Na sexta-feira, estava o abanão do Brexit ainda fresco quando o Washington Post escrevia que “muitos britânicos poderão nem saber em que é que votaram”, num artigo com um título desdenhoso afirmando “Os britânicos estão a pesquisar freneticamente sobre o que é a UE, horas depois de votarem pela saída“.
No entanto, a notícia espalhada pelo Washington Post, e amplamente disseminada, é falsa. Este jornal baseou-se num tweet gerado pela ferramenta Google Trends, a qual analisa em tempo real o que é que as pessoas estão a pesquisar.
+250% spike in "what happens if we leave the EU" in the past hourhttps://t.co/9b1d6Bsx6D
— GoogleTrends (@GoogleTrends) June 24, 2016
De acordo com o Google, houve um pico de 250% no número de pesquisas “What happens if we leave the EU?”, sendo a pesquisa “What is the EU?” a segunda mais popular em relação ao Brexit, após conhecido o resultado do referendo.
O problema é que as percentagens são relativas e uma grande percentagem pode não significar uma multidão. Quem quiser usar este tipo de estatísticas deve igualmente indicar qual é a base de comparação. Estaremos a falar de centenas de milhares de pessoas a procurar este termo? Ou de milhões? Ou apenas de algumas dezenas?
De acordo com uma análise realizada por Danny Page e Remy Smith, menos de mil pessoas terão realizado esta pesquisa, ou seja, menos do que 0.001% da população. No mês anterior à votação do Brexit, 8100 britânicos terão realizado a pesquisa “What is the EU?”, o que se traduz em cerca de 261 pessoas por dia. Portanto, um aumento de 250% pode ter sido gerado por apenas 650 pessoas terem realizado no Google esta pesquisa num dia.
Os números têm destas coisas. Parecendo imparciais, na verdade podem ser usados para sustentar teses subjectivas ou, até, sem relação com a realidade.
The lack of context really is astounding. pic.twitter.com/kN5BJkNDUQ
— Brad T (@Sammich_BLT) June 24, 2016
Quando se usarem números, é preciso perceber os dados representados. Um jornal como o Washington Post devia prestar atenção a questões como esta. E o leitor deveria ter espírito crítico para não absorver toda a patranha que se escreva – o que inclui este post.
(adaptação do artigo “No, Britons Were Not Frantically Googling ‘What Is The EU?’ Hours After Brexit Vote“)
Danny Page e Remy Smith, fazem parte do grupo de milhões de Americanos que têm que pesquisar na Internet onde fica a Eslováquia antes de se aventurarem a fazer uma viagem para este País, pois correm o sério risco de irem ter ao Chile, tal a sua ignorância.
Portanto, com base neste pressuposto, é normal que concluam dessa forma.
Não sei se foram aos magotes, mas a verdade é que não conheciam nem estavam preparados para a saída.
Corbyn, do partido trabalhista vai ser obrigado a demitir-se porque, segundo uma maioria dos deputados do seu partido, não se empenhou de forma eficaz no “Remain”.
Vai a eleições dentro do partido e pode ganhar novamente.
Boris Johnson, pró-Brexit do Labour e putativo primeiro ministro, não tem qualquer ideia sobre o que vai fazer quando activar o famoso artº 50 do Tratado de Lisboa.
A única intervenção sua conhecida, sobre este assunto, refere que o homem já não tem pressa nenhuma em sair, como sonha com ficar com as vantagens da UE rejeitando as desvantagens.
(Como dizem no UK o homem quer a impossibilidade de “comer o bôlo e ficar com ele”).
A contestação à sua indigitação para PM está a ser forte e não é liquido que seja indigitado.
Quanto a Farage não tem qualquer projecto político para apresentar e parece que já conseguiu o que queria ou seja, sair da UE “custasse o que custasse”, e os custos podem ser ficar sem a Escócia e a Irlanda do Norte e pôr os britânicos a percorrerem um caminho de pedras, pois as contas são as piores de há quase 40 anos e o comércio com a UE representa metade das exportações.
Para já verifica-se que uma das democracias mais antigas do mundo, e uma referência, está a sofrer tratos de polé.
Depois da UE ter criado a democracia de marcha atrás, (faz-se um referendo ou eleição e se o resultado não servir faz-se outro passados uns meses), o UK criou a democracia do caranguejo ou seja, “não serve, pois então põe-se de lado” à espera sabe-se lá de quê.
Quanto aos problemas jurídicos, (recorde-se que o UK não tem uma Constituição escrita), estes ainda são maiores que os problemas políticos, pois não é liquido saber se o Parlamento pode aprovar o Brexit sem antes anular as leis que permitiram a entrada na UE.
Isto para não dizer que não se sabe se o Parlamento pode anular o referendo e considerá-lo meramente consultivo.
E para a confusão ser ainda maior podemos imaginar que há um partido que ganha as eleições, (apesar destas não serem obrigatórias para eleger o substituto de Cameron), tendo como sua principal promessa eleitoral a permanência na UE.
E tudo isto acontece num país exemplarmente democrático e com uma participação cívica crítica e informada por excelentes órgãos de comunicação social.
A finalizar este arrazoado diz-se que a rainha, favorável ao Brexit segundo as más línguas, pediu três razões para o UK ficar na UE.
Algumas já foram acima citadas mas aí vão mais algumas:
Ausência de Guerra;
Maior eficácia no combate ao terrorismo e
uma enorme comunidade civilizacional e cultural escancarada aos jovens de toda a Europa que não conheceram guerras nem fronteiras.
Oremus e esperemus que não seja nada!!!