(Texto de Carlos Loures e Josep Anton Vidal)
Depois de termos ouvido a versão oficial do hino nacional catalão, ouçamos agora a versão histórica, cantada por Rafael Subirachs no festival «As seis horas de Canet», em 1975. Foi três meses antes da morte de Franco, a ditadura estava moribunda, mas vigorava ainda. A ânsia de liberdade florescia por toda a parte. Subirachs cantou «Els segadors» enganando a censura. No final da sua interpretação a frase «Segueu arran!» ( «segai rente» ou «cortai pela raiz»), entre os gritos da multidão pedindo a liberdade. Este vídeo conserva toda a força e emoção desse momento histórico.
Tenho um idêntico ponto de vista quanto à leitura “internacional” desta história catalã. No entanto, não podemos reduzir a Restauração de 1640 a um mero episódio decorrente da questão catalã, até porque o maior esforço de guerra foi feito após o fim da revolta catalã ter terminado. Era a velha questão dos foros que Madrid não quis cumprir. A Catalunha estava em clara desvantagem. Cercada por duas grandes potências – Castela e a França -, separada do seu inicial reino aragonês – do qual era parte -, sem um império ultramarino e sem poder almejar ao reatamento de alianças tradicionais, estava longe, muito longe do potencial que Portugal significava. A presença ultramarina e o interesse das potências aliou-se à determinação nos campos de batalha. Não podemos é continuar a fazer o jogo dos curiosos da história que das universidades Complutenses ou não, se servem agora da Catalunha como uma boa desculpa para a derrota. Tudo se fica no limiar da fantasia, desde a alegada “opressão” do novo regime saído do 1º de Dezembro, até à absurda interpretação da sucessão dinástica em 1580. A Duquesa de Bragança era a sucessora legal. Filipe II limitou-se a usar o ouro e a força. Não estamos muito longe da repetição de acontecimentos, queiramos ou não reconhecê-lo.
A questão da restauração da independência não pode, de facto, ser reduzida à «ajuda» catalã. Aliás, na primeira parte do texto, esclarece-se que essa proverbial afirmação catalã de que «Portugal» deve a independência aos «segadors», constitui um exagero e uma inverdade histórica. O que igualmente se diz (eu e o Vidal) é que também não foram os conjurados que «nos deram livre a nação», como diz a letra salazarista do hino da Restauração. O povo que, durante 28 anos, aguentou uma guerra contra a maior potência mundial da época, é que me parece merecer a maior fatia do crédito. Embora a guerra na Catalunha e a adesão da nobreza portuguesa tenham tido o seu papel. Quanto ao facto de ser a duquesa de Bragança a legítima sucessora do trono, a lei sálica não a impedia de reinar? Acho que o José Mattoso reconhece a legitimidade de Filipe II. E o Veríssimo Serrão também. Em suma, com este texto, apenas quyisemos mostrar uma face menos conhecida da Restauração – a sua inserção na cena política internacional.
Carlos, as elites dão o mote e a espada e o povo cumpre a “vontade colectiva”. Foi o que se viu em 1383-85 e em 1640-68. Sempre assim foi e sempre assim será. Uma vez mais, estamos de acordo.Quanto à sucessão de 1580, não posso crer que o Mattoso e o Veríssimo aleguem com a Lei Sálica, simplesmente porque tal como na Inglaterra e até em Castela, em Portugal esta jamais existiu. Se D. Beatriz foi de facto a legítima herdeira ao trono em 1383, não conseguiu reinar devido exactamente ao seu casamento castelhano. De outra forma, teria sido Beatriz I, disso não existe qualquer dúvida. Mais tarde, houve mulheres que foram juradas sucessoras, como por exemplo, a infanta Luísa Josefa, durante muito tempo filha única de D. Pedro II. No século XVIII tivemos D. Maria I e meio século mais tarde, D. Maria II. Em Portugal, nunca existiram pruridos desse tipo gaulês. nunca. É por isso que hoje em dia toda esta discussão em torno de quotas é simplesmente… inconstitucional, naquilo que o sentido mais lato oferece à expressão. As Ordenações – autênticos textos constitucionais -, eram claras quanto ao acesso à sucessão e valem como lei consuetudinária. As mulheres são de jure e de facto, nossas iguais.Mesmo em Castela, a Lei Sálica vigorou por pouco tempo, quando os Bourbons a importaram de França, no século XVIII. Isabel a Católica foi rainha, assim como Joana, a Louca. Sem problemas. Já no século XIX, os espanhóis tiveram Isabel II, de quem descende o bem conhecido Joan Carl I da Catalunha e arredores até Vigo…A descendência de D. Manuel era nítida. Se Filipe II descendia da filha mais velha do rei – Isabel de Avis ou de Portugal, como queira -, a duquesa de Bragança era filha do infante D. Duarte, irmão da mãe de Filipe II. Ora, estas coisas modernas à sueca, da prevalência etária – muito justas, aliás -, ainda não vigoravam no século XVI. Filipe II só acederia à coroa, após o desaparecimento de todos os filhos de D. Manuel (o Cardeal foi o derradeiro sobrevivente) e após a descendência legítima (e aqui ficava de fora o prior do Crato) dos filhos masculinos de D. Manuel I. A duquesa Catarina era então, a primeira na linha. Faltava-lhe o ouro e sobretudo, a tropa. A população, essa, seria a primeira entusiasta. São sempre os mesmos a colocar as bandeiras à janela. De facto, se bem se lembra do que aconteceu em 2004, será interessante verificar que um passeio por Lisboa era bem elucidativo acerca do ambiente de fervor que por cá grassou. Zonas centrais, como as Avenidas Novas e a zona da Av. Roma e adjacentes, Telheiras ou Lapa, ostentavam algumas bandeiras, talvez uma, duas ou três por prédio. se o Carlos desse um giro ao bairro Alto, Madragoa, Alfama, Graça, Moscavide e os chamados “bairros sociais”, era um inacreditável festival. No mesmo andar, 3, 4 e até mais bandeiras a esvoaçar. Prédios cobertos delas, do r/c ao último andar. Incrível. Imagine o que aconteceria se esta gente que em nós manda, se resolvesse a uma habilidade iberista. Havia de ser o bom e o bonito. Algumas bandeiras, debotadas e esfarrapadas ainda por lá estão à varanda, à espera de novas esperanças.
O Nuno esmagou-me com argumentos. Porém, nunca vi contestada a legitimidade de Filipe II ao trono de Portugal. A batalha de Alcântara terá sido um esforço, não para impor a legitimidade de D. António (filho do infante D. Luís e de uma plebeia), mas para proteger o país de um rei estrangeiro, mesmo que legítimo. Mas acredito que seja como diz. Quanto ao iberismo, perfilho-o apenas na medida em que me parecia justo (e inteligente da nossa parte) ajudar os ctalães, os galegos e os bascos a proclamar a independência). Justo porqu são nações, com língua, história e cultura próprias; inteligente, porque este gigante aqui ao lado é demasiado forte para nós – era melhor lidarmos com três ou quatro países mais dentro da nossa escala. Federar-nos com Espanha? Nem pensar. Até porque não seria uma federação – seríamos engolidos,pura e simplesmente.
E vamos ser, Carlos. Só quem não prestou atenção ao que se passou “en la Cumbre” é que não vê o que se está a passar, A Espanha é que manda. No entanto, embora compreenda muito bem o que quer dizer quanto aos direitos de auto-determinação, creio que o melhor caminho é o da prudência portuguesa. Com os de Madrid, já estamos habituados e ainda na semana passada o governo e muito bem, lhes disse não! quanto à apresentação conjunta de Portugal e Espanha nos órgãos comunitários. Era só o que mais faltava…Por acaso, foi uma pena o infante D. Luís ter morrido tão cedo. era de longe, o melhor dos filhos de D. Manuel. culto, humanista, bom militar e dado às “aborrecidas coisas” das letras. Enfim, a história é o que é. Quanto à sucessão, era nítida:1 – Os filhos de D. João III. Morreram todos antes do pai. Os netos, ou sejam, D. Sebastião e D. Carlos, filho de Filipe II e da infanta Maria Manuela. Este D. Carlos só acederia à coroa, se não existissem sucessores legítimos directos de um dos filhos varões de D. Manuel.2- O infante D. Luís, pai do prior do Crato. Era este o da preferência popular, em reminiscência clara do Mestre de Aviz.3- D. Duarte, pai de Catarina, duquesa de Bragança. Em 1580 era sem margem para dúvidas, a sucessora legal, por via masculina e legítima.4- Isabel de Portugal, mãe de Filipe II. Este tinha o ouro, os canhões, os barcos e o interesse pela prata espanhola, essencial ao comércio dos nossos homens de negócios, sempre à espera da possibilidade de alargar as vistas sobre o império espanhol. É sempre a mesma coisa, há sempre uns balsemões por aí.
Nem mais. E esses, os balsemões, os amorins, os belmiros, os salgados, toda essa gente que manda verdadeiramente, não é sujeita a sufrágio universal. O Ricardo Salgado teve a lata de dizer numa entrevista que apoiava a «união ibérica» porque, desse modo o BES, poderia operar à vontade nas regiões de Madrid e de Barcelona. A independência nacional, nada representa para os crápulas. Obrigado pela lição de história. Já lsoube tudo o que a linha sucessória dizia respeito, mas já não me lembrava.
Não suporto a lógica do chamado “mundo dos negócios”. Cheira-me logo a esturro.
Mas é essa a lógica que impera. Por isso, acho perda de tempo a obsessão de derrubar o governo. Não que não mereça ser derrubado, mas porque só poderá ser substituído por outro igualmente obediente à «voz do dono». Um abraço, Nuno.
Exacto. É por isso mesmo que não perco demasiado tempo com as tricas à volta das autoridades. Existe sempre mais uma na calha, como pneu suplente, não é? Há coisas maiores que vale a pena pesquisar, porque são as que ficam.