Para acabar de vez com a CMVM

Ao ler o título deste despacho da Lusa, pensei que o presidente da República tivesse abruptamente aportuguesado a terminologia utilizada na instituição onde é membro do muito restrito clube dos “notable alumni” e do ainda mais exclusivo clube dos “internationally renowned alumni“. Efectivamente, o vídeo da SIC não é esclarecedor, mas, por aquilo que leio na notícia do Público, escrita em  português europeu padrão, estas *maturidades terão sido criadas pela Lusa e repetidas por órgãos de comunicação social que plasmam acriticamente os despachos. De facto, Cavaco Silva já falou em maturidade, sim, mas na verdadeira acepção do termo.

Pelo contrário, o ministro das Finanças não se coíbe de utilizar *maturidades («Foi acordado em princípio, e sujeito aos processos nacionais de validação parlamentar, sempre que apropriado, estender as maturidades dos empréstimos oficiais europeus por sete anos»), mas com pertinente correcção efectuada pelos jornalistas no parágrafo seguinte («O ministro português qualificou como “um momento especial” a decisão tomada em Dublin e salientou a importância do prolongamento dos prazos de pagamento»).

“Maturity”, segundo o excelente Routledge Dictionary of Economics, significa tão-somente «the terminal date at which a bond, bill or debt is due to be paid». Isto é, uma “maturity” corresponde, portanto e claramente, a um vencimento, na acepção de ‘termo do prazo para se fazer um pagamento’, sendo as ministerial e mediaticamente tão propaladas *maturidades os “prazos ou datas de vencimento”.

“Securities” quer dizer “valores mobiliários” e “equities” pode ser “títulos de capital“, se isolada, ou “participações”, se acompanhada de “private” (“private equities” —> “participações privadas“). Como “rating agency” é uma “agência de notação financeira“, “venture capital” significa “capital de risco“, “hedge funds” quer dizer “fundos de cobertura de risco” ou “fundos de retorno absoluto“, as “eurobonds” não são *eurobondes, mas “euro-obrigações“, “insider trading” é “delito de iniciados“, etc., etc..

Quando quiserdes utilizar *maturidades em vez de “prazos de vencimento”, isto é, quando traduzirdes o sufixo de nominalização inglês –ity pelo português –idade, mantendo o radical matur-, lembrai-vos também de transformar a CMVM em CMS, ou seja, Comissão do Mercado de Securidades. Claro! Se pretenderdes ser mais ousados e não vos limitardes ao sufixo (por exemplo, para quê título de capital, quando temos um –idade para –ity e podemos transformar uma equity numa equidade?), atacai o radical, não admitais homonímias, vozeai as laminoalveolares e as dorsovelares e chamai-lhes maduridades e até seguridades. Sede audazes, não vos fiqueis pelas maturidades e acabai de vez com os valores mobiliários.

Actualização (15/4/2013): Excelente apontador e mais um contributo (os meus agradecimentos à Professora Rute Costa)

Comments

  1. UM BOM TEXTO DIDÁTICO . PORÉM SE A CMVM ACABASSE COMO TODAS AS OUTRAS POR ESSE MUNDO FORA , BEM COM TODO O TIPO DE BOLSAS , INCLUINDO A BANCA , QUE É O MAIOR ANTRO DE CORRUPÇÃO EM TODO O MUNDO , TALVEZ NÃO SE PERDESSE NADA E TALVEZ SE ACABASSEM AS CRIMINOSAS E SUJAS JOGADAS QUE SE FAZEM NO MUNDO DO CAPITAL SELVAGEM. COMPLETAMENTE CONSPURCADO DE VÍCIOS E DE DESUMANISMO –

Trackbacks

  1. […] acepção de “que espeta” (ver entre 13:30 e 15:00) e neste extraordinário título (mais uma vez, os meus agradecimentos à Professora Rute Costa): «Espetador esvaziou insuflável e estraga etapa […]

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