As conchas de Neruda

Pablo Neruda a recolher conchas em Cuba (Foto de Mario Carreño)

Pablo Neruda, o grande poeta chileno, coleccionava conchas e búzios. Fê-lo ao longo de décadas, recolhendo exemplares um pouco por todo o mundo. Doou a sua colecção à  Universidade do Chile, mas durante décadas, e por dificuldades várias, essa colecção ficou semi-oculta, estando apenas uma pequena parte em exibição. Recentemente, e com a colaboração de instituições espanholas, a colecção foi reorganizada, e mostra-se agora em Madrid, na sede do Instituto Cervantes, sob o título “Amor al mar”.

São perto de quatro centenas de exemplares, que Neruda recolheu e preservou ao longo de vários anos, desde os seus quinze anos, quando viu pela primeira vez o mar, até cerca de 35 anos depois, quando decidiu oferecer a sua colecção à Universidade, em conjunto com a sua vastíssima biblioteca, dizendo:

“El esplendor de estos libros, la gloria oceánica de estas caracolas, cuanto conseguí a lo largo de la vida, a pesar de la pobreza y en el ejercicio constante del trabajo, lo entrego a la Universidad, es decir, la doy a todos.”

Sem ter ainda cumprido o que recomendo, atrevo-me a dizer que vale a pena ir de propósito a Madrid apenas para descobrir  a colecção de conchas e búzios que Pablo Neruda resgatou aos mares do mundo inteiro, e, deixando-se perder na perfeição geométrica das suas curvas, escutar a voz do poeta:

Hermano, ésta es mi casa, entra en el mundo
de flor marina y piedra constelada
que levanté luchando en mi pobreza.
Aquí nació el sonido en mi ventana
como en una creciente caracola
y luego estableció sus latitudes
en mi desordenada geología.

“Testamento (I)”
Canto general

Comments

  1. Luis Moreira says:

    E aproveita-se e visitamos mais uma vez o renovado Museu do Prado…

  2. Carlos Loures says:

    Não iria a Madrid para ver a colecção de conchas, mesmo sendo organizada pelo Pablo Neruda, um dos poetas que mais admiro. Já sei que esta minha atitude é pouco poética e para me penitenciar já pus à cabeceira os quatro volumes das «Odas» (que, por acaso, falando muito do mar, não tem nenhuma ode às conchinhas. Vou relê-las. Deve demorar mais tempo do que ir a Madrid, mas, que queres, não acho graça às caracolas – tenho pena dos animaizinhos que as habitaram (tentativa de reabilitação). Bonito texto, mais uma vez, Carla e o culto do Pablito, com conchas e tudo, só te fica bem.

  3. carla romualdo says:

    Para mim valia a pena, Carlos. Já fiz muitas viagens – mais curtas e mais longas – por motivos mais irrisórios. Mas o Prado que o Luís sugere é uma boa ideia, até porque nunca se vê tudo o que se queria, por mais vezes que se vá.

    • Luís Moreira says:

      Há lá quadros que se pode estar horas a admirar. E agora há uma ala moderna que ainda não vi, mas que irei ver…

  4. Carlos Loures says:

    já visitei o Prado, salvo erro, três vezes (ou quatro?). Mas, isso sim, vale a pena. E é como dizes, por mais tempo que se lá ande, há sempre coisas para ver. E as caracolas, como pretexto, também servem.

    • Luís Moreira says:

      Se as caracolas são do Neruda, vamos ouvindo os seus poemas.

Discover more from Aventar

Subscribe now to keep reading and get access to the full archive.

Continue reading