quem me dera ser criança e saber perdoar…

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Para a Sua Excelência, o Presidente Allende.

Estou certo de ter publicado este texto na nossa Revista Educação, Sociedades e Culturas, bem como na Página da Educação quando era jornal com José Paula Serralheiro, e talvez, neste blogue. Mas, estamos em época de eleições, a todo minuto somos chamados a votar com antecipação. Os Presidentes dos paridos, especialmente o PSD, com o seu líder Pedro Passos Coelho, estão certos de obter maioria! Mas há dois grupos políticos que lutam pelo poder de forma desalmada. Durante o período de governo do Partido Socialista e seu Primeiro-ministro José Sócrates, Passos Coelho e o seu grupo minoritário do PSD, hostilizaram até obriga-lo a se demitir. Facto que nos leva a todos pensar que foi uma rasteira muito bem fabricada com intervenção do Presidente da República quem, na sua reeleição, no quis intervir. Mas o discurso de toma de posse para um segundo mandato, era clara a sua preferência: criticou ao Governo, esqueceu que era Presidente de todos nós portugueses, o que fez desmaiar o ânimo aguerrido do PS e do seu líder, José Manuel Sócrates. O poder executivo não deve nunca abandonar o poder, como fez Mário Guterres no seu tempo. Se um político bem formado e que sabe governar abandona o cargo, ficamos expostos a sermos vítimas de um governo de salvação nacional. No meu ver, o PM devia ter continuado o seu

compromisso até o dia que a lei permite. É evidente que estava cansado com as políticas lusitanas. Mas, se teve a coragem de se apresentar para o cargo de Primeiro-ministro, o seu dever era cumprir até o fim, apesar dos ataques não apenas do Pedro Passos Coelho, bem como de toda a Assembleia. No meu ver, esta Assembleia não apenas devia ser demitida, bem os lobos que aí têm um sítio, deviam ser expulsos e proibir-se a sua elação para ocupar o cargo mais uma vez. Porque esta a minha raiva e dor? Porque estamos a ser governados pelos que não sabem legislar e os discursos, que sempre oiço são de debate político e não sobre legislação para os trabalhadores. Não sabem por acaso os senhores deputados que estamos a viver uma crise económica internacional e que Sócrates não queria endividar ao país ainda mais, com empréstimos de fora? Era como viver em guerra ou em combates civis, como acontece nas novas Repúblicas: a nossa tem mais de cem anos e devia aprender, como no Chile de Allende, a viver com apenas una comida ao dia, o almoço, e mais tarde um lanche de pão com manteiga ou doce de frutas e um chá e um café. A entrada a União Europeia fez mal ao país, ao gastar todo o dinheiro que lhe correspondia como membro de então Comunidade Europeia, em compras, melhorar as vias de trânsito sem um cêntimo para investir em fábricas e indústrias transformadores dos bens produzidos no país.

Como fez Allende: resgatou a riqueza do Chile de mãos estrangeiras, reformou o agrarismo e entregou a terra a quem a trabalhava, entregou as fábricas aos trabalhadores, confiscou a excessiva riqueza em mãos de poucos, decretando altos impostos aos milionários do Chile. Factos que enfureceram a poucos. Acudiram à CIA e às Forças Armadas do Chile, para derrocar ao Presidente, facto que nunca tinha acontecido numa República de duzentos anos.

Eis porque reitero o meu texto, para os que esqueceram o socialismo, apesar de se declararem ser socialistas e materialistas. Porquê Sócrates fugiu? A resposta passa para outro texto. Neste, apenas queria dar uma lição de patriotismo, esse sacrifício pelo povo que Allende nunca abandonou, apesar de ser metralhado, com o povo a se esconder. Allende quis evitar matanças e sacrificou a sua vida pelo povo, tomando a sua espingarda que disparou contra a sua cabeça, para evitar mortes em guerra civil.

Que é assim por ser da América Latina, porque o Chile não está na Europa? Que grande ignorância dos meus compatriotas, que fogem mal podem. Os políticos portugueses são crianças

Vou directo a falar da Sua Excelência, o Presidente eleito do Chile por sufrágio universal, Salvador Allende

ESTE MEU TÍTULO NÃO É BRINCADEIRA. REFERE FACTOS QUE ACONTECERAM, FAZ JÁ, 30 ANOS E QUE NÃO CONSIGO ESQUECER E PERDOAR. FACTOS QUE MATARAM UMA AUTORIDADE ELEITA PELO POVO, PARA O POVO E DO POVO.

Não é brincadeira também, esse belo título com o qual Eduardo Sá abre o seu livro sobre a infância: A vida não se aprende nos livros, editado pelo jornal Público na sua colecção Xis, menos brincadeira é ainda, o capítulo de abertura: o importante é estar contigo, no qual destaca os educadores da classe operária, os bebés. Ou, quando Melanie Klein, no seu texto de 1945, reproduzido em 1994 como volume II das suas Obras, página 37 e seguintes, analisa o respeito e admiração que uma criança tem pelo seu pai, quando o vê qual capitão a comandar o seu barco que mais não é, que a sua mãe. Melanie Klein, como se sabe, defendia o facto de a criança ser perseguidora dos que lhe fazem mal, quer a si, quer às pessoas que ama: temperamento forte para si própria, mas vista como dura, punitiva, para o mundo, excepto se… perdoa. A criança sente capacidades omnipotentes, ao sentir que nada lhe é impossível, especialmente punir e castigar. Não é em vão, também, o texto Childhood and Society de Erick Erikson, refere que a criança tem autoconfiança, apesar da luta permanente que mantêm consigo, entre confiar e desconfiar, premiar e punir, sentimentos retirados pelos mais novos, das religiões que os seus adultos praticam. Erickson, na página 229 do referido livro de 63, explicita a mais-valia que a criança aprende quando se debate entre iniciativas pessoais e a culpa dessa dinâmica, que, segundo o autor, diminui no sentido inverso do crescimento, ao se encaixarem, corpo e ideias, dentro da mesma cronologia, ao se juntarem ideias e anos vividos, que formam o futuro adulto. Eis que a criança sabe a quem perdoa e de quem foge, em pessoa ou em pensamento, como Alice Miller analisa nos seus textos, especialmente sobre Hitler, cuja puberdade passou a ser de ódio ao social, levando-o a matar milhares. Tal qual fez esse nativo Picunche, no Chile, de nome Augusto, qual Imperador, César, Poder Centralizado, Omnipotente… conquistador e assassino dos seus amigos e inimigos, tal como a História e o Direito Internacional têm provado. Tal como Hitler esse austríaco abandonado pelo pai judeu e criado sem recursos pela mãe. O referido Picunche, foi aceite na base de uma mal entendida caridade dos Padres dos Sagrados Corações  a escola da oligarquia chilena  sítio no qual aprendeu a odiar os mais poderosos que tudo tinham. Como Hitler, o Picunche não podia perdoar aos seus colegas as posses das quais ele carecia. Donde, no poder, matou, mentiu, enganou, seduziu, tentou conquistar o impossível, a adesão à sua pessoa. Essa adesão que teve o Presidente Allende. Esse carisma singular do Presidente, e a sua ideia de justiça distributiva, a quem o Picunche jurou lealdade mas que acabou por matar e, como a ele, a seus seguidores. Tantos, que a História não tem dedos para contar. Milhares, que o Holocausto até parece ficar diminuído quando comparado aos feitos referenciados. Tantas famílias ficaram separadas, espalhadas por esse mundo; mulheres que não puderam enterrar os seus mortos, por falta de cadáver, filhos para quem os desaparecidos são os seus heróis,  péssima ideia no crescimento da criança. Essa criança cresce no ódio. Como muitos de nós. Como perdoar aos Senadores de há trinta anos, que planificaram a morte do Presidente Constitucional e de milhares? Que não sabiam, que não imaginavam? Então, seus pretensos sabidos, e a História, não conheciam? Que as mortes eram justificadas, porque seria apenas um mês de perseguições para se libertarem da aventura socialista. Que sabem eles do que é a justiça da igualdade, esse único direito que a Revolução Francesa consagrou e nunca foi capaz de cumprir, por viver à Hobsbawm, na Era do Capital. Direito nascido nos hoje EUA, na sua Constituição, usada para entrar no empobrecido Burundi, no mísero Afeganistão, para apagar as esperanças dos povos da América Latina, para escarafunchar, com dados muito bem organizados, no Iraque, ou proclamar a guerra ao terrorismo semeado por quem tem o poder económico e dos armamentos, da dita Lei Internacional, Tribunais de Direitos Humanos, que se funcionassem, teriam mais Milosevic do que há hoje. Porquê o prémio Nobel da Paz, ao organizador da chacina do Chile, esse Kissinger, cuja religião israelita manda matar, tal qual o seu povo faz com os Palestinianos? Como vou poder abraçar essa minha família, sentada na cadeira do fascismo? Como vamos poder voltar a um País ainda dividido pela imagem carismática, nítida, transparente, de um social-democrata que tencionou, como Babeuf em 1789, elevar o povo à dignidade da igualdade, luta que o levara à guilhotina em 1795, como Sua Excelência, foi levado às balas em 1973. Essas palavras que matam, quando, ainda hoje, neste aniversário, a maioria do Congresso não quer honrarem o Presidente Constitucional morto pela traição das Forças Armadas, ao colocar uma placa no lugar da sua morte? Quem me dera ser criança, para saber debater-me entre esta vida em território alheio e a minha natural inclinação de ser, outra vez, chileno? Quais os meus Direitos, quais as prerrogativas de todos nós, ao vivermos em permanente Êxodo? Quem me dera ser criança, para punir os arrebatadores de ilusões e de emotividades, os separadores de famílias, os que causaram esta nossa tristeza depressiva de não se ser entendido em sítio nenhum, quer pela pronúncia, quer pelas ideias. Porque, ao regressar de uma visita de trabalho de campo no Chile Picunche, na minha cabeça aparecia a ideia de um livro: Chileno exilado no Chile. Haja uma divindade que permita ao desleal Picunche e aos seus apoiantes, viver muitos anos, até sentir o peso da solidão e da vida em culturas que não são as suas! Haja uma divindade que me permita apedrejar com ideias, até convencer os fascistas, do mal feito à Nação. Como em Portugal, um cravo por cima do País, para que esta curta vida seja sã e serena. Senhores Pais, aqui ficam os factos teóricos e históricos para ensinar às crianças que o 11 de Setembro não é as Torres Gémeas, mas sim o dia da memória de um povo que foi arrasado e soube ter, como diz Boris Cyrulnik, essa inaudita capacidade de construção humana. Assim foi, o Picunche viveu até passar os 91 anos, en tribunal, como réu de crimes põe ele cometido.

É isto o que queremos para o nosso país, uma chuva de balas em palavras que derrocam ao poder legislativo e ao executivo na nossa recente formada República. É assim que comemoramos cem anos de liberdade? Com palavras ofensivas e gastas…

Raúl Iturra

Parede, Portugal, 31 de Março de 2011

Comments

  1. Uma vez que acredita que a queda do governo foi motivada pelo Pedro Passos Coelho e passo a citar “o seu grupo minoritário” está no bom caminho de se tornar de novo criança, pelo menos já acredita em histórias da Carochinha.

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