E se não mexêssemos nos programas de Português?

Joana Fonte defende, no P3 de 21 de Agosto uma “revisão ao programa de Português”, começando por afirmar que, no ensino secundário, “há alunos que perdem o gosto pela disciplina de Português – se algum dia o tiveram.” Depreende-se, tendo em conta o objectivo da autora, que haverá uma relação entre o programa a rever e a perda de gosto de alguns alunos. Seria importante, a propósito, saber em que se baseia para afirmar que há alunos que perdem o gosto e, sobretudo, se são muitos, poucos ou nem por isso. Estará isso estudado ou é uma mera impressão pessoal?

Nesse mesmo parágrafo, surge um verbo muito usado em discursos sobre Educação, o verbo ‘identificar-se’: “Os e as estudantes lutam por conseguir identificar-se com a linguagem de Fernão Lopes, Gil Vicente, Almeida Garrett, Eça de Queirós, Luís de Camões e Fernando Pessoa.”

Esse ‘identificar-se’ está muito na moda no que se refere, repito, a uma determinada visão da Educação. É sinal de um pensamento que encara o currículo escolar como um conjunto de conteúdos que não causem nenhum estranhamento ao aluno, como se o estranhamento não fosse, entre outras virtualidades, um caminho para o conhecimento, com tudo o que esta palavra deve implicar, incluindo o exercício do espírito crítico (em tempos de proscrição de palavras e conceitos, é estranhamente fundamental reafirmar o óbvio). Assim, o aluno, na Escola, só deveria encontrar a sua própria identidade, como se a Escola fosse um simples espelho e não um território onde deverá encontrar desafios minimamente controlados. Ainda por cima, esta ideia de uma identificação é redutora sob variadíssimos pontos de vista, desde logo porque parte do princípio de que os alunos são um todo uniforme por pertencerem a uma mesma geração.

[Read more…]

Não vão chatear o Camões

BXK8813_tumulo_de_luis_de_camoes_lisboa800Incapazes de uma abordagem ao mesmo tempo séria e holística da coisa educativa, os responsáveis pela Educação, políticos e não só, têm contribuído para a destruição do currículo, entre muitos outros malefícios provocados no sistema educativo.

Várias ideias (mal) feitas se foram instalando e ocupando demasiado espaço na reflexão sobre ou na concepção do currículo: ir ao encontro dos interesses dos alunos, transformar o lúdico na essência do acto de ensinar ou simplificar conteúdos ainda antes de se saber se são complicados. Em duas palavras: facilitismo e deslumbramento.

Ao comemorar vinte anos, a revista Visão resolveu pedir a José Luís Peixoto que transformasse em contos os cantos d’Os Lusíadas, publicitando a ideia de que o escritor irá actualizar a epopeia camoniana. [Read more…]

Cantando espalharei por toda parte/partilhai e espalhai a mensagem

Ricardo Costa 1142013
Ricardo Costa, director de um jornal que, há cerca de três anos, decidiu “poupar letras” e *adotar o acordo ortográfico, diz que este texto “não corre o risco de ser muito partilhado no Facebook e de circular na net por um ou dois anos”. Antes pelo contrário, Ricardo Costa. No que me diz respeito, considerando a incontestável qualidade da grafia empregada (sim, no segundo parágrafo, aparece uma *fatura, mas gralhas, como falhas, todos as temos) e respondendo ao apelo com que remata o texto (“partilhai e espalhai a mensagem”), como diria o Poeta, “cantando espalharei por toda parte, se a tanto me ajudar o engenho e arte”, por um, dois, quatro, seis ou mais anos se for preciso: no Facebook, sim, claro, mas também no Twitter, pois então.
Gostei muito deste texto, Ricardo Costa. Muito obrigado. Melhor prenda no meu primeiro aniversário no Aventar não era impossível, é verdade, mas admito que era difícil.
Agora, só falta fazer-se justiça. Sim, justiça. Falta o Expresso deixar de utilizar várias grafias e permitir que os seus jornalistas possam adoptar a grafia do director, uma grafia que, afinal, também é deles. Exactamente.