Não tenho certezas e raramente acerto

cavacoO presidente juntou hoje umas frases sobre o concurso dos professores e confirmou, mais uma vez, que é “um génio da banalidade”, como dizia José Saramago.

Primeiro, afirmou que é preciso fazer uma “reflexão séria sobre o modelo de colocação de professores”. Todos sabemos que não há nada pior do que uma reflexão que não seja séria, como algumas que andam para aí perdidas e vão com qualquer um.

Depois, com a argúcia vácua que o distingue, declarou que “as coisas não correram bem na colocação dos professores.” Não há palavra mais reveladora do rigor de alguém do que “coisa”. No fundo, é o descanso do ignorante: Houve ali uns problemas na colocação dos professores: deve ter sido uma daquelas coisas que correm mal. Se as pessoas, ao menos, tentassem arranjar coisas que correm bem, mas não…

“Parece que está em vias de resolver-se o problema, mas até este momento já houve atrasos nas aulas e, portanto, os alunos foram prejudicados.” silvou, a seguir. Parece-me que não há como o verbo “parecer” para exprimir certezas e para mostrar que se está dentro de um assunto.

Mais silvou Cavaco: “não é a primeira vez que acontecem estas coisas”. Estas quê? Coisas, claro. É claro que entre não ser a primeira vez e ser recorrente vai uma certa distância, mas Cavaco fala sobre coisas e diz que parece, pelo que seria ocioso esperar uma demonstração de que os problemas de colocação de professores são recorrentes: bastaria ter pedido uma pequena investigação para descobrir que os problemas surgiram a partir do momento em que alguns ministros quiseram utilizar outros sistemas de colocação de professores.

Mas a cerveja em cima do tolo está reservada para o fim: “Como sabem eu vivi em Inglaterra, tive filhos numa escola, e os problemas na colocação de professores nunca se colocavam. Porquê? Porque penso que havia uma descentralização na colocação de professores e não era tudo resolvido no Ministério da Educação” (sublinhado todo meu).

Parece-me muito bem que os problemas de colocação não se coloquem, mas, mais do que isso, não há nada como dar exemplo para que se faça, finalmente, uma reflexão séria. Como é que se faz, então, uma reflexão séria? Fala-se de uma estadia no estrangeiro e usa-se uma expressão como “penso que”, tão reveladora de um conhecimento aprofundado como o verbo “parecer”.

Quando Cavaco silva, penso que há coisas que parecem.

Comments

  1. João Paz says:

    O “senhor” que AGORA parece rendido ao parece e ao talvez para mascarar coisas que são óbvias para quem as quiser ver (não há maior cego do que aquele que não quer ver) há muito que está rendido ao estrangeiro muito em particular, não à Inglaterra que refere, mas à Alemanha (como vão longe os tempos em que fazia o mesmo ou pior esterco mas “nunca se enganava e raramente tinha dúvidas”). O problema nem são as idiotices que profere porque com essas podemos nós bem o Problema é MANTER-SE como o principal suporte de um governo que , todos os dias, destrói uma parte do que sobra de Portugal. Ou o derrubamos e o internamos numa clínica de Neurologia junto com o governo de que é esteio ou a sua idiotice, conveniente aos seus amos da estranja, deixar-nos-á de rastos.


  2. O seu “post” está muito engraçado e perspicaz, “lamentavelmente”.
    Gostei muito da utilização de várias expressões/ considerações, como por exemplo: “Quando Cavaco silva, penso que há coisas que parecem.”
    Porém, destaco o “génio da banalidade”, de Saramago, como a “cereja no topo do tolo”, porque me agradou bastante relembrá-la.


  3. Faço apenas uma justiça a Cavaco Silva. O seu parecer, a sua opinião são irrelevantes, tão irrelevantes como o cargo que ocupa. Não é pessoal mas também ninguém ousa discutir, excepção feita aos monárquicos mas esses têm um objectivo, que caso o alcançassem e espero que não, apenas perpetuaria a irrelevância. Numa época em que até já se falou na diminuição do número de deputados, ninguém ousa falar se vale a pena manter um inquilino no palácio situado nas imediações da Antiga Fábrica dos Pastéis de Belém…

  4. niko says:

    ai cavaco estas feito ao bife

  5. maria câmara says:

    De um sarcasmo tão refinado e certeiro e, por conseguinte, daquela hilaridade que, mais do que fazer rir com alarvidade, faz sorrir, e sorrir e ainda continuar a sorrir, mesmo depois de se ter acabado de ler.
    O “silvo” do Silva, como atrás já alguém também notou, é de uma rematada acutilância!
    Posto isto, só me resta dizer que (me) sou obrigada a partilhar, pelo que deixo o meu obrigado.

Trackbacks


  1. […] Não tenho certezas e raramente acerto. […]


  2. […] As escolas – e, portanto, todos aqueles que aí trabalham – são rochedos que vão resistindo como podem às muitas intempéries a que estão sujeitos. Políticos, professores universitários de muitas áreas, empresários, teóricos, cronistas, jornalistas, analistas, todos pensam saber mais sobre Educação do que aqueles que trabalham nas escolas. O costume: num convívio de dez pessoas em que uma seja professor, os outros nove têm sempre explicações a dar e medidas infalíveis para propor, ficando o professor desvalorizado por ser parte interessada. Até Cavaco, com o génio que se lhe reconhece, resolveu, há poucos anos, os problemas nos concursos de professores. […]


  3. […] Cavaco regozijou-se com a perda de pio do socialismo e criticou, mais uma vez, um alegado anti-europeísmo , o que confirma o primarismo clubístico que está no cerne na sua visão do mundo, feita de ódios e nunca de análises, por muito que ponha um ar professoral. […]