Rolf Dohmerer
O seu nome é Dambisa Moyo, uma jovem economista zambiana que estudou nas Universidades de Harvard e Oxford estando actualmente a trabalhar na Goldman Sachs, um dos maiores Bancos de Investimento do mundo. Ela acaba de publicar um livro intitulado Dead Aid, em contraposição ao Live Aid liderado por Bob Geldof.
Dambisa Moyo defende no seu livro o fim das ajudas financeiras dos países ricos para o continente africano. Esta posição defendida por Dambisa Moyo não é nova pois já foi defendida por outros economistas africanos porém nunca ganhou a notoriedade e o protagonismo mediático, como agora, com esta jovem economista zambiana, considerada recentemente pela “Time Magazine” como uma das 100 personalidades mais influentes do mundo.
No seu livro Dambisa Moyo argumenta que o apoio internacional ilimitado dos países ricos ao desenvolvimento dos países africanos tem sido prejudicial porque tem contribuído para desincentivar o empreendedorismo local e a iniciativa privada, estimulando uma dependência em relação às ajudas financeiras que encoraja a corrupção, a má governação e a pobreza.
Uma situação que é do particular interesse das ONG’s, promotoras das ajudas internacionais, pois permite-lhes manter o seu statuo quo, porque se a ajuda internacional fosse bem sucedida na promoção do progresso e na redução da pobreza muitas das actuais ONG’s ficariam sem trabalho e acabariam por ficar fora do negócio.
Particularmente, creio que este é um dos argumentos mais fortes de Dambisa Moyo.
Ela propõe no seu livro, o fim da ajuda financeira internacional dentro de 5 anos e paralelamente permitir aos países, pobres o livre acesso aos mercados de capitais internacionais. Além disso, propõe um reforço do investimento estrangeiro chinês e das remessas dos emigrantes, e por fim, um maior estímulo do comércio justo e do micro-crédito.
Dambisa Moyo acredita que induzindo os governos africanos para a obtenção de financiamento numa base comercial, forçará a criação de condições para que as empresas sejam mais bem sucedidas. Argumenta que tornando a vida dos maus devedores mais cara, os mercados obrigacionistas obrigarão os Estados a serem mais eficientes na aplicação dos seus recursos.
As suas posições geraram muita controvérsia, especialmente, entre as ONG’s que argumentam que não existem evidências científicas que suportem os seus argumentos, nem que desmintam alguns casos de sucesso que ocorreram durante os 60 anos de ajudas internacionais ao continente africano. O maior receio das ONG’s com a proliferação das ideias de Dambisa Moyo, é o facto dos países doadores de fundos encontrem nesta economista zambiana um pretexto para reduzir as ajudas financeiras nos seus orçamentos.
Não sou um particular fã das ONG’s, porque elas no fundo são uma indústria, ou seja um negócio, cuja missão entra em contradição com a sua própria actividade. No entanto, reconheço que existem algumas ONG’s com uma função bastante meritória. Gostava de incluir neste artigo um exemplo referido por um economista queniano numa entrevista ao jornal alemão “Der Spiegel”, em que descreve a forma artificial e perniciosa como as ONG’s criam emprego no continente africano.
Afirmava ele que, normalmente, os recrutamentos das ONG’s em África são muito concorridos e bastante selectivos. Por exemplo, para uma posição de motorista, dificilmente um nativo sem fluência na língua inglesa é contratado, por essa mesma razão. No final do processo de selecção é frequente podermos encontrar, por exemplo, um bioquímico africano a trabalhar como motorista. Não gostava de fazer muitos comentários sobre o exemplo descrito, a não ser, que se trata de uma verdadeira amputação de capital humano.
Do meu ponto vista, existem várias fragilidades nas considerações de Dambisa Moyo, não existe nenhuma evidência que o fim das ajudas internacionais contribua para a extinção da corrupção, logo, para uma melhor governação. Aliás, considero que o fim das ajudas internacionais apenas vai contribuir para a transferência da corrupção para outros recursos, contribuindo apenas para fomentar o sentimento de injustiça já existente, aumentando os riscos de desagregação económica e social.
Não creio que seja viável o livre acesso aos mercados de capitais internacionais, principalmente o mercado obrigacionista, porque muitos dos países pobres não estão em condições de se submeterem ao escrutínio das agências de “rating”. Além disso, o prémio de risco associado à emissão tornaria totalmente incomportável essa opção de financiamento soberana, pois seria excessivamente cara.
Falar em comércio justo é, simplesmente, utópico, quando sabemos que existem países que utilizam a desvalorização cambial como vantagem competitiva nos mercados mundiais, sem mencionar, a cultura de subsídios que existem em muitos sectores económicos e o proteccionismo camuflado que existe nos países ricos. A título de exemplo, seria totalmente irreal, um candidato a Primeiro-ministro na França defender o fim dos subsídios e das taxas alfandegárias na agricultura, pela simples razão, que esse candidato jamais seria eleito defendendo estas posições.
Em relação às remessas dos emigrantes, como podemos constatar com a actual crise económica, elas estão sujeitas a um grande factor de volatilidade. O ponto mais sólido parece-me a escolha da China como parceiro estratégico, uma economia caracterizada por um excesso de poupança; com um grande nível de reservas de divisas, com um crescimento voraz que parece resistir à crise mundial, sem mencionar, a afinidade ideológica e social que gera compreensão mútua, a parceria chinesa parece ser a mais perfeita.
No entanto, gostava de sublinhar que não se deve encarar a ajuda internacional como caridade, mas sim como oportunidade. O fundamental é o combate à corrupção com o reforço da lei e das instituições, para que os fundos recebidos possam ser aplicados da forma mais eficiente possível. Quem doa não pode demitir-se da sua responsabilidade de monitorizar, controlar e auditar os fundos doados. E quem recebe não pode demitir-se da sua responsabilidade de conhecer quais são os seus pontos fortes e os seus pontos fracos, quais são as suas vantagens competitivas e comparativas, onde estão as melhores oportunidades para aplicar os fundos recebidos.
É da máxima importância que os fundos sejam aplicados com o maior profissionalismo possível, em projectos apoiados em planos de negócios bem elaborados, que permitam dar uma orientação estratégica a cada projecto e demonstrar a sua inequívoca viabilidade económica. Creio que este é o melhor caminho para alcançar a desejada prosperidade e virar a última página do capítulo dedicado à corrupção e à má governação em África.
Miguel Blasco
Tudo, mas tudo, é transformado em negócio. Há muito que se sabe que grande parte do dinheiro não chega ao destino!