Parte I
Já aqui escreveu o João Mendes sobre um antigo artigo de Vasco Pulido Valente e penso que foi o João Maio (não encontro) que escreveu sobre um outro antigo artigo, desta feita de Mário Soares. Em comum: uma previsão antecipada do que hoje está a acontecer. Mas existe outra coisa, mais importante, em comum. Cada um à sua medida sabiam da importância da História na explicação do presente e na previsão do que pode ser o futuro.
O desconhecimento da História explica muito do que está a acontecer. E essa ignorância, de boa parte da classe política europeia, é a causa de termos chegado aqui. Só uma absurda ignorância pode explicar a dependência de parte importante da Europa, com a Alemanha à cabeça, de energia fornecida pela Rússia. A ganância não justifica. Aliás, a ganância é, por si só, uma materialização dessa grave ignorância. A mesma falha de formação que levou a Europa a deixar morrer a sua indústria, a não apostar em ser, o mais possível, auto suficiente. A pequenez intelectual da nossa classe política é um reflexo do nosso desinteresse e da forma como, cada vez mais, preferimos políticos assépticos – aliás, sobre esta particularidade, aconselho este ARTIGO de 2004, escrito por Graça Franco no Público.
A mesma ignorância histórica leva muitos dos nossos mais jovens a não compreender o que está em causa. Quando muitos responsáveis políticos falam, e com razão, da “geração mais qualificada de sempre” esquecem que essa “qualificação” demasiadas vezes também é fruto de algum facilitismo. Que começou na minha geração, os que chegaram ao secundário e ao ensino universitário nos inícios dos anos 90 do século passado. Foi uma opção dos países ocidentais (com honrosas excepções). Um dos pilares do conhecimento, a História, passou a uma espécie de parente pobre do sistema. Eu sei que não foi o único. Aqui chegados, um ponto de ordem: estou a falar da maioria, como é obvio. Não vale a pena começarem já a preparar as espadas para a caixa de comentários…
Ora, uma sociedade menos preparada acaba por ter como consequência natural uma menor qualidade dos seus dirigentes políticos. Mesmo sabendo que Vasco Pulido Valente era genial, o facto de ter escrito, em 2015, isto: “A Crimeia foi o primeiro objetivo; e o segundo foi parte da bacia de Donetsk, porque a Crimeia não serve de nada sem uma ligação fácil e segura ao coração do Império, Não existe ponta de dúvida que Putim não recuará”, não faz dele um adivinho ou uma espécie de Zandinga. Não. Apenas se limitou a aplicar os seus vastos conhecimentos da História a uma realidade que estava a começar. Melhor dito, a recomeçar.
Porque a História, infelizmente, repete-se. Quando muito mudam os protagonistas. A repetição é causada pela ignorância. Sobretudo daqueles que tinham a obrigação de não serem ignorantes. A mesma ignorância daqueles que, não satisfeitos com os erros cometidos com a Rússia, continuam a cometer e de forma mais grave, um erro gigantesco na forma como nos estão a condenar a ficar na mão e sob a bota da China. Por ganância? Certamente. Por ignorância? Absolutamente.
Eu gosto muito de lições de geografia disfarçada de história por quem acha que sabe mais que quem viveu e ditou a política da guerra fria, como Kissinger ou Bill Burns, ou muitos, muitos outros contra a geopolítica de Clinton. Porque, no fundo, é uma lição de ideologia, distanciada do mundo real, e esta não falha, só pode ser falhada.
Temos pena. Já vai tarde… agora? História? Filosofia? Geografia? Ui, mas isso interessa a alguém? Gestão ! Isso é que dá guito !O resto? eheheheheheheh…
Olha, mais um com estados de alma.” A ganância não justifica.”? ai justifica sim. Sempre. E só mais uma coisa: Ignorância? Como diz?Quem? Os Gestores?Os Politicos? Os Jornaleiros? Os Advogados? Os Professores? etc.,etc. pobrezinhos, tudo gente que nem sabe ler, nem nunca tiveram Tempo.
O Fernando culpa a ignorância, mas nunca o sistema. Porque será? Talvez se ler o relatório da Rand Corporation, os planos para destruir a Rússia possam ficar mais claros no seu espírito. Isto é apenas um wishful thinking.
A ignorância que culpo é a daqueles que “fazem” o sistema. O mesmo sistema que não soube “trazer” a Rússia para o seio da UE após a queda do Muro de Berlim. A ignorância daqueles que “sendo o sistema” preferiram sempre a humilhação da Rússia ou melhor, o saque da Rússia (Putin e os Oligarcas vivem graças ao sistema). O problema, caro José Oliveira, é que este meu texto e o entendimento que destas coisas tenho não é isolada, não é de hoje. Ou seja, não é nada de diferente do que tenho dito em diferentes momentos nos podcast do Aventar ou escrito noutros momentos nestes anos, mais de uma década, que levo de Aventar.
Penso que uma leitura mais cuidada do texto permite compreender que a “ignorância” referida no mesmo é o das elites que nos governam e, consequentemente, do tal sistema.
E com a resposta ao seu comentário quebrei uma regra de não responder a comentários. É o que faço a 98% deles. Mas não há regra sem excepção. Cumprimentos.