é pro bono?
Há aqui qualquer coisa que desconheço
Esses quero acreditar que é pro bono. Caso contrário estão a violar a lei
Ok. Foi por isso que fiz a pergunta. Como sou assinante de Expresso e vejo os três lá escarrapachados, fiquei naquela:
Então e o resto da maralha?
Já fui ler. Eles podem todos escrever para jornais.
Não podem é participar em programas televisivos pagos, como é o caso do debate semanal “Linhas Vermelhas”, por exemplo, que Mariana Mortágua faz com o Adolfo Mesquita Nunes.
Daí a ilegalidade.
https://www.jn.pt/nacional/amp/mariana-mortagua-acumulou-exclusividade-com-remuneracao-como-comentadora-14667868.html
Pois não estão!
Pode ler o que escrevi como resposta ao Rui Naldinho.
E se desconhecia isso, talvez esteja na hora de refazer os posts sobre o assunto.
Até porque, corrijam-me se estou errado, na base estava a convicção de que escrever nos jornais e comentar na tv era tudo a mesma coisa.
Tá bem que isto está transformado no “twitaventar” mas espera-se um mínimo de rigor.
Penso eu de que.
E mais uma coisa, a bem da verdade.
Mais uma!
O projeto de lei do BE que foi buscar lá ao site do Parlamento foi rejeitado na generalidade (votos contra do PS, PSD e CDS-PP).
Está aqui:
https://debates.parlamento.pt/catalogo/r3/dar/01/12/04/061/2015-03-12/41?pgs=42&org=PLC&plcdf=true
Ou seja: a lei que existe não corresponde a tal projeto.
Pelo que o post não tem fundamento nenhum.
O problema não é a lei. Nem o seu desconhecimento. É a sua interpretação.
A escrita de peças nos jornais é permitida e não belisca a exclusividade. Isto porque se considera que as quantias que recebem os deputados são provenientes de direitos de autor. Os direitos de autor constituem uma exceção ao regime da exclusividade porque, penso eu, são expressão de direitos fundamentais ligados á personalidade.
Segundo percebi, até há algum tempo, considerava-se que o comentário televisivo ou radiofónico era uma situação análoga.
E, à primeira vista, parece não haver diferença. Se um deputado escrever uma crónica num jornal e, depois, a reproduzir na tv, e em ambos receber uma quantia, não será o mesmo?
Não conheço a fundamentação que levou os órgãos competentes da Assembleia da República a mudarem de interpretação. Palpita-me que será por uma questão jurídico-formal: enquanto na obra escrita os direitos autorais são atribuídos ao escritor, nos programas televisivos esses direitos são dos realizadores dos programas (salvo erro, nos programas radiofónicos e de tv aplica-se o mesmo regime de direitos de autor das obras cinematográficas), sendo os deputados comentadores uma espécie de “atores”.
Ou seja, se forem pagos pela participação, não estão a receber direitos autorais e, por isso, estarão a infringir o regime de exclusividade.
Segundo a deputada, por não fazer comentários televisivo na altura em que a interpretação mudou, não tinha consciência de que estava a infringir a lei.
Cito o “Observador” (curiosamente, o artigo é de acesso livre…porque será???)
https://observador.pt/2022/03/10/mariana-mortagua-acumulou-exclusividade-no-parlamento-com-programa-remunerado-na-sic/
“Segundo a justificação da deputada, o entendimento do Parlamento é que mudou: entre 2015 e 2019, explica, a Assembleia da República entendia que “estas atividades eram compatíveis” com o regime de exclusividade, mas esse entendimento foi alterado em 2020. Como Mortágua não tinha, na altura, participação remunerada em programas televisivos, diz que não se apercebeu da regra.
Há, ainda assim, muitos deputados que estavam a par da regra ou que, na dúvida, decidiram abdicar da exclusividade para não gerar nenhum problema. O que é claro no entendimento da Comissão da Transparência é que os programas de comentário televisivo “não se podem reconduzir à perceção de direitos de autor”; essa definição só se aplica aos artigos de opinião (que Mortágua também escreve regularmente no Jornal de Notícias)”.
O desconhecimento da lei não pode ser invocado pelo cidadão comum. A D. Arminda, moradora em Freixiel, foi apanhada em excesso de velocidade ao ir a Mirandela ao médico. Ia atrasada. Ao agente da GNR/BT disse que na descida da Trindade não sabia que havia ultrapassado o limite de velocidade.
Foi multada, claro. Mas, disse ela, e o resto da maralha que passa aqui todos os dias?
Ora foda-se! Esta coisa de se desculpar uma infracção com a postura de se dizer “e os outros” diz tudo. Para casos iguais desculpas diferentes conforme a cor dos óculos. Claro que a culpa é do Estado Novo e do Passos.
O desconhecimento, no caso, não é da lei.
É da interpretação da lei. Não é a mesma coisa, nem para a deputada, nem para qualquer cidadão.
E além disso, ao contrário do que afirma, o desconhecimento da lei pode ser invocado. E pode ser circunstância atenuante.
Por favor, leia:
https://www.direitosedeveres.pt/q/acesso-ao-direito-e-aos-tribunais/conhecer-e-garantir-o-direito/o-facto-de-uma-pessoa-nao-saber-que-determinado-acto-e-proibido-torna-legitima-a-sua-pratica
Aliás, o seu exemplo deixa muito a desejar.
A inconsciência da D. Arminda em relação à velocidade a que circulava nada tem a ver com desconhecimento da lei.
A questão é: desobedeceu a um sinal? Não sabia quais os limites de velocidade aplicáveis á situação? Ou conhecia tudo mas não tinha consciência da velocidade a que ia?
Nem contra argumentar você sabe.
“Ao agente da GNR/BT disse que na descida da Trindade não sabia que havia ultrapassado o limite de velocidade.”
Se a D. Arminda tinha a carta de condução para poder conduzir, presume-se, jamais poderia evocar o desconhecimento da lei. Tinha de conhecer no mínimo os limites de velocidade, caso contrário jamais ficaria aprovada no exame de condução. Quando muito evocaria ao agente alguma distração. Seria mais sensato.
Já no que diz respeito à Lei, esta quando produzida e aprovada por quem de direito é para todos os cidadãos que estão nas mesmas circunstâncias. Algumas são gerais, a Lei da Nacionalidade, o código da estrada, outras mais selectivas, como no caso em apreço.
Fazer comparações despropositadas não mostra conhecimento. Mostra ignorância.
Eu conheço vários casos, nomeadamente em processos disciplinares, cíveis e criminais, em que o desconhecimento da lei, ou o seu conhecimento imperfeito, foi tomado como atenuante.
E um caso em que um tribunal administrativo reverteu a punição de um funcionário do Estado, no caso um professor com funções diretivas, que permitiu a um aluno fazer uma prova de exame por pensar que a lei o permitia, e a quem um inspetor moveu um processo alegando que tinha desobedecido a um parecer jurídico dos serviços do ministério, que ele desconhecia.
O juiz considerou que, embora o parecer tivesse sido publicado por um documento interno, se justificava o desconhecimento por parte do funcionário, dado o volume de produção de normativos habitual no ME, e que a interpretação que este fez da lei era perfeitamente plausível.
Felizmente que há juízes profissionais mais compreensivos e equilibrados na aplicação da lei que os justiceiros de pacotilha que abundam por aí.