Acho que escrevi esse poema no ano 2.000, à raiz de uma denúncia, publicada na Revista Veja (São Paulo /Brasil) sobre três jovens turistas brasileiros (de Pernambuco), que chegaram a Lisboa para visitar Portugal. Foram barrados no aeroporto, detidos, interrogados e devolvidos ao Brasil, sem justificativas, a não ser a tentativa de entrar ilegalmente no País, o que era falso. A reportagem da VEJA dizia: COMEÇOU DE NOVO: …funcionários portugueses maltratam brasileiros no aeroporto de Lisboa e os mandam de volta…
a partir desse fato, foi feito o poema Ficha Limpa
Ficha Limpa – Carta resposta a Pero Vaz de Caminha
de José Carlos A. Brito (poeta e dramaturgo, SP Brasil)
1
Há dois caminhos
Para entrar em Lisboa
O da intolerância, da estultice
– Que a Fernando Pessoa
Provocaria uma poética vertigem –
E nega ao ser humano
Direito de conhecer
E amar a sua origem
Há outro caminho
Onde se encontra o amor
Que ama a inteligência
A negra flor
De uma síntese rara
Da raça enriquecida
Pela ideia clara
Da única paz
Futura e possível
Que ainda jaz
Na Europa sepultada.
2
No primeiro caminho
Do atraso, da reação à vida,
Há um Salazar que ainda respira
E contamina o sangue de Lisboa.
Mas no outro caminho
Há um Saramago
De sete-vidas e coração
Que faz viver o povo
E dá razão
À negritude cultural
Que lavará um dia
Portugal.
Há ainda nesse caminho
Um Otelo Saraiva
Que incendiou a alma
Do lusíada universal
E as juras
De um exército convertido
Em protetor
Do vermelho cravo
Nascido
Como flor
De frágil esperança
Há um Zeca Afonso
Da Grandola Amada;
De seu ódio à opressão
À discriminação da raça
Criou uma canção
Que à alma lusitana
Libertou do mal
Sua infeliz prisão
Medieval.
3
Quem eram os agentes?
Talvez da ex-PIDE.
Cada País possui
Seus ex-torturadores
Seu lado equivocado
Quem pode saber
Se eram humanas versões
Das bombas que aos azares
Mataram crianças em Belgrado?
Ou massacraram Kosovares.
Ou novos agentes
Que a bel prazer
São a segurança europeia
Enriquecida
Dos frutos de nossa terra
Descoberta
Ou agem contra a ONU
A serviço
De uma OTAN secreta?
4
E que desejavam saber
Ao interrogar os turistas?
Pois saibam todos:
Giovane, Túlio
Luis Antonio, Laudemir,
Que por um ato
De intolerância “à toa”
Foram barrados
No aeroporto de Lisboa,
Encarnam uma nova esperança
De cultura e raça:
Mestiço, Cafuso, Mameluco
Traziam a marca alvissareira
Talvez sub-liminar
Da Revolução Praieira(*)
Universal e libertária
De Pernambuco
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