MADAME VIAN
Julgo que soube que ele era meu marido quando li A Espuma dos dias pela segunda de muitas mais vezes. Entretanto, especializei-me na observação das formigas e na audição das suas canções, cantadas por ele e por outros: Je Bois, J’suis Snob, La Java des Temps Modernes, La Complainte du Progrès (esse hino à vida conjugal), e também aquelas canções celebradoras da vida, dos dias de sol, da magia das ruas da grande cidade, como a belíssima La Rue Watt, e por aí fora. Mas foi quando o traduzi (uma compilação de citações e aforismos seus) que confirmei esse casamento espiritual extraordinário. Comunhão que de resto me levara já a criar para um romance uma personagem chamada Boris Viana, ser incerto e múltiplo que quisera ser poema e surge fantástico num cenário português realista e salazarento a andar de eléctrico 28.
Bem sei que nasci cinco anos depois de Boris ter morrido. Que importa isso? Conheço uma mulher que é espiritualmente casada com o fotógrafo Nadar, que é ainda mais antigo. Mme. Nadar.
N’oublie pas ton tricot quand tu partiras ta trompinette sous le bras, il fait froid mon amour. (Não me lembro de ser assim tão carinhosa e maternal com nenhum marido real. Conclusão: um bom marido faz uma boa mulher.)
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