Metade da sociedade está podre

O nosso cérebro é composto por cem biliões de células cerebrais que estão interligadas, cada uma a milhares de outras células. Temos, portanto, biliões de ligações dentro da nossa cabeça, uma coisa parecida com os biliões de ligações estelares dentro de mil galáxias.
O cérebro realiza milhões de biliões de cálculos por segundo, o que significa uma velocidade milhões de vezes maior do que a de um computador.

Mas não é propriamente esta a mensagem numérica que quero deixar. Gostaria que ficasse retida a sua essência, isto é, o reconhecimento da poderosíssima riqueza da estrutura mental da nossa razão.

Mesmo assim sendo, metade da razão e da mente da nossa sociedade está podre e enferrujada. Como se fora uma maçã, meia sã e meia podre. Simplesmente, a parte sã da maçã nunca consegue regenerar a parte podre, mas esta continua a invadir a parte sã até que toda a maçã esteja podre. Se a parte podre e a parte sã da sociedade estivessem separadas, a única solução seria cortar, extirpar a metade podre e deitá-la ao lixo. A forma de o fazer é que é difícil de imaginar.

Mas o são e o podre da sociedade não estão separados em duas metades distintas, como na maçã. O podre está infiltrado no meio do são e o são infiltrado no meio do podre. Imaginar a vitória da parte sã nestas circunstâncias é muito mais difícil ainda.

A ciclópica tarefa desta barrela só pode ser levada a cabo no seio da sociedade, se todos nos empenharmos, diariamente e racionalmente dentro da nossa profissão e das nossas obrigações, na limpeza de toda as zonas podres da nossa mentalidade social. Denunciando, apelando ao pensamento e à razão.

Para tal, é indispensável que conheçamos o mais profundamente possível os factores necróticos desta degenerescência e os promotores e catalisadores da podridão. Trabalho quase utópico, numa sociedade mentalmente anquilosada e atrofiada. Uma sociedade à qual os poderes instituídos fecharam a razão a sete chaves, a razão mãe do pensamento, o pensamento como a mais poderosa arma de que o homem dispõe contra a exploração do homem pelo homem, contra a escravidão, a corrupção, a perversão dos mais nobres princípios, contra a fraude e a mega-fraude de grandes corruptos e governos, contra a especulação selvagem, a falta de respeito por nós próprios e o desrespeito pelos outros, a falta de civismo, a injustiça, o egoísmo, a mentira, sobretudo a mentira ao mais alto nível, a calúnia, o obscurantismo seja ele qual for, sobretudo o obscurantismo religioso, o mais nefasto de todos, a hipocrisia e a falsidade, sobretudo a hipocrisia dos criminosos que pregam a santidade, os fanatismos de qualquer espécie, o pensamento agrilhoado, a prisão da liberdade, a estupidez propositadamente institucionalizada, a profunda incultura e a falsa cultura, mãe de todos os males, o abandono da ética e da moral.

Como diz Daniel Barenboim, ler a “Ética” de Espinosa é o melhor exercício intelectual que se pode fazer, porque Espinosa ensina da forma mais completa a liberdade radical do pensamento. Sem esta liberdade radical do pensamento, sem o respeito profundo pelo pensamento e pela sua verdade, a mais nobre e sublime criação da nossa rede estelar de neurónios, o homem torna-se inexoravelmente vulnerável à podridão, o seu papel no mundo é catastrófico, e a sua contribuição para a saúde da sociedade e da humanidade é profundamente negativa.

Comments

  1. Luis Moreira says:

    isso é verdade, meia maçã está podre mas não quer regenerar-se, dorme bem nessa condição, não há nada a fazer a não ser esperar que caia de… podre.

  2. maria monteiro says:

    o problema está em não nos deixarmos contaminar por esse podre… muitas vezes fica-se cansado , apetece virar as costas, partir, desistir … mas um qualquer dia seguinte acorda-se para a vida, para a luta num combate cerrado ao podre

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