O risco do antes de tempo

Ter razão antes do tempo, além de não se traduzir em vantagem alguma, pode ainda ser um sério problema, especialmente se isso implicar decisões fora de tempo. Fala-se, por exemplo, que Steve Jobs teria planos para o iPhone na gaveta alguns anos antes do respectivo lançamento, tendo esperado que a tecnologia permitisse implementar a sua visão do produto. Um lançamento precoce do produto teria morto o conceito e deixado terceiros à cuca da ideia.  A história, verídica ou não, não surpreende, pois o próprio Jobs sentiu na pele a realidade do antes de tempo com o lançamento de um belo computador, o NeXT, mas fazendo-o muito antes do mercado estar para ele preparado.

Vem esta conversa a propósito da jovem Eesha Khar, que desenvolveu uma forma alternativa de armazenamento de energia, usando condensadores eléctricos com componentes por ela aperfeiçoados. O Público titula o assunto de uma forma criativa mas afastada da realidade, já que a jovem cientista não “descobriu como carregar telemóvel em 20 segundos“, tendo a  experiência dela consistido em construir um condensador eléctrico com melhores características e ligando-o a um LED como prova de conceito.

Seriam óptimas notícias se realmente já existisse uma bateria carregável em 20 segundos mas ainda disso estamos longe. Na verdade, as baterias continuam a ser o grande calcanhar de Aquiles da tecnologia relacionada com carros eléctricos. São pesadas, têm pouca capacidade para acumular energia, têm um curto tempo de vida, demoram demasiado tempo a carregar e são caras. Estes problemas são o maior entrave ao uso exclusivo da energia eléctrica na locomoção individual.

Outro problema do conceito “carro eléctrico” é a rede de distribuição de electricidade que suportasse o fornecimento instantâneo de energia que alimentasse a carga dos veículos eléctricos. A actual rede não está para isso dimensionada, sendo necessário olhar para o total de energia fóssil actualmente produzida e encontrar forma de a disponibilizar em electricidade, mesmo que num plano de transição progressivo.

Apesar destas tecnologias pouco maduras, tanto na distribuição como na acumulação de energia eléctrica, o Portugal de Sócrates resolveu apostar no conceito do carro eléctrico. A força da propaganda da modernidade falou mais alto do que a sensatez da prudência. O risco de se apostar antes do tempo numa tecnologia foi completamente ignorado e o resultado aí está: postos de abastecimento eléctrico ao abandono e dinheiro desperdiçado.

A imagem seguinte ilustra bem esta realidade. Já agora, não vale a pena ligar para o número de telefone da fotografia. Tal como o posto de abastecimento fechado a cadeado e tal como o próprio conceito, não funciona. Será falta de bateria?