Rui Rio e o 25 de Abril

Rui Rio, como muita direita portuguesa, tem um problema com o 25 de Abril, o que é natural. Essa direita, também de Rio e alegadamente democrática, chega mesmo a relativizar a ditadura do Estado Novo, enveredando por preciosismos terminológicos, tentando provar que não era fascismo. Até imagino que, num acto de revisionismo analgésico, os que foram torturados pela PIDE, por exemplo, relembrem o seu passado e esqueçam as suas dores, ao descobrir que, afinal, os torturadores não eram fascistas.

Em Portugal, temos um problema com a Justiça, desde a morosidade dos processos até às custas. Espera-se que, em campanha eleitoral, os políticos falem do assunto. Rui Rio falou. Mais valia ter ficado calado.

Segundo Rio, uma das duas pessoas que poderá vir a ser primeiro-ministro, a Justiça, em Portugal, é menos eficaz desde o 25 de Abril. Deduz-se que seja o de 1974.

Disse o novel humorista e presidente do PSD: “Tirando os julgamentos políticos, em termos de eficácia, desde o 25 de Abril a justiça piorou”. Para quem mede as acções apenas pela sua eficácia, Rio está errado – os julgamentos políticos foram de uma eficácia imbatível, até porque não havia grandes demoras e até se devia poupar dinheiro.

Entretanto, com todos os defeitos que podemos e devemos identificar em muitas áreas, só quem sofre de algum défice de cognição (também) democrática é que pode dizer que Portugal está pior agora do que antes do 25 de Abril. Este Portugal cheio de defeitos é o melhor de sempre, em todas as áreas. É claro que é muito mais difícil governar em democracia e talvez Rui Rio não goste de dificuldades, o que se notou muito durante o seu consulado autárquico.

Entretanto, a advogada (repito: advogada) Mónica Quintela cabeça de lista do PSD por Coimbra, afirmou que é preciso retirar a venda dos olhos à Justiça. Limito-me a citar a própria repórter do Público: “Recorde-se que a justiça é representada com uma venda nos olhos para que possa julgar as pessoas de forma igual e sem discriminações.”

Em democracia, não é proibido criticar a democracia e não é proibido elogiar ditaduras, mas convém ter a noção do que se diz – comparar ditadura e democracia é populismo e o resto é conversa. A aproximação de Rui Rio ao Chega é ainda mais evidente.

Talvez Rui Rio queira fazer com os tribunais aquilo que fez com o teatro no Porto – La Féria será, então, ministro da Justiça de um futuro governo PSD-João Ratão. Os problemas não se resolverão, mas as togas irão ter lantejoulas e haverá girls a dançar longas pernas no momento da sentença.

Finalmente, para mim, faz tanto sentido que Rui Rio seja primeiro-ministro como director de um teatro. Entretanto, o PSD corre para os braços de André Ventura, que é para voltarmos ao tempo da Outra Senhora, esse tempo em que os tribunais eram expeditos, mesmo que não houvesse Justiça.

Comments

  1. Carlos Silva says:

    Sr Nabais : o 25 de Abril não é uma vaca sagrada

  2. Rosa+Lourenço says:

    Antes do 25 de Abril, os tribunais resolviam, segundo as leis e a ponderação de cada juiz, em tempo razoável. Havia menos garantias para réus ou acusados, menos hipótese de demora com recursos atrás de recursos….

    Neste sentido a Justiça está mais lenta e, por vezes, incapaz até de levar a julgamento situações dúbias por atingir a prescrição e manter-se o enigma: onde estaria a verdade dos factos?

    A Justiça para exercer correctamente a sua função tem de ser atempadamente efectuada e aplicada na sua essência, sen percalços nem subterfúgios.

    Tem de se ouvir o que cada político diz em vez de generalizar ou “puxar” à vontade de quem escuta.

  3. Filipe Bastos says:

    Rui Rio, como muita direita portuguesa, tem um problema com o 25 de Abril, o que é natural.

    Não é só Rio ou a direita, Nabais. Eu também tenho. Suspeito que há muitos como eu. E também nos parece natural.

    O meu problema natural com o 25/4 é este ter sido uma farsa; uma fantochada para crédulos; a transição pífia de uma ditadura parola para uma partidocracia podre, a saque por uma classe de pulhíticos inimputáveis a coberto de uma Constituição irreferendável.

    O problema de Rio é outro: é ser mais um autoritário pé-de-chinelo, como a Múmia, o Bosta ou o 44, que não suporta ser questionado. Tolera a democracia, esta farsa que temos, mas no fundo quer mandar sozinho. E acha que os eleitos são intocáveis.

    Já o problema da Justiça é ser uma coutada de pulhíticos, juízes e advogados, i.e. trafulhas, chulos e pulhas a soldo. Nada funciona; tudo leva uma eternidade; ricos e canalhas safam-se sempre.

    Constatar isto não é ser fascista, Nabais. E como disse o Carlos Silva, o 25/4 não é uma vaca sagrada. Hoje é só um ritual patético.

  4. Tugs says:

    Já aqui mostrs-te diversas vezes o teu desprezo pelo 24 de Abril.
    Só mesmo a paciência adquirida graças ao mesmo e possível continuar a aturar-te garoto fascistoide.
    Tu e outros visões no prato onde comes

  5. Paulo Marques says:

    O Nabais continua com mira para se focar em pontos que passam ao lado de quem lê. O “defeito” não é só meu, pelos vistos.
    Como a Mónica demonstra, e Rio nem se fala, cultura política é coisa que não existe.

  6. JgMenos says:

    E típico dos esquerdalhos sempre se estribarem em supostos ataques ao 25 de Abril.
    Ora o 25A não passa do dia em que caiu um governo no modo porque sempre caem os governos em regimes conservadores e autoritários, com um golpe militar.
    O que se segue ao 25 de Abril foi o fundamento para grandes reservas da direita e da esquerda democrática.
    Inicialmente condicionada por mão militar, segue-se a prática de um poder dominantemente de esquerda, e de uma direita pervertida até chegarmos a este caldo de imbecilidade e desonestidade que cumpre o miserável padrão do esquerdalho.

    Até que uma tal cambada seja reduzida ao desprezo a que tem direito, nada de relevante há a esperar.

    • António Fernando Nabais says:

      A democracia tem falhas. Uma delas é a de não conseguir levar a literacia a todos. Tem esperança, menos, um dia chegará a tua vez, seu direitolo fofo.

    • POIS! says:

      Pois estou a ver bem?

      “Reservas”??? Da “Esquerda democrática”??? Isso então existe??? As nossas almas ficam parvas!

      Que discurso, pelo Menos, tão amigo, tão moderado, tão cordato, tão pedagógico, tão comedido, tão ameno, tão brando, tão prudente, tão suave, tão ponderado, tão morno, tão temperado, tão fresco, tão contido, tão equilibrado, tão pautado por uma sageza tão sagaz e tão lúcida que a todos nos deixa em profundo, místico e arrebatado êxtase!

      Tão inesperado que ninguém estava á espera!

      Mas deu-se o fato e fica-se estupefato!

  7. Júlio Santos says:

    Os saudosistas do passado extinto em 1974 e que, infelizmente ainda são muitos, anseiam pelo regresso de uma PIDE e os seus colaboradores, os Bufos, desvalorizando os seus feitos macabros perpetrados contra os opositores ao regime político de então, Estes, encontram em André Ventura, o guia que lhes pode satisfazer esse seu desejo. Se verificarmos, o tipo de apoiantes que rodeiam esta personagem nos comícios, são maioritariamente constituídos por militares e forças de segurança a quem prometeu dar-lhes um poder semelhante ao dos seus colegas do antigamente. Parece que, paulatinamente, este farsante se prepara, a seu tempo, criar um Estado policial. Os que renegam o passado, teem motivos suficientes para temerem pelo futuro. Esta democracia que temos, tem sofrido altos e baixos e, é natural, que, os que sobreviveram ao passado e os que não o viveram, se sintam frustrados por não terem alcançado os objetivos que lhes prometeram. Estes, poderão sentir a tentação de quererem ir ao encontro de outras soluções governativas mas, a experiência recente, diz-nos que é melhor o pouco que temos, do que voltarmos a ser roubados, na desvalorização dos vencimentos e nos ordenados dos trabalhadores, nas reformas dos aposentados e reformados, que obrigaram milhares de famílias a entregarem as suas casas aos Bancos, por terem ficado sem condições para pagarem as suas prestações. Foram tempos penosos que se deseja que não se repitam. E, é por tudo isto, que é preciso fazer uma reflexão sobre os pros e contras na hora de votar nas eleições do próximo dia 30 e não haver precipitações no assinalar o partido em quem votar. Todos prometem, tudo a todos mas, findas as eleições, as promessas, os beijos e abraços, são atirados para o baú do esquecimento. E aí ficam guardados para as próximas eleições.

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