No Observador, jornal digital com uma coluna de opinião que dá guarida a alguma da direita mais radical deste país, por vezes a roçar ou mesmo a atravessar a fronteira do extremismo, tivemos ontem um momento extraordinário, e bastante abrilesco, até: um cronista, de seu nome Alexandre Mota, teclou um dos mais belos elogios ao Estado Novo e à PIDE:
E isto, meus caros, foi escrito por alguém que se proclama liberal. Um liberal que, note-se, considera a Autoridade Tributária “bem pior do que a PIDE, quer pelos poderes alargados que tem, quer pelo uso despótico que deles faz”. A PIDE, que prendeu arbitrariamente, que espancou, torturou e matou, é, no entender de Alexandre Mota, melhor que a entidade estatal que se encarrega das questões tributárias, que prendeu, espancou, torturou e matou zero pessoas. O “uso despótico” que a AT faz dos seus poderes consiste em cobrar impostos. No caso da PIDE consistia em prender primeiro, perguntar depois, partir uns ossos e disparar o ocasional tiro na nuca. Nada que se compare à brutalidade dos métodos dos inspectores tributários dos nossos dias. Um autêntico flagelo.
Devo dizer que, quando li esta passagem, no Twitter, fiquei literalmente sem saber o que pensar ou dizer. Não consigo encontrar explicação para algo assim. Ou consigo, que é estar perante alguém que entende que a tortura, o espancamento e o assassinato são mais aceitáveis que a existência de uma entidade tributária como aquela que existe em Portugal. Mas isto não é ser liberal. E estou convencido de que a maior parte dos liberais não se revêm numa posição destas. Para além de que é possível fazer a crítica feroz da fiscalidade portuguesa sem a ter que a colocar num patamar comparável com a violência empregue por uma polícia política de um regime ditatorial.
Ao contrário daquilo que me acontece com o Chega, ou com o PSD de Rui Rio, nada me move contra a Iniciativa Liberal. Tenho várias divergências com as linhas programáticas do partido, mas estou alinhado com a larga maioria das propostas que dizem respeito a liberdades civis, organização social, direitos humanos e até com a necessidade de tornar o Estado menos pesado. Não obstante, e como já referi no meu texto anterior, a propósito da alegada liberal que aplaude Salazar nas redes sociais, parece existir, no meio desta onda liberal que se gerou, um pequeno sector de reaccionários, que veem o liberalismo com algo que se circunscreve à desregulação da economia, e que, para lá disso, não passam de conservadores da ala dura. Ou, nos casos mais graves, aspirantes a governantes “iliberais” de Grupo de Visegrado, algo que, em bom rigor, não os distingue muito das elites capitalistas que andavam com Salazar e o Estado Novo no bolso, açambarcando os grandes negócios e obras do Estado, depois de um jantar bem regado com oficiais do regime, numa mansão de portugueses de bem, na zona “nobre” de Cascais.
Sim, as palavras ainda importam. E a normalização da barbárie deve ser combatida por todos os que se revêm na democracia, sejam socialistas, conservadores ou liberais. Cobrar impostos, independentemente das legítimas críticas que possam ser feitas aos métodos da Autoridade Tributária, não é, em democracia alguma, mais despótico do que prender arbitrariamente, espancar, torturar ou matar. Excepto para aqueles que defendem a existência de um regime autocrático.
A PIDE, essa grande âncora do pensamento esquerdalho, é figura de retórica de que reclamam uso exclusivo e intransmissível.
Já as «elites capitalistas que andavam com Salazar e o Estado Novo no bolso» são de uso restrito aos mais cabotinos, que nem sabem ter o Champalimaud gerido o BPSM a partir do México nem sabem coisa alguma do negócio BPA.
Saberão, mas não querem comparar, sobre o BPN, BPP, BES, Montepio, uma caixa nos Açores e outras pequenas coisas!
Ó contabilista, alguma vez uivaste contra a desregulação dessa gentalha a mando de Bruxelas, ou, pelo contrário, sempre quiseste que o estado se calasse?
O Sr Mota não relativiza o estado novo, também relativiza quem espanca, tortura e mata hoje; o que só torna evidente que as únicas liberdades com que se preocupam são as suas e as da sua carteira.
Nem que seja preciso inventar disparates, como a teoria das empresas dependerem mais do estado do que no regime que se define por só existirem por beneplácito do querido líder.
Essa do ‘querido líder’ é para o lado onde te babas.
Como todos os outros esquerdalhos ignorantes e sem cultura, do Estado de Direito tens a noção que te vendem os seus crónicos abusadores.
Sou abusado por historiadores mal pagos e não sabia, a documentar que o enforcado italiano e os seus seguidores ora privatizavam, ora nacionalizavam de acordo com os percepcionados interesses da luta eterna, tal era a qualidade da teorização económica que sustentava a mesma.
Não que o flip-flop fosse exclusivo, apenas acentuado, precisamente porque nunca falhavam, só eram falhados; ao menos hoje pode dizer que o rei vai nú, e correr o risco de imitar os relógios sem pilhas e acertar de vez em quando.
Pois ficamos todos a saber…
Que para o lado onde V. Exa. se baba (isto da baba é para todos, ou não?) os líderes não eram assim tão queridos.
Aliás, consta que V. Exa. até reservava esse tratamento para um núcleo muito restrito, segundo contou nas suas memórias um fuzileiro que privou amiudada e intimamente com V. Exa. lá nas áfricas e que foi o autor da famosa quadra:
Na tua presença, ó Menos,
Sinto os olhos marejar.
Pois és p’ra mim mais querido,
Que o saudoso Salazar.
Realmente comovente! Já não se faz poesia desta! Pelo Menos não tenho visto.