“Não é por aí. Não é por aí…”

Olho para a fila das 28 caixas de pagamento do hipermercado e percebo que só duas estão a funcionar. Escolho a que menos gente tem e aguardo com dois artigos na mão. Um funcionário solícito aborda-me para que eu use as máquinas de pagamento “self-service”. Declino o convite, dizendo que preferia esperar numa caixa, pois estaria a defender o posto de trabalho de quem nela trabalha. Tive como resposta uma frase que me fez soar uma espécie de alarme: ” Pronto… Opiniões não se discutem“. Reflecti de modo relâmpago em semelhante afirmação. “Opiniões não se discutem“?! Gostos, sim, agora opiniões?! Optei por lhe explicar o que eu pensava ser óbvio: “Um dia que os funcionários das caixas sejam todos substituídos por máquinas, mais desemprego vamos ter, e já basta como ele está. É por isso que prefiro esperar aqui“. Contava que a coisa ficasse por aí, mas foi muito breve a minha ingenuidade, pois recebi de volta uma frase lapidar: “Não é por aí. Não é por aí…“. Tal fez-me recolher ao silêncio, com a ajuda de algumas vozes de concórdia de quem me acompanhava na fila. Não que não tivesse resposta, mas tinha de tão pronta quanto brusca e, provavelmente, mais ainda de inócua face ao meu interlocutor. O que pensei, para mim guardo. E cada um que agora pense que lhe aprouver do que ora acabo de contar.

Comments

  1. Resta saber se o funcionário entendeu a mensagem. A sério. É que cada vez mais tenho a sensação, aliás a certeza, que mais pessoas conseguem perceber menos coisas.

    • 😆 É para isso que serve a Escola… Formatação de Escravos apenas para servirem de Peças das Corporações…

  2. É evidente que o Escravo não entendeu a mensagem… Só a vai entender quando for substituído por um escravo robô… Do Futuro!

    “Sim do FUTURO, mas que dentro de alguns meses será o PRESENTE! Foi graças à empresa Rethink Robotics que o seu Pai (sim os homens já não necessitam das Mulheres para terem filhos!) Rodney Brooks conseguiu, após longa gestação, parir o Baxter… Com este BELO ESCRAVO ROBÔ, os ESCRAVOS HUMANOS podem começar a fazer contas à vida, pois o FUTURO será o DESEMPREGO…

    Qual vai ser a CORPORAÇÃO que não vai querer TROCAR OS ESCRAVOS HUMANOS, por este BELO ESCRAVO ROBÔ? Sim porque este menino é barato, e só precisa de manutenção e energia! Os obsoletos ESCRAVOS HUMANOS só dão dores de cabeça… Eles ficam doentes, as fêmeas grávidas, todos querem férias, e dias de folga, e horas para comer, e pausas para fumar, e pausas para irem urinar ou defecar, pior… Muitos querem subsídios de férias e natal e cartões de crédito e carros da empresa (escravos de nível superior!) e sabe-se lá mais o quê!

    Enfim… Finalmente a VERDADEIRA SOLUÇÃO está a chegar… Já faltou mais!”

    “Não é por aí. Não é por aí…“ Pois não… É por ali

    REALMENTE… Os Escravos não aprendem… Nem à pancada!

  3. Esqueci-me da política de moderação de comentários! E enquanto a outra aguarda autorização (ligações para 3 imagens) referi que o mesmo já se passou nos postos de abastecimento de combustível… Raro é o que ainda tem funcionários a abastecer os veículos… E nos Bancos igual! E enfim… tantos exemplos… Basta reflectir um pouco!

  4. Por não ter usado as caixas automáticas, acabou por atirar para o desemprego toda uma equipa de engenheiro electrónicos, programadores e gestores de sistemas.

    Parabéns, prefere manter os nossos jovens a trabalhar nas caixas do supermercado do que em empregos qualificados geradores de valor acrescentado.

    (nota: eu também prefiro usar caixas com seres humanos, mas por motivos completamente distintos)

    • Ao contrário do Marco, eu interpreto a situação de outra forma:
      JMário Teixeira tem alguma lógica no seu pensamento e apresentou-o ao funcionário. O funcionário, que é humano e não uma máquina, ou não percebeu o teor da mensagem ou é analfabeto funcional. E, descontente, contesta a opinião.
      Talvez a criatura não tenha percebido que, no fundo, era daquele posto de trabalho de que se falava.

      E eu também sou apologista de que, para as empresas, a troca de humanos por máquinas resulta em saldo positivo, sempre positivo. Às vezes há ganhos financeiros mas há perdas de outra natureza.

      Faz-me lembrar um caso recente em França. Está muito na moda hotéis low cost de pé de estrada. Recepção automática, papel com código, pagamento com cartão.
      Do outro lado da rua, o mesmo conceito low cost mas com atendimento humano. Diferença de preço: um ou dois euros.

      Em qual acho que me abriguei?

      • Por isso é que eu disse que também preferia caixas com operadores humanos; mas não é pelo argumento do emprego, que é absurdo, como dicou demonstrado durante a Revolução Industrial.

        O argumento ludista foi desacreditado, mas parece que anda muito em voga novamente.

  5. “empregos qualificados geradores de valor acrescentado” esta agora é que me partiu todo 😆 😆 😆 😆 😆 😆 😆 😆

    A eterna ILUSÃO de que nesta Civilização TODOS podemos SER ALGUÉM… Desde de ESTUDEMOS MUITO, E TRABALHEMOS AINDA MAIS… Anda por aí algo de estranho no ar!

    Como é que é… ” O trabalho é uma honra” 🙄

    • “O trabalho é um direito”. E dá saúde.…

      • E já agora “O trabalho te liberta” 🙄

        O que dá saúde não é o trabalho! Pelo menos na concepção moderna de “trabalho”…

      • É também um mal necessário para muitos…o trabalho por dinheiro, digo.

        • Trabalho por dinheiro parece-me bem.
          Há já quem troque trabalho por uma taça de arroz. Acho “que não é por aí”.

          • O que me chateia é aquilo de que não fica outra. O esquema, o dinheiro como via de sustento e a dependência do trabalho, por miserável que se apresente. E os usos e abusos dessa dependência.

        • Corrijo-me: mal necessário para muitas pessoas, em lugar de muitos.

  6. jorge fliscorno says:

    É por isso que não tenho Via Verde. Por isso e porque acho que não faz sentido eu comprar a caixa registadora para pagar a portagem.

    • nightwishpt says:

      Não adianta de nada, há portagens onde já só há pagamentos electrónicos.
      Já para não falar nas SCUT.

      • jorge fliscorno says:

        Não cria emprego. Mas a caixa registadora continua a ser da Brisa. A via verde ser paga pelo consumidor é o equivalente de ir à mercearia e ter que comparar a caixa registadora.

  7. Mike says:

    Por acaso as caixas self-service também têm operadores especificos, e em caso de muito movimento até podem ter mais do que uma caixa normal, já que para além de um operador de controlo que vai verificando os produtos registados pelo cliente (normalmente um por cada duas caixas) ainda há assistentes para auxiliar os clientes menos experientes e um costumeiro segurança para evitar tentações de clientes mais ariscos…
    De resto as caixas self-service só se aplicam a clientes com poucas compras e sem carrinho, exactamente para tornar mais expedito o serviço a esses clientes.
    Por isso talvez o funcionário tivesse alguma razão a dizer que “não é por aí” que se combate o desemprego…

    • Que justificação da TRETA!

      Então porque raio é que acabaram com o que já havia: As caixas exclusivas para clientes com número reduzido de artigos?

      SIMPLES: LUCRO!
      O resto é TRETA!

      Eu por mim até podiam substituir todos os funcionários das caixas e serviços acessórios por Baxter’s… Pode ser que então abram a pestana…

      É por estas e por outras que Escravo não deixará de ser Escravo…

  8. Nos dias de hoje é-se escravo de livre vontade e luta-se por esse posto como sobrevivência.
    Deixar de usar as caixas normais não vai tornar tudo qualificado, apenas aumentar o desemprego. Mas isso é a ordem natural das coisas, parece…

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