Série Maridos (III)

UM MARIDO CLANDESTINO

F. era uma mulher trabalhadora, que saía de casa infinitamente cedo, para fazer um trabalho matinalíssimo que nunca percebi em que consistia. À tarde, logo a seguir ao almoço, regressava a casa, tomava um banho de imersão e estendia-se ao comprido no sofá da sala. Pelas cinco da tarde começava a receber amigos. Bebiam vinho branco e comiam marisco. Conversavam até apetecer.

F. tinha dois cães e vários gatos belíssimos, de pelagens e cores diferentes, espalhados pela casa e estacionados em toda a parte – nos sofás, em cima dos móveis, no topo das estantes. Os gatos de F. pareciam criados indianos dedicados à esteta tarefa de enquadrar a mulher num ambiente atapetado e requintado.

Naquele dia descobri o marido de F. a fumar cigarros franceses Gauloises Maȉz na varanda da cozinha da casa de F.. Vivia no quarto contíguo à cozinha, onde passava a totalidade do tempo que estava em casa. Explicou-me que estavam separados há anos mas que haviam decidido permanecer no mesmo espaço por falta de liquidez para adquirirem outra casa. Faziam vidas aparte, cada um entregue à sua solidão, e o marido de F. retribuía o alojamento passeando os cães da mulher.

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