A lógica do Estado corporativo

O referendo é a instituição democrática por excelência e praticamente a única que temos em Portugal. Mesmo as eleições, são de tal maneira formatadas pelos directórios partidários, com candidatos tão afastados do povo e dos problemas, que pouco significado democrático têm.

Mas o que se vê é que nós portugueses, pouco poder  democrático temos e, mesmo esse, rapidamente o transformamos em qualquer coisa pouco credível, ao sabor dos interesses de classes, de pessoas e de corporações.

Há casamento gay? Porque não o referendo? Logo vêm à liça os que querem que a Lei passe, interessa lá o referendo! Regionalização? Venha lá a regionalização e depressa que isso do referendo só atrapalha. E o referendo? Não interessa nada, “eles” resolvem, os tais que passamos a vida a criticar, os tais que não têm credibilidade nenhuma, “eles” tratam, e nós, cidadãos, somos pelas nossas mãos os verbos de encher que merecemos ser!

Na Islândia, o governo queria pagar com o dinheiro do erário público os prejuízos que a economia de casino trouxe ao país, pagando a absurda dívida que têm perante a Inglaterra e a Alemanha. O povo ergueu-se, fez ouvir a sua voz, obrigou o governo a recuar, vai mesmo a referendo, para se saber se os contribuintes estão ou não de acordo em pagar a dívida.

É que a dívida, lá como cá, serviu para os jogos de casino, para o PS se meter no BCP, controlar empresas onde estão os boys, pagar milhões ao BPN e ao BPP, e o que nós vimos são os pequenos depositantes a gritarem nas ruas, porque os grandes, esses, há muito que fizeram os negócios “finos” habituais!

E, claro, com um povo que “se vende por um vintém” não há, nem nunca haverá uma sociedade civil forte, capaz de se fazer ouvir! E o que está em jogo na Islândia é que a Inglaterra pode impedir a sua entrada na UE! Mas principios são principios! Num país, onde muitos acreditam que o que está certo é sacar depressa e bem, só podemos concluir que o déficite democrático está em cada um de nós. Quando nós estamos a ganhar , não há interesses nacionais, nem princípios de razoabilidade, nem injustiças que nos travem.

É que uma corporação, porque tem força, conseguir o que quer perante um Estado fraco, é rigorosamente igual à Motta-Engil ganhar obras sem concurso e o Vara ser administrador de bancos. Podem sempre dizer para os outros fazerem o mesmo, mas os velhos e os pobres não têm como pagar as camionetas que são precisas para trazer até à Av. da Liberdade 150 000 pessoas. E os fortes são cada vez mais fortes e os fracos cada vez mais fracos. É a isto a que se chega com a lógica corporativa.

Na Justiça, os jovens Juízes, com 28 anos e saídos da Escola Superior de Justiça, sem qualquer experiência, ganham 2 500,00 euros/mês! Os médicos para aceitarem (aceitarem!) ir para a província, além do ordenado recebem uma subvenção, e depois enxotam os seus colegas Cubanos que trabalham por metade do ordenado!

Um país cada vez mais injusto ! O Estado corporativo que Salazar sonhou mas que nunca conseguiu levar tão longe como nós conseguimos, em apenas 30 anos de democracia!