Quem vê futebois não vê opressões

A comunicação social já está de olhos postos no Portugal X Turquia de amanhã. Como sempre, mesmo em tempos de guerra, nada como o futebol para interferir com a grelha informativa, há um mês obcecada, como nunca, por uma das muitas guerras que decorrem no planeta Terra.

O jogo é a primeira etapa dos playoffs que poderão levar Portugal ao Mundial do Qatar. Um Mundial marcado desde cedo por suspeitas de corrupção na escolha do anfitrião. Um Mundial que acontece numa monarquia absoluta, com níveis de opressão não muito diferentes dos da Federação Russa, que também organizou, recentemente, um Campeonato do Mundo de Futebol. Um Mundial ensombrado pelas denúncias internacionais de abuso de direitos humanos, com trabalho escravo na construção dos estádios e infraestruturas, sem condições dignas, que de resto levou à morte de mais de 6500 trabalhadores. Ou escravos, como preferirem, até porque, em muitos casos, os “trabalhadores” podem legalmente ser sujeitos ao trabalho escravo, não podendo sequer ausentar-se do país sem autorização do patrão. Ou, se preferirem, do oligarca lá do sítio.

Este Qatar, onde queremos muito estar no próximo Verão, é um regime totalitário, que tem na sharia todos os seus códigos legislativos relevantes. Que é parte envolvida na destruição em curso do Iémen. Que trata as mulheres como seres inferiores à guarda dos homens, sempre sujeitas ao chicote, por qualquer ninharia. Que persegue e brutaliza a comunidade LGBT. Um país de censura e de cadeias repletas de jornalistas, opositores e activistas. Um país onde a flagelação e a lapidação são uma opção. Um país onde a democracia não existe. Um país com um regime tão ou mais brutal que o russo. Um país que ninguém ousa boicotar. Os seus aliados ocidentais nunca o permitiriam.

Viva o futebol, viva a FIFA e vivam os seus hashtags tipo #StopRacism e #StopViolence. Valem tanto como a “desnazificação” do Putin.

Comments

  1. balio says:

    Presumo que o João Mendes ache que os Mundiais de futebol só deveriam poder ser organizados por países que satisfizessem os elevados padrões morais do João Mendes.
    Felizmente, no entanto, as autoridades do futebol servem para proteger e fomentar esse desporto, e não para aplicar elevados padrões morais – os quais têm o inconveniente de ser dependentes da pessoa que os produz.
    Para o João Mendes a charia (que aliás tem pelo menos quatro versões diferentes) é uma coisa horrível mas, veja-se lá, para centenas de milhões de seres humanos ela é um excelente padrão moral.
    Enfim, o João Mendes tem o direito de ter a sua opinião e de exprimi-la, tal como qualquer outra pessoa. Felizmente, porém, ele não manda no mundo.
    Nem sequer no futebol.

    • Paulo Marques says:

      Entre um padrão moral e um padrão legal vai uma vasta diferença. Como se vê também no cristianismo, essas centenas de milhões se calhar não assim tão literais sobre os costumes… quando têm direito a voz.
      Mas quanto a competições desportivas, mesmo com dentro da hipocrisia da FIFA, podia haver mínimos. Nem sequer são coisas que levem benefícios aos países; muito pelo contrário, os únicos a beneficiar são as elites.
      Mas numa coisa tem toda a razão, a moral não manda no mundo, muito menos no futebol. Por muita publicidade que façam https://www.fifa.com/social-impact/human-rights


  2. Somente uma pequena correção ao Post. O mundial decorrerá em Novembro-Dezembro de 2022, pois percebeu-se que jogar a mais de 40ºC não era uma boa ideia… mais uma prova de que o bem estar dos trabalhadores, neste caso os jogadores, não era relevante na escolha do Qatar.