Gestação

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Le peuple des pauvres (JF Favre 2008)

Algo novo cresce, posso senti-lo – outro mundo, os filósofos dizem-nos grávidos dele. Apesar disso, em Portugal ainda não se acabaram os ecos sobre a brandura nacional, que a ser verdade percorreria as veias do sangue do povo português, fazendo dele a negação daquela “brava gente” afinal frouxa, que come pouco e cala muito, e se não está bem muda-se lá para fora, por onde de qualquer modo está habituada a andar. Abstêm-se? É porque não merecem mais do que o país que têm. Baixam a bola e entregam os pontos? É porque são cobardes, medrosos, habituados a ser subjugados e a uma vida de revolta – já nem saberiam viver doutra forma.  Não querem saber? É porque são burros que nem portas, unidades absortas da manada, gente nascida para ser dirigida, que ainda não largou o século XIX. E essa ideia, de raízes disseminadas, constantemente evocada por toda a gente ao mínimo revés ou mais pequena visão da fraqueza, é o retrato de uma auto-representação politicamente proveitosa, que faz das vítimas os culpados. Como se o subdesenvolvimento do País (e não estou a falar de infra-estruturas nem de tecnologia) não fosse o resultado da acção das elites dirigentes, que em vez de terem enfrentado as grandes missões políticas para que foram eleitas – e, à cabeça, a Educação e a Cultura, únicos motores de mobilidade social, caminhos certos para o desenvolvimento -, andaram a servir-se dos poderes para servir as suas clientelas particulares, comprometendo-se com todos menos com o povo. As reformas dos Estados na UE, no exacto momento em que os modelos liberalíssimos de “desenvolvimento” se deslocam para outras paragens do Mundo, redefinindo o que será a Europa, vão chamar os povos a agir, exigindo novas qualidades das lideranças políticas. Em Portugal também.

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  1. […] por Pedro Lopes Marques (que foi à manifestação, e acusa o Governo de experimentalismo) no Eixo do Mal de dia 2 de Março de 2013. No mesmo programa em que Clara Ferreira Alves evoca Yourcenar nas suas Memórias de Adriano para falar do Mundo que está a nascer. […]


  2. […] Ouvi o advogado Rui Machete esta tarde no Parlamento de Portugal a defender-se dos ataques da Oposição. Ouvi na TSF: a sua voz, a sua prosódia, as coisas próprias da retórica, as palavras (que escusavam de fazer dele um réu e daquela comissão de inquérito um tribunal, disse todo indignado), e depois o ataque: que aquilo era combate político, e apenas isso, destinado a fazer dele uma vítima. Sei quem é Rui Machete: representa uma geração de senhores, uma maneira de fazer, um modo de estar na vida pública, na política, e sobretudo no poder. Rui Machete representa tudo isso. Só que isso acabou. Algo novo cresce, posso senti-lo. E ouvi-lo nas palavras de Machete – como em muitos mais. […]


  3. […] vezes escrevi sobre nós, meu povo, atingido por essa política com inaudita agressividade e revoltante indiferença por parte dos […]