Um dos aspectos mais relevantes da cultura política presente nesta fase do regime, consiste no apurado sentido de oportunidade. Quando se anuncia uma medida, esta coincide sempre com a pertinente conveniência do momento. Assim sendo e procurando apaziguar as tensões despoletadas pelas movimentações de rua, o governo decidiu baixar o IVA a aplicar a uma actividade de reconhecida utilidade social. De facto, o golfe é um “desporto de massas” e coaduna-se com um estilo de vida saudável, tão do agrado de alguns dos principais agentes políticos. Oxigenar os pulmões em infindos relvados que verdejam um país visto do espaço e impedem a construção caótica que descaracteriza a paisagem, além de consistir num exercício gratuito e especialmente indicado para fumadores inveterados de charutos vendidos pela ditadura cubana – aqui está mais uma luta pela liberdade, não se transferindo dinheiro para Havana -, mitiga pela marcha forçada, a acumulação de gorduras no baixo ventre e toda uma panóplia de maleitas que de forma infalível, sobrecarregam o Serviço Nacional de Saúde: diabetes, disfunção sexual, pé chato, hemorróidas, fístulas anais ou por exemplo, hepatites várias.
O golfe é uma actividade física de módico preço, pois apenas requer umas anacrónicas calças pinçadas à cigano, uns sapatos de tipo inglês – daqueles antigos e com furinhos -, um polo com um crocodilo de imitação a rir para o lado errado – na feira estão disponíveis por 5€ – e uma espécie de “pau de ferro” com a ponta retorcida. Vincando ainda mais a origem retintamente popular da coisa, a farda completa-se com um boné à mitra, copiadinho dos transeuntes e vendedores de branca do nosso little Bronx, ali para os lados do Bairro Alto .
O povinho anda mal educado e com demasiados tiques burgueses. Quer estádios milionários, escolas com pavilhões desportivos, piscinas cobertas e com água tépida, pistas para bicicletas e outras tantas excentricidades, destinadas a encher os bolsos das betoneiras de serviço ao esquema vigente. Mas o dinheiro acabou, contente-se com relvados.
Sigam o exemplo de Sampaio. De vez em quando veste-se como deve, embrulha a sandeca de courato gourmet num plástico do Minipreço e de stick em punho, lá vai ele até à Quinta da Marinha. Naquele ambiente tipicamente rural e a lembrar o Portugal da Aldeia da Roupa Branca, mistura-se com a vacaria que por lá pasta produtos biológicos e remói orgulhosos pensamentos de adesão a uma certa ideia de progresso, por sinal ecologista, nada materialista e bem à disposição de todos.
Se as outras modalidades desportivas forem taxadas com o mesmo IVA, a situação não me incomoda. O que me deixa furiosa é verificar que há bens der consumo, como é o gaz, bem absolutamente necessário para todas as classes sociais, tenham rendimentos elevados ou baixos, e que tenha aplicada a taxa máxima desse imposto.