Não bastavam as Leis da República portuguesa

Segundo especialistas, os juízes Neto de Moura e Maria Luísa Arantes também interpretaram mal a Bíblia na fundamentação do acórdão…

Levante-se o réu

Num bizarro acórdão recente (de 11.10.2017) do Tribunal da Relação do Porto, lavrado por um presumível juiz denominado Neto de Moura, a pena ligeira aplicada num caso grave de violência doméstica foi justificada com um patético conjunto de argumentos, ora bíblicos, ora literalmente lapidares, uns mais trogloditas do que outros, mas todos eles inconcebíveis à luz da civilização e da mais elementar formação cívica.

O caso daria para muitos considerandos sobre o carácter frequentemente insano e disfuncional da justiça portuguesa. Como não tenho tempo, nem as criaturas me merecem tanto latim, lembro apenas que, ao contrário do poder político, do poder militar e até do poder económico, o poder judicial nunca teve o seu 25 de Abril. Os detentores deste (enorme) poder são, ainda assim, equiparados a órgão de soberania – tendo porém um sindicato e direito a fazer greve, outra bizarria do sistema democrático lusitano – embora não sejam eleitos nem escrutinados por ninguém, a não ser por eles próprios. [Read more…]

Juízes salazaristas em funções

Este acórdão do Tribunal da Relação do Porto é daquelas coisas que não precisa de comentário. Precisa de recurso para tribunal superior e destituição destes juízes, por serem manifestamente destituídos de conhecimento sobre o estado de direito actual. Só interessa falar/escrever/discorrer (…) sobre como fazer.

Não é vítima de violência doméstica quem quer

Um homem, ou algo parecido, foi condenado pelo crime de violência doméstica e recorreu para o Tribunal da Relação de Évora.

O Tribunal da Relação de Évora não negou que o arguido tenha agredido diversas vezes a mulher, desde 2004. Não pôs em causa que no dia “06 de Junho de 2008, o arguido, agricultor, agrediu a mulher com uma cadeira, dando-lhe uma pancada no peito e provocando-lhe uma contusão da parede torácica, um hematoma na região frontal e na mama e escoriações nos lábios e cotovelo.” O mesmo tribunal, no entanto, considerou que a sentença da primeira instância é vaga e, a propósito das agressões não “esclarece o número de ocasiões em que as agressões ocorreram, a quantidade de murros e pontapés em causa ou qualquer elemento relativo à forma e intensidade como foram desferidos, ao local do corpo da ofendida atingido e suas consequências, em termos de lesões corporais.” Finalmente, a propósito da agressão do dia 6 de Junho de 2008, o Tribunal da Relação de Évora considerou que “uma contusão da parede torácica, um hematoma na região frontal e na mama e escoriações nos lábios e cotovelo” não configuram uma agressão “suficientemente intensa”.

Não me espantaria que os juízes, para terem chegado a uma conclusão destas, tenham experimentado ser agredidos com um sofá de três lugares, uma cristaleira antiga e uma cama IKEA. Face a isso, o que vale, efectivamente, uma cadeira? Para além disso, esteve mal a vítima ao não trazer consigo um caderno onde fosse anotando, em pormenor, as agressões do marido, desde 2004. Será importante, aliás, que as mulheres portuguesas aprendam a lição e tenham sempre material de escrita à mão, o que lhes poderá ser útil enquanto o marido lhes dá pontapés na cara ou outros afagos menos intensos.

Enfim, é bonito registar como há uma saudável concorrência entre os tribunais.

Meninas, fiquem a saber

Segundo o Tribunal da Relação do Porto:

I – O crime de Violação, previsto no artigo 164.º, n.º 1, do CP, é um crime de execução vinculada, i.é., tem de ser cometido por meio de violência, ameaça grave ou acto que coloque a vítima em estado de inconsciência ou de impossibilidade de resistir.

II – O agente só comete o crime se, na concretização da execução do acto sexual, ainda que tentado, se debater com a pessoa da vítima, de forma a poder-se falar em “violência”.

III – A força física destinada a vencer a resistência da vítima pressupõe que esta manifeste de forma positiva, inequívoca e relevante a sua oposição à prática do acto.

IV – A recusa meramente verbal ou a ausência de vontade, de adesão ou de consentimento da ofendida são, por si só, insuficientes para se julgar verificado o crime de Violação.


[Read more…]

Uma violação sem violência

 

Médico absolvido de violação porque não foi muito violento

 

aqui escrevi sobre um acórdão do Tribunal da Relação do Porto relativo a um caso de violação. Mais uma vez, a realidade parece ultrapassar a ficção: o dito Tribunal não considerou violento o comportamento de um homem que agarrou a cabeça de uma mulher para a obrigar a fazer sexo oral e que a empurrou contra um sofá para manter relações. Note-se que os actos descritos foram dados como provados e acrescente-se que o homem é psiquiatra e a mulher era sua paciente e estava grávida.

Digam lá: não considerariam inverosímil um filme que tivesse um enredo destes?

Violei-a, mas foi só um bocadinho

O humor é um vírus para o qual não há antibiótico. É por isso que se insinua no meio dos assuntos mais sérios, é por isso que não há tragédia que não dê origem a um ror de anedotas, como é o caso recente da morte de Carlos Castro, como aconteceu com os mortos de Entre-os-Rios.

Sobre violação, por exemplo, há algumas piadas extraordinárias, como, por exemplo, a das duas freiras violadas por dois homens: enquanto uma pede a Deus que perdoe o violador “porque ele não sabe o que faz.” a outra responde “Fala por ti, o meu é um artista!” No genial A vida de Brian dos Monty Python, a mãe da personagem principal confessa-lhe que ele é fruto de uma relação com um centurião romano. Brian, então, pergunta à mãe se ela foi violada, ao que a senhora responde: “Bem, a princípio, sim!”

Como é costume, não há ficção que não seja ultrapassada pela realidade e o Tribunal da Relação do Porto considerou que deveria ser reduzida a pena a um homem, considerando que o crime de violação se consumou “de uma forma grave – introdução dos dedos na vagina – mas de uma forma menos gravosa que por exemplo as situações de coito, sendo que o acto praticado aconteceu uma vez”. Em conclusão, desde que a rapaziada se fique pelos trabalhos manuais, os incómodos causados pela justiça serão menores. Os danos psicológicos causados à vítima são ainda menos importantes.

Para além disso, o mesmo homem viu reduzida também a pena relativa a dois crimes de rapto, uma vez que a “privação de liberdade das vítimas se cifrou em alguns momentos que não terão ao atingido uma hora” e o meio empregado “foi o mais suave, a astúcia (…).” Perceberam? Se conseguirem privar alguém da liberdade durante menos de uma hora ainda se arriscam a que nem seja considerado rapto. Se usarem de astúcia, ainda poderão demonstrar competências suficientes para receberem um diploma das Novas Oportunidades.

Só espero que as Produções Fictícias comecem a ler com mais atenção os acórdãos do Tribunal da Relação do Porto.