A capacidade argumentativa da extrema-direita é fantástica

Mandei uma boca a esta vociferação anti-professores ao nível dos mais fiéis discípulos de Maria de Lurdes Rodrigues sobre os zecos (a caixa de comentário é de um revivalismo da máquina de propaganda socrática que até se confunde com o original).

Na troca de galhardetes sugeri a leitura do livro Quem Paga o Estado Social em Portugal? e levo agora com isto. Ora bem, a ver a coisa com calma.

Eu li o livro, coordenado pela Raquel Varela, que conheço tal como conheço a maioria dos seus autores.Terá as suas falhas mas no essencial convence-me, a mim, professorezeco de História.

Acho imensa graça a um país onde se torturam os números, e  neste caso quem desmistifica a mera propaganda ideológica até consegue ter alguma cobertura mediática, mas o máximo que as sumidades liberais inventam para contrapor é um texto cujo título Raquel Varela Business School diz tudo (confundir ciência económica com cursos patronais foi uma gaffe quase soarista), e que não responde ao livro, mas a um texto no 5 Dias, onde haverá uma incorreção de somenos, incomparavelmente menor do que a piadola tola que lhe responde.

Em Portugal até um físico e  uma historiadora fazem contas que contrariam a ideologia dos torturadores da estatística, mas o pessoal das escolas  de formação de patrões, estudiosos da economia clássica e afins, respondem atirando ao lado. Não seria mais fácil ler e desmontar essa farsa? ser, era, mas não seria bem a mesma coisa porque, não será por falta dos 15 euros, se calhar, helas, o livro no essencial tem razão.

Já agora, quanto à expressão do Ricardo Campelo Magalhães “um tal João José Cardoso me chamou de ignorante“, a malta lá por andar em mundos diferentes está cá para ajudar. O tal é o mesmo gajo que descobriu o paradoxo Ricardo Campelo de Magalhães, depois de ter sido brindado com um Bem, se é um professor de história do secundário, não posso pedir que conheça contributos como os de Solow, Kondratiev ou Mises, não é? Presunção e água benta cada um toma a que quer, há mesmo quem tome das duas ao mesmo tempo, ensinou-me a minha avó que não passou da 3ª classe.

Um paradoxo que desvenda um primor da ignorância nacional e falência do seu sistema de ensino (descubro agora que entrou na faculdade com média de 18, só espero que não a tenha obtido numa escola pública, mas tudo é possível), e que se fosse meu aluno no 12º ano podia não ter chumbado, mas cheira-me a que andaria perto disso.

Adenda técnica: as tags dos artigos que publicamos nas colunas laterais não funcionam, um problema entre template, css, e descobrir solução para isso. As nossas desculpas, bem gostávamos de resolver tal chatice.

Comments


  1. Claro que foi numa escola pública. Em Ponte de Lima não havia grandes alternativas, não é senhor professor…

  2. Maria João says:

  3. Uma inconfidência de que me esqueci aí em cima: se alguém demonstrar que o livro é uma fraude ganha uma indulgência perpétua de uns certos sectores da extrema-esquerda lusa que eu cá sei.
    Em tempos de crise vale sempre a pena.

  4. André Freitas says:

    João José Cardoso,

    Essa tontice de não pagar os juros da dívida é uma tontice. Ora pense lá um bocadinho.

    Para não se pagar os juros da dívida é preciso não ter dívida.

    Para não se pagar a dívida é preciso não se endividar.

    Para não se endividar não se pode gastar mais do que aquilo que se tem.

    Para não se gastar mais do que aquilo que se tem é preciso não ter contas públicas deficitárias.

    Para não se ter contas públicas deficitárias é preciso cortar na despesa.

    E como é que se corta na despesa? É a aumentar despesas com privilégios dos grupos corporativos do PCP, como é defendido pela fenprof e companhia? Ora, pense lá um pouco.


    • Ora pense noutra coisa: e paga os juros com o dinheiro de quem? E quando? Vai vender as Berlengas ou a Madeira?

    • nightwishpt says:

      Não há dinheiro para pagar a dívida, pelo menos em menos de meio século com toda a gente a viver mais ou menos como na Roménia.
      E quando é que os grupos privilegiados que ganham cada vez mais subsídios e benesses do estado começam a pagar alguma coisa, ou começam a trabalhar como precários?

  5. Raquel Varela says:

    Na altura tirei uns minutos para responder a estes tipos mas não vale a pena, são ar que se desfaz, vale a pena sim pensar no que diz o Medina Carreira, António Barreto, a hierarquia da Igreja, isso sim, são propostas erradas, mas bem articuladas. Cumprimentos

    http://5dias.net/2013/01/06/pagar-ou-suspender-a-divida-publica-portuguesa-uma-polemica-com-os-business-school/

    • Carlos says:

      pois, infelizmente acho que aqui a Raquel tem toda a razão…

  6. Raquel Varela says:

    João José, só uma precisão, o Renato é físico teórico, o que no caso dele significa análise matemática de dados – é nisso que se doutorou. São estes tipos que os bancos agora querem recrutar para o sector financeiro porque neste momento são eles quem mais trabalha com análise complexa de dados.
    Felizmente o Renato não trabalha para a banca:)
    Um abraço


    • Eu sei. Acho que tambem sei umas coisas da capacidade do Renato olhar para desafios matematicos e resolve-los… tive oportunidade de o constatar.


  7. Eu, apesar de ser liberal, tive um professor de história de esquerda e nem por isso deixei de ter boa nota. O mais certo, se tivesse o sr. como meu professor, seria mudar de agrupamento, já que o estado não me permitia mudar de escola.

  8. Raquel Varela says:

    Finalmente não há um erro de somenos, a rentabilidade dos juros da dívida, tal como anunciado não por mim mas pelo Jornal de Negócios, como expliquei no texto acima é exactamente essa – 50%, isto é resgatamos títulos por mais 50% do que valem.


  9. Amigos, é literalmente IMPOSSIVEL pagar esta dívida. Dentro da zona euro é claro. Do the math.

  10. Pedro Martins says:

    Esta coisa do não resgate dos títulos é tão parva…tão parva! Mas está em linha com o conhecimento económico e com o jeitinho para números que eu observo na esmagadora maioria da “gente das letras”!


    • Por acaso o problema e’ de letras e no de numeros. E’ que economia politica faz-se entendendo o mundo, e nao propriamente colocando-o em meros algoritmos. Reduzir a humanidade a numeros so’ lembra a quem nao percebe absolutamente nada de Historia. Quer uma lista de dividas que nunca foram pagas, so’ nos ultimos 100 anos?


  11. Com muitos filósofos e “rocket cientists” a reclamar competência analítica perde-se mais tempo em polémica inútil do que a equilibrar o barco. Sugestão: deixem o Zé Maria da mercearia fazer contas. Ele (mesmo sem Excel nem doutoramento) sabe muito bem que se não pagar o que deve está entalado, e se deixar esticar a corda do fiado também. A situação é mais simples do que parece: “no money, no funny”…


    • Os países ao nível das mercearias, as pessoas embaladas nas prateleiras, se passar o prazo deitam-se fora. Eis a auto-metáfora perfeita da ideologia liberal.


      • Até que concordo. Mas o problema com a “dívida” é outro, e tem simplesmente a ver com pagar o que se pediu emprestado… Nesta matéria a “polémica” acentua mais questões de carácter e honradez do que ideologias… Alguém acredita que “não pagar” é opção? Alguém acredita que um Estado gastador e insustentável cria futuro?
        Infelizmente a “esquerda” institucional tem-se mostrado incapaz de assumir um papel responsável e honesto para atacar o problema de frente, optando por “lirismo” e retórica inconsequente e irresponsável. E, naturalmente, impraticável! As aspas na esquerda querem dizer que ela, enquanto baluarte da luta pelos mais fracos, pura e simplesmente desapareceu. Essa orientação e matriz humanista e revolucionária há muito que foi tomada de assalto pelas corporações de funcionários públicos e “similares”.
        Ao invés, vemos uma esquerda-burguesa, acomodada e egoísta, que capricha no folclore e na defesa dos “direitos adquiridos” (e da cadeira fofa da repartição), mas que se borrifa para o pobre, o velho, o precário, o assalariado do ordenado mínimo, a criança com fome, e também, a projecção lúcida da economia. O paradoxo da situação é que ainda iremos ver a “malévola” direita liberal a ocupar-se com estas matérias… Aliás, o “parvalhão” do relatório do FMI critica mais as desigualdades da sociedade portuguesa do que o Bloco de Esquerda, por exemplo…
        A Esquerda (sem aspas) faz falta, mas tem de largar as pantufas, os clichés, a irracionalidade, a soberba, os preconceitos, e saltar da cadeirinha do conforto burguês.


      • Os estados têm de ser honrados? ora bem, e os credores? nunca ouviu falar de dívidas ilegítimas? pois o conceito foi criado pelos EUA, que não pagaram e andam por aí.
        Ou ainda não percebeu que esta dívida nasce exclusivamente de um ataque especulativo aos mais fracos do euro, cuja primeira defesa aliás é estarem numa moeda que é gerida em função dos interesses dos outros, caloteiros como a Alemanha por exemplo?
        Que diabo, até o Obama já começou a processar as agências responsáveis pela brincadeira.


        • Ó João, acredita mesmo que “dívida nasce exclusivamente de um ataque especulativo aos mais fracos do euro”? E os nossos gastos “à fartazana” anos a fio? Como sabe, antes do “ataque”, o nosso crescimento era já uma merda e o défice ia acumulando sorrateiro… O seu “exclusivamente” é um bocado forte… — Pusemos-nos a jeito!… O Passos abriu a boca no pior momento, e o “capitalista” aproveitou a fresta (para não usar outra expressão mais à Viegas…). Um País que grama um Sócrates e elege um Passos não sei até se não merece o que se está a passar…

  12. atento says:

    “convence-me, a mim, professorezeco de História.” bem se o senhor o diz !


    • … é mesmo fantástica. Quanto ao analfabetismo não comento, realmente o ensino da língua portuugesa ainda tem muito que progredir.

      • atento says:

        sim o ensino da língua portuugesa ainda tem muito que progredir , ah quanto ao analfabetismo não comento .

  13. Pedro Martins says:

    Temos de reconhecer que a lista dos países cujas dívidas nunca foram pagas é uma lista virtuosa. Depois de a ler, e analisar os períodos a que se refere, sou obrigado a concordar com a extrema-esquerda! Tornemo-nos, voluntariamente, um país em estado pós-guerra (sem guerra). Seria um sinal de inteligência!
    Depois veremos o que sobra para o “Estado Social”!

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