
Central Park, Nova Iorque
Uma simbiose onde são combinadas em harmonia ciências naturais, sociais e artísticas, são diversos os ramos que definem esta complexa e completa área que é a Arquitetura Paisagista. Muito sustentada na componente vegetal, este é o principal traço que a distingue da Arquitetura que conhecemos. Não é possível falar nesta área sem saltar rapidamente à memória 3 grandes nomes: Frederick Law Olmsted (criador do Central Park, em Nova Iorque), Gonçalo Ribeiro Telles (pai da Arquitetura Paisagista em Portugal) e Francisco Caldeira Cabral (considerado o pai do ensino da Aquitetura Paisagista).
Segundo Caldeira Cabral, esta é uma ‘arte de ordenar o espaço exterior em relação ao homem‘ – os arquitetos paisagistas desenvolvem capacidades para planear e projetar paisagens ecológica, social e economicamente sustentáveis, com vista à promoção da qualidade de vida das comunidades humanas, da qualidade do meio ambiente e da biodiversidade.
A história desta área remonta há varios séculos atrás, e é transversal a várias culturas onde as caraterísticas das mesmas são passíveis de ser lidas nas suas conceções – a geografia e o clima tinham um papel fulcral no seu desenho. Desde os jardins-fechados persas, chamados de pairi-daeza (=paraíso) de formato bastante formal, serviam como mensagem política pela sua imponência e improbabilidade – a capacidade de conseguir criar jardins férteis verdejantes em pleno deserto serviam-se de um grande simbolismo da força do império. Constrastando com estes, temos no “polo oposto” (conceptualmente falando) os jardins gregos desenhados de forma orgânica em que toda a paisagem era inteligentemente projetada para usufruir do próprio relevo e vegetação existente do terreno, eram espaços normalmente dotados de um grande simbolismo religioso como é o exemplo do Oráculo de Delphos.
Passando para um exemplo atual, na Boavista está atualmente a ser travada a batalha entre a criação d’Um Jardim Na Boavista ou a construção de um novo El Corte Inglês. Várias são as virtudes que trazem a criação destes espaços exteriores: servem de ponto de encontro para interações sociais, influenciando positivamente a psicologia e humor dos utilizadores, preserva a herança histórica da estação ferroviária inaugurada em 1875, permitem a apreciação e valorização da natureza, criam uma organização espacial, melhoram a permeabilidade dos espaços e da qualidade do ar bem além de muitos outros serviços de ecossistema que providenciam. Naturalmente que estes serviços de ecossistema não são traduzidos a curto prazo em benefícios monetários.
No entanto considerando o contexto atual pandémico (cujo desfecho apesar de parecer esperançoso com a criação de vacinas em tempo recorde) a curto-médio prazo a criação de um espaço verde permitiria que houvesse um benefício indubitavelmente positivo na saúde mental dos residentes locais. Seria um local de deleite e lazer obviamente mais seguro do que um espaço fechado, abrindo portas à criatividade dos utilizadores. Poderia servir, quiçá, para a criação de feiras de romarias ao ar livre quando o contexto pandémico assim o permitisse, sendo que seria sem dúvida mais seguro de frequentar em comparação com um centro comercial fechado. Desta forma, dependendo do desenho do espaço, libertaria também a concentração das barracas e carrocéis que são erguidos na própria rotunda da Boavista. Abriria portas e a oportunidade de criação de corredores verdes, tão necessários para biodiversidade de flora e fauna. Numa era em que nos queixamos que as gerações mais novas já crescem “apendiçadas” a tecnologias, a restrição das mesmas de espaços verdes que permitem a criação de defesas do próprio organismo, incentivam ao exercício físico bem como à criatividade do uso do seu espaço, permitiriam trazer de volta jogos mais tradicionais e “analógicos”, somando ainda a que a própria apreciação da natureza nos premitirá aumentar a sensibilidade aos impactos que causamos.
Com a crise atual que já se faz sentir e que se avizinha, fica a questão ética/moral da preferência entre a criação de um espaço que pode trazer a oportunidade de novos empregos mas que incentiva à despesa, sabendo da existência de espaços comerciais vizinhos. Sabe-se também que a construção terá um impacto ambiental que não será colmatado de igual forma.
A hipótese que se coloca é se são preferíveis os benefícios a longo prazo dos serviços de ecossistemas aliados à grande amplitude de criatividade de eventos e atividades que se podem desenvolver no mesmo, permitindo que haja também criação de receita de alguma forma – com a criação de feiras e romarias locais, por exemplo. O céu, passaria a ser o limite.
Aninhas !!
Quem manda na paisagem, são os construtores civis.
Se não sabias , ficas a saber…
Os interesses económicos e imobiliários ditarão o desfecho, que todos sabemos qual será.
A crença na descrença é uma das mais fortes âncoras do Homem, que o incapacita para o progresso e seu desenvolvimento. Por outro lado, tem-se o velho provérbio que professa que “querer é poder”.
Eis que se tem mais um exemplo em que os extremos se tocam, uma vez que ambos se prendem com esperanças, expectativas que estão dependentes de uma atitude e comportamento subjacentes. São também chamadas de profecias autorrealizáveis.
Se queres mudar o mundo, começa por acreditar que és capaz de o fazer. Participa, envolve-te, escreve, contagia. Não chegarás a todos, mas chegarás àqueles que se permitam, iniciando a bola de neve da mudança.
Quanto à questão levantada [espaço comercial ou espaço verde], por mais prós e contras que existam, é certo que a conflitualidade entre objetivos não deixará de acontecer, pelo que não me parece viável o melhor dos dois mundos, apenas uma priorização face a todas as restantes condicionantes não descritas aqui.
Em suma, uma conclusão sobre o que escolher, carece de uma análise mais pormenorizada, de uma medição de qual dos payoffs [resultados] é superior: o benefício ou o custo de oportunidade. Este, sim, deverá ditar qual a escolha mais acertada.