O sonho húmido de António Costa

Fonte: Pordata

Dispunha-me a procurar exemplos das maldades feitas aos portugueses em governos de maiorias absolutas quando António Costa, com palavras de 2019, me poupou a esse trabalho.

«Eu não tenho dúvidas nenhumas que os portugueses não gostam de maiorias absolutas e têm más memórias das maiorias absolutas, seja do PSD, seja do PS.» António Costa, 2019-08-28

Agora feito cínico, pede uma maioria absoluta com todos os dentes. Justifica-se dizendo «quem acredita que com o Presidente da República Marcelo Rebelo de Sousa uma maioria do PS podia pisar a linha?»

Além do cinismo, Costa soma a demagogia ao pretender que a acção executiva depende da aprovação do Presidente da República. O que deixa um enorme espaço de manobra, esse mesmo que apenas deu margem para 5 maiorias absolutas em 16 eleições.

O pedido da maioria absoluta é, também, justificado com a necessidade de estabilidade. Ao que se sabe, a Alemanha ainda é a economia mais forte da zona euro e viveu muito bem sem maiorias absolutas nas últimas décadas.

O que Costa pede é um cheque em branco. Sem necessidade de consenso parlamentar, fica com o instrumento para levar a cabo o mesmo tipo de medidas que deram deixaram «más memórias das maiorias absolutas» aos portugueses.

Ou, como escreveu Pedro Tadeu em Novembro do ano passado, «em 2015 um PS em maioria absoluta não tinha aplicado mais de metade das medidas contra a austeridade que vieram a acontecer com a “geringonça”».

«Mesmo com muitos defeitos, com terríveis incapacidades, mesmo com abusos, incoerências e derivas pateticamente autoritárias, mesmo com o exagerado e prejudicial seguidismo da Comissão Europeia, o governo minoritário PS obrigado a negociar no parlamento foi claramente melhor para o país do que teria sido um governo PS de maioria absoluta, deixado à rédea solta, entregue apenas ao tráfico de influências do poder económico, às exigências brutalizadas dos credores do país e aos humores variáveis de Bruxelas.

O mesmo aconteceria, claro, se o PSD tivesse maioria absoluta.

Um governo de maioria absoluta é, ainda, o melhor alimento para o crescimento do extremismo de direita, que se alimenta da revolta contra a escalada de corrupção (e com milhões da Europa a chegar, esse problema aguça-se) e da captura do Estado pelo partido do poder, o que sempre acontece com essas maiorias.

A “geringonça” foi uma solução governativa estável, ultrapassou uma legislatura e durou seis anos, o que é mais do que razoável. Foi mais resistente e teve menos sobressaltos políticos internos do que as coligações governamentais PSD-CDS.» Pedro Tadeu, DN, 2021-11-03

A escolha, para mim, é clara. Dar força a um pequeno partido, que não seja o desse idiota e ex-comentador da bola. É um pequeno contributo, que se torna expressivo quando somado a outros, para que a Assembleia da República possa de facto ser o órgão legislativo do Estado Português, em vez se transformar numa câmara de ressonância do Governo, ou pior, do Partido, sempre que existe uma maioria absoluta.

Ver se Costa vai ou não «pisar a linha», como se Marcelo fosse um polícia de trânsito à cata de ultrapassagens em zona de risco contínuo, não é como funciona a Presidência. E António Costa sabe-o muito bem, pelo que, ao fazer estas afirmações, está activamente a procurar enganar os eleitores.

Comments

  1. Rui Naldinho says:

    Tenho um presságio. Que António Costa e os seus acólitos, a começar por Carlos César e Augusto Santos Silva, vão ficar com um grande melão, no dia 30 de Janeiro.
    Já aqui no escrevi por diversas vezes. António Costa quis brincar com o fogo, nesta ideia peregrina da maioria absoluta. Ou muito me engano, oxalá que sim, ou António Costa não vai chegar a PM para um novo mandato.
    Só um louco se atira para umas eleições antecipadas durante uma pandemia. Marcelo que é um rato agradece este favor de Costa.
    Entretanto o país apodrece aos poucos.

    • Júlio Santos says:

      Lamenta-se que hajam pessoas que vejam as coisas enviezadas e queiram transformar o irreal em real. Não foi Costa que provocou eleições antecipadas, mas sim, os saudosistas do passado. O erro de António Costa foi acreditar piamente nos partidos da geringonça, desprezando um eventual apoio de Rui Rio.

      • Paulo Marques says:

        Claro, o sr “ou eu ou o pântano, e o PNS, buh!!” nunca parou de demonstrar a seriedade.

      • Rui Naldinho says:

        No dia 30 de Janeiro veremos o que a realidade nos demonstra. Se uma maioria absoluta cada vez mais longínqua, se uma verdadeira derrota pessoal de António Costa e política do PS.
        Pelas suas palavras só posso constatar que os eleitores que num passado recente votaram no BE, no PCP e até no PAN, admitindo que estes partidos vão ser penalizados, ainda que por razões diversas, esses votos irão todos para o PS, conseguindo os socialistas, no mínimo, um resultado muito próximo da maioria absoluta.
        Para mim transferência de votos entre partidos é mínima. Existe, mas é muito menor do que se julga. Já a mobilização do seu eleitorado tradicional que varia entre o voto e a abstenção, pode fazer uma enorme diferença no resultado eleitoral de qualquer partido.
        Se o PS tiver um resultado “poucochinho”, mesmo ganhando pela margem mínima, estou cá para ver a explicação sociológica que dará para “tão brilhante resultado”.

    • Filipe Bastos says:

      Ou muito me engano, oxalá que sim, ou António Costa não vai chegar a PM…

      Caramba, Naldinho. É a malta do ‘mal menor’ como v. que mantém esta esterqueira imunda há 40 e tal anos.

      Mais do mesmo, sempre mais do mesmo. Que asco.

      • Paulo Marques says:

        Está no seu direito de preferir mais privatizações à borla e PPPs, com umas borlas à evasão fiscal para acalmar o coisinho. Mas não vota, por isso ninguém quer saber.

        • Filipe Bastos says:

          Olha outro.

          Privatizações, borlas e PPP: tudo especialidades do PS. Não é só a Laranja Podre. O Partido Sucateiro privatizou ainda mais, PPPou ainda mais, roubou tanto ou mais.

          E voto sim, ó esquerdinha. Voto nulo. Melhor que a v/ trampa mal-menor, mais-do-mesmo, ó-que-democrata-que-eu-sou-por-ir-botar-o-botinho.

          • Paulo Marques says:

            Pois. Prepare a carteirinha para o seguro vá estudando em que mamão confiar com o seu dinheiro para ter reforma reforma, tá bom?

  2. Júlio Santos says:

    Todos os políticos são uns troca-tintas , todos o sabemos. Uma coisa é reconhece-lo outra coisa é ignora-lo.

    • POIS! says:

      Pois é!

      E entrar na fossa dos crocodilos do jardim zoológico é capaz de ser perigoso, todos o sabemos. Uma coisa é reconhecê-lo outra é ignorá-lo.

    • Paulo Marques says:

      Há quem seja consistente durante décadas, mas ter princípios não agrada a clientelas.

  3. Filipe Bastos says:

    O que Costa pede é um cheque em branco.

    É o que todos os partidos pedem, J. Cordeiro. Todos decidem tudo sem lhe perguntar nada. A sua ‘democracia’ consiste numa cruzinha de 4 em 4 anos. Um cheque em branco de 4 em 4 anos.

    A escolha, para mim, é clara. Dar força a um pequeno partido…

    É a mesma da Ana Moreno. O bom: é melhor que votar no Centrão. O mau: validam esta partidocracia podre; mantêm tudo na mesma; pactuam com a impunidade do esgoto partidário.

    A ir votar, tudo é melhor que uma maioria absoluta do PS – a maior e mais ruinosa máfia do país. Mas neste regime podre, qualquer voto que não NULO é um voto – e um protesto – desperdiçado.