Defenestrem-se os Vasconcelos! Viva a Restauração!

Passaram 381 anos desde que atiramos o Vasconcelos pela janela e começamos a chutar os espanhóis para o lado deles da fronteira. E nada contra os espanhóis, que tenho lá bons amigos, tudo gente do melhor que há. Mas Portugal não é Espanha e nós já não temos idade – já não tínhamos, em 1640 – para brincar às anexações. Muito menos para ser anexados.

Por falar em anexações, quem volta e meia brinca com o tema é o partido neofranquista Vox. Ainda há dias voltaram a fazer um daqueles mapas, inspirados no período cujo o fim celebramos hoje, onde Portugal surgia como um território sob domínio da coroa espanhola. Bourbons por Bourbons, prefiro os de Linhaça. Mas, se quiserem, podem anexar André Ventura, que para autoproclamado nacionalista e defensor da pátria, executa um “Viva a Espanha” bastante convicto. E suspeito.

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Quanto ao 1º de Dezembro

Uma longa distância entre a ficção e a realidade histórica. Propagandas.

Provocação


No preciso momento em que o governo se atreve a abolir o feriado da Restauração, eis que temos uma inusitada presença nas ruas da capital. Andam em “giro” por Lisboa, viaturas da polícia espanhola, alegadamente em apoio dos turistas que do país vizinho se passeiam pelas nossas praças, ruas e avenidas. Certamente bem-vindos, não têm qualquer necessidade de protecção especial, estando a PSP e a GNR habilitadas para o fazer. Assim, para que servem estes uniformes estrangeiros em missão de patrulha? Um insulto, é o que parece.
Inacreditável a falta de tino do ministério da Administração Interna, do ministério dos Negócios Estrangeiros e das chefias das Forças Armadas, já que com Belém para nada se pode contar.
Perderam o juízo ou é simples provocação? A menos que nada mais seja senão um teste para “memória futura”.

Ribeiro e Castro parte louça no Caldas


Não andarão a precisar de fosfoglutina lá pelo do Largo do Caldas? O Sr. Diogo Feio está irritado, dizendo que Ribeiro e Castro vota ao lado do sinapismo Louçã e de Jerónimo de Sousa. Em suma, faz de conta não perceber o porquê da posição do colega de bancada. A verdade é que toda a questão anda em torno da escabrosa eliminação do feriado do 1º de Dezembro e isto, com o formal apoio de um Partido maioritariamente composto por monárquicos. Bem pode a direcção Paulo Portas tentar passar entre os pingos da chuva, mas esta é a verdade. Se duvidam, auscultem as bases do Partido e verão. O Público também diz que que uma fonte próxima de Paulo Portas garante que …”Ribeiro e Castro ficará a falar sozinho”. Não estão a ver bem o problema, pois no Parlamento existem muitos outros deputados de outros Partidos que ainda não obedecem a esta nova roupagem de “centralismo democrático” do PC(DS). Ribeiro e Castro não vacilará e sugere um veto de Belém. Duvidamos muito do interesse que ACS poderá manifestar quanto a este assunto, mas um veto pode acontecer, ou melhor, deveria forçosamente acontecer. O deputado também poderia ir mais longe – e provocar ainda mais banzé -, propondo trocar a abolição do feriado do 1º de Dezembro – uma data de facto histórica -, pelo vaudeville oitocentista do 10 de Junho, uma invencionisse consagrada por uns tantos berreiros em 1880 e habilmente aproveitada pela República de Salazar.

Uma vez mais, vamos direitos ao assunto: esta eliminação de feriados nada mais é, senão um esfarrapado recurso que obrigará a mais uns quatro dias de trabalho grátis. Como se a esmagadora maioria da “iniciativa privada” que medra à conta do Estado, merecesse a mínima consideração. Ora toma!

Claro que é para roubar!


Bem podem desfazer-se em explicações que não convencem nem o mais seráfico “menino Jesus”. A abolição dos feriados trata-se simplesmente de um descarado saque, obrigando os assalariados ao trabalho gratuito em quatro datas tradicionalmente votadas ao lazer que como se sabe, nunca foi nem é sinónimo de preguiça.
Esta manhã, o alegadamente irmãozinho de causas turvas Magalhães, teve a ousadia de sugerir a demissão de Ribeiro e Castro, o único deputado que mostrou não ser mais um invertebrado naquela mole de holotúrias parlamentares.
O dia esteve em grande, pois ao insulto da abolição do 1º de Dezembro, acrescentou-se o descarado assalto com a chancela B(uíça)PN. Corja!
* Imagem: no Brasil e ao contrário daquilo que se passa em Portugal, as Forças Armadas cultivam a memória da nossa História comum.

1 de Dezembro, dia nacional da aldrabice historiográfica

Cristovao de MouraEle é a independência, a cobardia da nobreza portuguesa em geral e dos Braganças em particular promovida a heroísmo, e mais umas lérias: o séc. XVII permanece como o menos estudado da nossa História, e os mitos historiográficos ainda perduram como verdade oficial.

Deixem-me saudar o povo irmão da Catalunha, e sobretudo o povo português em revolta antes do golpe palaciano também  contra esse mesmo povo que hoje se comemora.

Há um ano escrevi aqui umas coisas sobre o 1º de Dezembro, feriado nacional conhecido por “Dia da Restauração da Independência de Portugal” e hoje acrescento um retrato de Cristovão de Moura, e uma ligação para um curto blogue que lhe tomou o nome, do Paulo Varela Gomes, com quem comungo o gozo da provocação embora ele a exerça com o talento que lhe sobra e a mim me falta. Volta Paulo, estás mais que perdoado.

Seis questões sobre o 1º de Dezembro, feriado nacional conhecido por "Dia da Restauração da Independência de Portugal"

Choveram no mesmo instante pedras nas janelas e casas do Corregedor, despedidas dos rapazes e pícaros da Praça, os quais, animados com a assistência do Povo, subiram acima e botaram na Praça, furiosa e confusamente, quanto acharam nas mesmas casas do Corregedor e, fazendo uma fogueira defronte delas, se pôs fogo a tudo.Escondeu-se o Corregedor em uns entre-solhos. E, sendo pouco depois achado pelos rapazes, passou aos telhados por uma fresta […] se recolheu desairoso às casas do Cónego […], que estão paredes meias com as suas. […]

Manuel de Severim de Faria, descrevendo as Alterações de Évora de 1637

 Ler mais na Rua de Alconxel

 

 

Os acontecimentos de 1580 devem-se ao “desastre” de Alcácer-Quibir?

Não. Desde o séc. XV que as monarquias ibéricas tinham acordado na sua unificação política, sob o jugo de um mesmo rei. Apenas vários acidentes (a começar na morte do filho de João II, que seria o futuro rei de Portugal e dos restantes reinos ibéricos dominados por Castela) o tinham evitado. O rei Sebastião e a aventura dramática em terras da mourama apenas atestam que num regime monárquico é extremamente fácil um doente herdar a coroa. Mesmo assim e até por isso podemos dizer que hoje em dia o criminoso  de guerra Sebastião seria dado como inimputável. Filipe II de Espanha foi aclamado Filipe I de Portugal com toda a legitimidade, à luz das leis e da sucessiva intenção política do poder régio.

 

Em 1580 Portugal perdeu a independência e ficou sob domínio espanhol?

Técnicamente não é bem verdade. O regime estabelecido após 1580 designa-se por monarquia dual, ou seja, o mesmo rei era-o de dois estadosmais ou menos soberanos.

Filipe I tentou mudar a sua residência para Lisboa, no que foi impedido pela nobreza, uma porque não queria sair de casa, a outra, a portuguesa, porque adorava a vida na corte espanhola. Contudo no governo de Filipe III, o acordo que garantia a independência de Portugal deixou de ser respeitado.

 

Durante a dinastia filipina houve resistência à monarquia dual?

Entre o povo sim. A nobreza sempre se sentiu encantada com essa união, os intelectuais escreviam em castelhano, etc. etc. Na década de 30 houve várias revoltas populares, conhecidas por alterações, contra o poderio da nobreza e do clero, das quais a mais conhecida foi a de Évora, em 1637. Revoltas de um povo esfaimado e que não distinguia portugueses de castelhanos quando atacava quem tinha que comer, colocando o país a ferro e fogo.

 

Porque se dá o golpe de estado de 1 de Dezembro de 1640?

São várias as circunstâncias. Internamente a nobreza vivia em pânico com as revoltas populares. Internacionalmente o Duque de Bragança foi pressionado pela França para assumir o poder, o que primeiro recusou com o heroísmo que lhe era muito peculiar, e se viu obrigado a aceitar antes que o cheiro a fumo das alterações lhe chamuscasse as propriedades. Por outro lado e para não variar a norbreza mais jovem precisava de se fazer à vida, que o morgadio ainda era lei.

 

A que se deve o sucesso da chamada “restauração”?

A uma feliz conjuntura internacional, sobretudo a guerra na Catalunha que levou Filipe III a concentrar os seus esforços militares, permitindo a Portugal organizar o seu exército, com o apoio de potências estrangeiras rivais.

 

 

 

Dia da Restauração Poderá Mudar de Nome

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TRATADO DE LISBOA ENTRA HOJE EM VIGOR

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Hoje, dia 1º de Dezembro, dia da Restauração da Independência Portuguesa, entra em vigor o Tratado de Lisboa.

Inicia-se hoje um ciclo de novos grilhões.

O nosso 1º de Dezembro até já nem é comemorado. Foi substituído pelo dia Internacional da Sida. Era um dia importante para os Portugueses. Hoje é só mais um feriado, em que o comércio está aberto para as compras/vendas de Natal.

Comemorava-se a libertação completa em relação a Castela e o regresso de Portugal à total independência, após sessenta anos debaixo do jugo dos Filipes. Foi em 1640, há quase trezentos e setenta anos, que as amarras castelhanas foram cortadas. Numa altura em que os Portugueses eram de antes quebrar que torcer, duros, e que lutavam sem tréguas pelos seus direitos.

Hoje ainda os há, assim, mas estão doentes, letárgicos, não reagindo às adversidades nem aos ataques soezes que lhes movem.

Em 1 de Dezembro de 2009, com a entrada em vigor do Tratado de Lisboa, perdemos mais um bocado da soberania nacional. Os mandantes que nos governam, entregaram o poder que detinham em nome do nosso povo, a Bruxelas.

Bruxelas manda e imporá os grilhões que lhe aprouver.

Por causa disso, dia 1º de Dezembro, poderá vir a chamar-se, o dia da subjugação e da vergonha nacionais.

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O PRIMEIRO DE JANEIRO

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CENTO E QUARENTA E UMA VELAS SE APAGAM HOJE

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No dia 1 de Dezembro de 1868, nasceu o jornal «O Primeiro de Janeiro». Deve o seu nome às manifestações da «Janeirinha». Ao longo da sua vida de muitas dezenas de anos, o diário foi crescendo até se tornar no melhor jornal de Portugal. Era uma referência Nacional. Por lá passaram os mais ilustres intelectuais do nosso País. Atravessou períodos conturbados, como a transição para o regime democrático, acabando por se debater com a mais grave crise da sua história, na década de 1980, quando o seu enorme património foi desbaratado. Hoje, o jornal continua, já sem o seu emblemático edifício na Rua de Santa Catarina, e sem os grandes nomes que o ajudaram a consolidar-se a nível Nacional.

«O Primeiro de Janeiro» é, sempre o foi, o «meu» jornal. Por influência de um primo de quem era amicíssimo, grande jornalista que também colaborou no Norte Desportivo, Emílio Loubet, meu pai sempre o teve em sua casa e o leu religiosamente. Uma das imagens que guardo dele, é a de o ver a meu lado, sentado no autocarro da carreira A, a caminho de casa, lendo o Janeiro, dobrando-o cuidadosamente de modo a não incomodar ninguém. Também aprendi nessa altura, como o dobrar, já que era bem maior do que hoje é.

O meu contacto com o jornal, aconteceu, ainda nem ler sabia, nos domingos de manhã, aconchegado na cama de meus pais, a ver avidamente a banda desenhada de «O Príncipe Valente», «O sr Calisto» e o «Zé do Boné». Quase se poderia dizer que foi com aquelas páginas que comecei a ler. Ao longo da minha vida, o Janeiro foi presença diária e leitura obrigatória. Hoje sinto-me honrado em poder ver algumas linhas minhas publicadas neste «meu» jornal.

Actualmente luta-se, lutamos todos os que de uma forma ou de outra colaboramos com o nosso Janeiro, pela continuação da sua existência. Os dias que atravessamos são madrastos e sem complacência. A competição é enorme e só os números das vendas contam. Mas o «O Primeiro de Janeiro» vai continuar, estou convencido disso, cada vez mais forte, a caminho de se tornar de novo, um dia, uma referência no panorama jornalistico Português.

Ainda vamos voltar a ouvir pelas ruas do Porto o pregão: »Olhó Janeeeiiirooo».

Parabéns, Janeiro, pelos teus cento e quarenta e um anos.

O dia mais longo da nossa História

 

 

Em 1995, uma simples afirmação do então presidente Mário Soares, demoliu um mito propagandístico velho de mais de um século. Para grande desespero ou despeito dos sátrapas e escribas do pensamento oficialista, Soares justificava a sua participação como P.R., na cerimónia de Estado em que consistiu o casamento dos actuais Duques de Bragança. Acompanhando naquele importante momento um amigo de décadas, M. S. declarava também estar Portugal a prestar uma homenagem à Casa de Bragança pelos relevantes serviços prestados à Pátria, à sua liberdade e independência.

 

 

Ficaram assim soterradas as grandes tiradas retóricas das Conferências do Casino, os Finis Patriae que culminaram com o Crime no Terreiro do Paço e as justificações fastidiosas, incipientes e vazias de conteúdo histórico escritas por um Oliveira Martins que sendo um impenitente idealista, vergastou a dinastia para acabar por nela reconhecer, sob o turvo prisma do cesarismo, a redenção de Portugal.

 

 

Todas as velhas nações possuem as  datas que calendarizam glórias passageiras, aquelas que ingratamente  o tempo condena ao posterior olvido pelas gerações que não as viveram. Os desastres das batalhas perdidas são frequentemente compensados pela gesta de uns poucos  – o Decepado, o Soldado Milhões ou um D. Sebastião –  que souberam bem morrer ou resgatar a periclitante honra dos outros, que ausentes do campo onde de pé se morria, nem por isso se sentiam menos atingidos por uma tragédia ainda não percebida, mas que inexoravelmente sobre as suas cabeças faria tombar a vingativa espada do inimigo.  Os grilhões apostos aos conquistados, seriam então exemplar justificativo e testemunho do espírito de sacrifício. Santificava-se desta forma aos olhos de um misericordioso Deus que do alto velava pelo seu povo e lhe forjava no ânimo, esse querer de libertação e do retorno a um perdido mas não esquecido tempo, onde a Lei dos naturais conformava a espontaneidade de um sentido de pertença à comunidade, a Grei.

 

A Monarquia Portuguesa criou a nação que somos e essa identidade tem sido ao longo das centúrias, plenamente justificada através de nebulosos e por vezes lendários indícios da especificidade das populações que foram consecutivamente ocupando o território que ainda hoje se chama Portugal. Os lusitanos, os conventos romanos e a criação do primeiro mas efémero Império Ibérico, erguido pela força guerreira visigótica, enraizaram nas mentes daqueles que lhes sucederam, essa certeza do direito à constituição de uma entidade territorial distinta daquelas outras com quem ainda partilhava o idioma e mais importante ainda, a Fé.

 

14 de Agosto de 1385 consistiu talvez, a data a partir da qual este país deixou para sempre a contraditória e incerta condição estatutária  de uma parte independente de uma grande Galiza. Essa confusão decorrente do próprio processo de criação do reino no século XII, ditava uma aparente edição localizada e muito particular do feudalismo que imperava além Pirenéus e que das suas faldas se estendia até à foz do Niémen.  Um qualquer acaso sucessório derivado da morte de um monarca sem descendentes, ou um negociado matrimónio que forjava uma outra realidade política na Respublica Christiana, modificava então as sempre frágeis fronteiras e no tempo fidelizava os povos à nova dinastia. Aljubarrota foi importante, servindo de marco ao reconhecimento do interesse específico  das …"muitas e desvairadas gentes"… que viviam  naquele espaço criado jurídica e perpetuamente pelo tratado de Alcanizes. Os portugueses tinham como cumprida a sua parte na Reconquista da terra outrora cristã, há séculos avassalada e subjugada pelo invasor que viera do outro lado do mar, com desconhecidas línguas, estranhos costumes e exótica divindade.

 

Pela primeira vez uma vitória militar colocava em definitivo, a realidade territorial Portugal, no palco de uma Europa que perdidas as ilusões de uma reunificação que fizesse ressurgir o cristão império romano, levava os seus reis, príncipes ou republicanos condottieris, a gizar alianças, garantindo a sua supremacia sobre rivais e vizinhos. No entanto, Aljubarrota consistiu no culminar de um curto e turbulento período de realinhamento interno de forças políticas, económicas que confluíram no interesse pela preservação da independência que surgia como a essencial condição da prosperidade e realização pessoal de quem mais podia e o repúdio por todos os demais, de um poder estranho e até então considerado inimigo.  O 14 de Agosto escancarou as portas  daquele sentido de urgência de acrescentamento do domínio, cumprindo-se assim simultaneamente, o brado "Deus o Quer" de uma cristandade que tudo podia justificar.

 

A chegada de Gama à Índia, a descoberta do Brasil – uma das grandes e actuais razões do nosso direito a existir como Estado  e inegável símbolo da grandeza histórica de Portugal – e aquela ininterrupta série de espantosas, mas hoje infelizmente esquecidas vitórias nas quentes águas do Índico e do Pacífico ocidental,  podiam almejar ao título da mais importante data da História de Portugal. Contudo, se nos tornaram para sempre visíveis perante um mundo que até então nos ignorava, não foram suficientemente prenhes de consequências que garantissem aquela certeza de pertença e de necessária preservação de um legado já antigo de quase meio milénio.

 

A morte do vate nacional, Camões, num hipotético 10 de Junho de 1580, quando os 
tercios
 de Alba implacavelmente escreviam uma nova página possibilitada pelo desastre de Alcácer Quibir, surgiu para as mentes dos românticos oitocentistas, como única e diamantina oportunidade de distanciamento de uma outra data, que para a totalidade do corpo nacional, servia de pendão de honra ao espírito de resistência que esmagara invasores, rasgara tratados iníquos e galvanizara o ânimo consagrador da liberdade desta nação que há muito era uma Pátria.

 

O dia 10 de Julho será então imaginado pelos seus promotores como a unanimemente aceitável efeméride que divorciaria os portugueses daquela clara manhã de 1640, em que o escudo de armas português para sempre se retirava da simbólica da União Dualista. Esta União – afinal sempre desejada pelos promotores republicanos do 10 de Junho de 1880 – baseara a sua legitimidade na força da espada e no ouro das moedas corruptoras e enlouquecedoras do espírito de discernimento de alguns. O fim último desta tentativa do radicar de um novo marco que seria assim considerado como o mais importante da História de Portugal, era o rebaixamento da dinastia que surgia como um mero e fortuito acaso ou recurso de um grupo de abnegados e bravos redentores a ela alheios.  Fantasiaram-se episódios de resistência do duque D. João e justificou-se a aceitação do Levantamento por parte dos Braganças, pelo "varonil ânimo" da castelhana duquesa D. Luísa de Guzmán.  Construiu-se habilidosamente o mito da indecisão e do espírito timorato daquele, que afinal pela sua prudência, sageza de pensamento e resolução na acção de estadista, garantiu o sucesso da Revolução. Arruinou materialmente a sua Casa, mas ganhou a coroa e a liberdade de Portugal como reino independente que pela força das armas e astúcia dos políticos, conservou o legado ultramarino que ao tempo interessava. É também a definitiva confirmação de um novo vector da nossa presença no mundo, que da Ásia transita para o espaço Atlântico onde ergueria um novo império, o Brasil, ainda hoje um grande entre os maiores.

 

Não cabe aqui o desfiar das desditas que para este país significou o seu achincalhar à condição de província de uma Grande Ibéria que estendia os seus braços à Europa Central, Flandres, Reno, Milão, ao sul da Itália e que transformava vastas regiões católicas do Sacro-Império, em simples dependências ou inevitáveis e subalternas aliadas.

 

1580 reduziu e inferiorizou um Portugal já imperial, com domínios que se estendiam das plagas norte-africanas às costas do Japão. Porto de abrigo e de comércio para todas as nações cristãs, Lisboa habituara-se à presença das alvas gentes do Norte e à colorida presença daqueles que oriundos da África, Índia, China, América ou zona malaia, provavam o senhorio reclamado pelos monarcas que ostentavam orgulhosamente o título de Senhores do Comércio e da Navegação na Guiné, Etiópia, Índia, etc. 

 

A permanente e férrea política de alheamento dos conflitos continentais que esmagavam populações, devastavam campos e semeavam a perniciosa semente da inimizade histórica entre vizinhos, fortificou a consciência da identidade nacional, a necessidade de com todos dialogar e comerciar e o direccionar dos esforços para a preservação e dilatamento do património territorial conseguido com tantos e custosos sacrifícios.

 

Existem algumas efemérides que embora sejam importantes marcos  e signifiquem o início de novas experiências políticas que uma mudança de regime implica – o 24 de Julho, o 5 de Outubro, o 28 de Maio ou o 25 de Abril -, não se revestem daquele transcendente significado que a palavra Liberdade no seu sentido mais lato – o da gente e o da Pátria como entidade política autónoma e internacionalmente reconhecida pelas outras – só é conseguido por aquele dia em que se restaurou a independência portuguesa.

 

O 1º de Dezembro de 1640 é a data mais importante da nossa História, pois se internamente consagra o desejo da totalidade de uma Nação que animicamente já o era há muito, internacionalmente consistiu na confirmação de uma necessidade desejada  por todos aqueles que combatiam uma prepotente e implacável hegemonia, cega ao direito das terras e das gentes. A Restauração foi saudada com efusão em boa parte da Europa e se para alguns consistiu numa oportunidade para o abatimento do Leviatã que há mais de um século ditava a lei nas relações entre Estados, para outros oportunamente surgia como ocasião para a consolidação do esbulho do património luso espalhado pelo mundo. A vontade e o sacrifício abnegado dos portugueses de então, desiludiu aqueles que apenas esperavam um passageiro e apetecido  contratempo  à imperial Espanha de Filipe IV e de Olivares.

 

O dia 1 de Dezembro de 1640, foi o mais longo da nossa História e prolongou-se por  vinte e oito anos de terríveis sacrifícios. Os portugueses bateram-se praticamente sós, contra as duas grandes potências de então – a Espanha e a Holanda -, vencendo uma nos campos de batalha da raia e a outra, a belicosa Batávia, nos mares, no sertão brasileiro, em Angola e nas longínquas paragens asiáticas.  A Guerra da Restauração foi um conflito em múltiplas frentes, onde o ferro da espada e a pluma dos diplomatas e dos grandes homens que juridicamente justificaram perante o mundo a libertação, se irmanaram num indissolúvel elo que garantiu o sucesso final. Se na Europa os terços lusos conseguiram rechaçar a coligação de nações que era o exército dos Habsburgos espanhóis, no além-mar Portugal defrontou e acabou por vencer o mais implacável, fero e traiçoeiro inimigo de que há memória. De facto, a luta contra a talassocracia e o poder financeiro da hostil e exterminadora Holanda, criou tantas e aprioristicamente inultrapassáveis dificuldades, que o resultado da emancipação foi por muito tempo incerto e geralmente considerado como condenado pelas chancelarias europeias, desde o Vaticano às monarquias do Norte. A França surge como transitória protectora interessada em tolher o movimento à sua rival continental que via desprender-se o mais precioso florão da sua coroa e a Inglaterra, baqueava na guerra civil, impotente para o pleno  cumprimento do papel que o velho Tratado de Aliança lhe ditava como obrigação.  Os portugueses – Portugal, um todo – para sempre tornou presente a sua condição de Estado, numa Europa que via nascer e desaparecer entidades políticas, conforme  a

vontade dos grandes do momento e desta ou daquela guerra perdida.  A  memória de 1640 reavivou-se naquela outra Restauração em 1808, quando pela primeira vez derrotado o invasor francês, a legitimidade erguida como bandeira pelo povo, fez saber à Soberania no distante Brasil, o apego da nação à sua liberdade entre as demais. 

 

Portugal inteiro o quis e assim o fez. Lutou, negociou, transigiu por vezes. Contra todos os prognósticos, restaurou a legitimidade do seu Direito e no trono colocou quem dele tinha sido pela força esbulhado em 1580. Venceu o irredutível ânimo de todos, irmanados no resgate de uma liberdade que justificava assim, a própria existência das gentes que alçando  o pendão da nossa terra, tornou seu o brado Liberdade! Liberdade! Viva  D. João IV!

 

É esta a lição dos nossos maiores e hoje, decorridos trezentos e sessenta e nove anos e num momento grave que compromete os ideais de 1640, devemos todos, monárquicos ou republicanos – mas para sempre portugueses – sentir como oportunas, estas palavras:

 

"Todos os que pensarem que o sonho dos fundadores e dos restauradores ainda está vivo, venham ter connosco; e se alguém questionar este crescente sentir do poder do povo, a resposta é hoje, como o foi no 1º de Dezembro: O rei  é livre e nós somos livres!"

 

 

Porque é o 1º de Dezembro

   

 

A nacionalidade, bem ao invés da consuetudinária propaganda pós-iluminista, não consiste num princípio "republicano". Com ela nascemos herdando-a como um privilégio que a origem geográfica impõe, ou desgraçadamente apega-se como um incurável carcinoma que apenas um milagre poderá resolver. 

 

Assim, neste importante aspecto da nossa identidade que é confirmada por fastidiosos preceituados legais que ditam ao mundo o nosso estatuto entre os demais povos, somos todos e cada um à sua maneira, "reis". Ultrapassando barreiras étnicas que uma história multissecular amesquinha, temos a felicidade de beneficiar das garantias burocráticas confirmadas em cartões, bilhetes de Identidade, certidões ou passaportes.  Somos o mais pobre país entre os ricos e o que isto significa numa sociedade completamente alheada dos dramáticos problemas de sobrevivência quotidianamente enfrentados pelos nossos semelhantes, remete-se única e exclusivamente  para o cada vez mais acossado reduto do consumismo que até hoje confere o estatuto.

 

 

A tradição portuguesa que sempre se soube dotar daquele sentido prático das coisas que uma exígua comunidade impunha, estabeleceu ao fim de duas décadas desde a chegada do Gama a Calecute, o princípio da tácita assimilação que propiciou uma muito prolongada sobrevigência de um Império que contra si tinha todas as probabilidades. Fosse no funcionalismo, nos mercados ou nas Armadas, lá estavam sempre os novos-portugueses que a necessidade impunha. Do sertão brasileiro à Guiné de Honório Barreto, dos macaenses ao abnegado heroísmo de D. Aleixo Corte Real e de Aniceto do Rosário, temos esse precioso património humano que garante por si, o nome de Portugal entre os grandes. Distraídos contumazes, temos entre nós os sobreviventes de uma época que parece para sempre perdida e entre estes, ergue-se a figura de um Marcelino da Mata, esquecido por oportunamente técnicas ou suspeitas questões de legitimidade do sistema.

 

Hoje, a cobiçada nacionalidade portuguesa parece apenas acessível a quem muito porfia ao longo de anos a fio, submetendo-se a todo o tipo de questões e prepotências legalistas que os balcões estatais ditam. São tristemente célebres e exasperantes os métodos do SEF e entidades adjacentes que ao invés, por vezes são estranhamente céleres na atribuição do passaporte nacional a meritórios jogadores de futebol e atletas de craveira olímpica. Estes nossos compatriotas, em muitos casos provêm de territórios que pertenceram à soberania portuguesa, o que ajuda a súbitas mudanças de ânimo que facilitam procedimentos claramente concomitantes com a oportunidade da conquista de galardões que prestigiam Portugal.

 

Na véspera do 1º de Dezembro, a data maior da nossa história, surge uma oportunidade única de demonstrar a uma grande potência, a razão da existência de um pequeno país que ao longo de quase meio milénio com ela compartilhou uma reduzida mas significativa fronteira territorial. 

Quando da entrega de Macau à República Popular da China, não passou despercebido um muito simbólico detalhe que os novos proprietários de Macau não deixaram de anotar. Quem comandava a unidade do nosso exército  que de espada em punho representou o nosso país, era um oficial português de etnia chinesa.  Se isto pouco significa para nós, um povo habituado a ver entre os seus gente proveniente de todos os continentes, para a orgulhosa China foi um sinal de uma grandeza que mesmo empalidecida pela inexorável passagem dos tempos, não deixa de ser uma mensagem que vai muito além das meras formalidades que os tratados internacionais e a lei do mais forte parecem garantir. Ainda no último 10 de Junho, as Forças Armadas tiveram a sageza de fazer desfilar as bandeiras históricas de Portugal e todos puderam verificar que uma ou outra era empunhada por alunos do Colégio Militar, cuja origem extra-europeia não oferecia a mínima dúvida.

 

Amanhã passa mais um 1ª de Dezembro. 

 

Portugal não pode arriscar-se a ver um homem recentemente galardoado com uma das mais relevantes – porque significativas naquilo que o seu próprio nome inspira – Ordens Honoríficas, ser expatriado para um país onde os direitos que aqui auferimos com naturalidade, não passam de uma quimera. Seria humilhante para Portugal, saber que o Cavaleiro da Ordem do Infante D. Henrique, o Dr. Jing Guo Ping, desembarcara à força no aeroporto de Pequim e que de Comenda à lapela tivesse seguido imediatamente para um tugúrio prisional onde para sempre desapareceria numa tragédia de maus tratos e brutal coacção moral sobre si e sobre os seus.

Este homem já fez mais pelo nosso país, que regimentos de anónimos deputados, secretários de Estado, ministros e até chefes de go
ve
rno e presidentes. O seu nome ficará para muito tempo ligado ao estudo da presença nacional no Extremo Oriente, defendendo mesmo contra os seus óbvios interesses materiais e de segurança pessoal, a verdade a que a História tem direito.

 

Este homem merece ser e de facto já é, um português de justiça e de Direito. Não se trata de qualquer súbito impulso generoso, concedendo a nacionalidade pelo conhecido princípio de protecção aos perseguidos que a Carta das Nações Unidas nos obriga. É fácil contrariar um país de reduzida influência internacional, escolhendo as nossas autoridades a seu bel-prazer e no cumprimento daquilo que se considera como interesse geral, novos cidadãos capazes de tornar mais conhecido o nome de Portugal. Impedido de trabalhar nos nossos centros de saber e perseguido há anos pela ameaça da expulsão, este homem viu recentemente a Nação reconhecer-lhe a obra e o seu inegável valor que consolida a nossa própria consciência nacional e revigora uma presença secular em longínquas paragens.

 

Não sendo um "dono da bola", um proprietário de casinos ou um magnata na construção de aeroportos off-shore, o Dr. Jin Guo Ping já fez mais por Portugal que a maioria daqueles que ostentam o precioso e invejável passaporte deste país. O Estado não pode ficar agora preso a ínfimas formalidades processuais e deve ser célere e radicalmente incisivo na perfeita delimitação da sua soberania, ditada pela justiça e queiramos ou não, pelo interesse comum. Seremos mais respeitados, quanto mais firmes e ousados formos.

 

Não conheço pessoalmente o Dr. jin Guo Ping, mas como português, sinto-o muito acima da minha pessoa. Este homem deve poder trabalhar e contribuir para a consolidação da existência de um país que enfrenta hoje a mais ameaçadora hora da sua existência.

 

O Estado que o povo reconhece como seu, tem uma obrigação moral ditada até pela decência que deveria ser a norma geral nas relações internacionais.em república".

 

É urgente, vital e inevitável, a imediata atribuição da nacionalidade portuguesa ao Dr. Jin Guo Ping e à sua família refugiada neste país.

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Aqui está um sucinto currículo do Dr. Jin Guo Ping

 

JIN GUOPING

 

 

Natural de Shanghai. Curso de Espanhol de 1965 a 1975 no Colégio anexo à Universidade de Línguas Estrangeiras de Pequim. De 1975 a 1978, licenciatura em linguística hispânica pela Universidade de Línguas Estrangeiras de Pequim. De 1979 a 1981, pós-graduação em português na Universidade de Línguas Estrangeiras de Pequim. De 1981 a 1982, Curso Superior de Cultura e Língua Portuguesa na Universidade de Lisboa. De 1981 a 1986, professor de Português no Departamento de Português da Universidade de Línguas Estrangeiras de Pequim. Em 1986, emigrou para Portugal, onde se dedica actualmente aos estudos da presença portuguesa na China e da história de Macau.

 

 

OBRAS:

 

  As Relações Sino-Portuguesas Histórica e Geograficamente falando, (em chinês),Macau, Fundação Macau, 2000

 

 

 

 O Ocidente ao encontro do Oriente—Um Olhar Retrospectivo dos Primeiros Contactos Sino—Portugueses, (em chinês),Macau, Fundação Macau, 2000

 

 

 

 

 

 

Enciclopédia de Macauem chinês)(aproximadamente 40 entradas e redactor responsável da área histórico-geográfica da edição de 2004,Macau, Fundação Macau, 1999, 2ª edição 2004

 

 

 

 

 Dicionário da História de Macau》(em português)(aproximadamente 100 entradas, Universidade de Macau, 2004no prelo

 

 

 

 

 Fontes Ocidentais sobre Macau, séc. XV-XVIem chinês, vol. I, Edições do Povo de Cantão e  Fundação Macau, 2005

 

 

 

 

 

 

 OBRAS EM PARCERIA:

 

 

 

 

Para a vista do Imperador: memoriais da Dinastia Qing sobre o estabelecimento dos Portugueses em Macau (1808-1887)》(em português)(de parceria com António Vasconcelos de Saldanha, Macau, Instituto Português do Oriente, 2000

 

 

 

 

 

 

História(s) de Macau—-Ficção e Realidade, (em chinês) de parceria com Wu Zhiliang, Macau, Associação de Educação de Adultos de Macau, 2001

 

 

 

 

 

 Em busca de história(s) de Macau apagada(s) pelo tempo, (em chinês) de parceria com Wu Zhiliang, Macau, Associação de Educação de Adultos de Macau, 2002

 

 

 

 

 

 

 Abrindo as Portas do Cerco, (em chinês) de parceria com Wu Zhiliang, Macau, Associação de Educação de Adultos de Macau, 2004

 

 

 

 

 

 

 Embaixada de D. João V de Portugal ao Imperador Yongzheng da China : (1725-1728) em português)(de parceria com Mariagrazia Russo, Lisboa, Fundação Oriente, 2004

 

 

 

 

 

 

 

 

 Navegações chinesas no século XV realidade e ficção em português e inglês)(de parceria com José Manuel Malhão Pereira, Lisboa, Academia de Marinha.  2006

 

 

 

 Macau nos seus primórdiosem chinêsde parceria com Wu ZhiliangEdições do Povo de Cantão e Fundação Macau, 2007