Acabaram-se as desculpas

Transversalmente, os partidos políticos, à semelhança da sociedade em geral, estão viciados na falsa concepção de que existe uma Justiça para ricos e outra para pobres.

Na verdade, quem é pobre ou quem é rico, tem o acesso mais facilitado à Justiça do que a classe média. Os pobres podem recorrer ao apoio judiciário, e os ricos às suas fortunas. Quem faz parte da classe média é que não pode recorrer nem a uma coisa nem a outra. Antes, enfrenta taxas absurdas.

É, pois, imperativo e urgente acabar com as taxas e os encargos proibitivos. E de uma vez por todas, à semelhança da Saúde, ser consagrado o princípio de “tendencialmente gratuita”. Pois se sem Saúde não há vida, sem Justiça não há sociedade.

Infelizmente, a Justiça tem sido assunto mais de títulos noticiosos do que de análise e ponderação. A reboque de fúrias, paixões e oportunismos, pouco se tem feito para começar, desde logo, a legislar melhor.

Do programa eleitoral do PS, existe um diversificado elenco de ambições e de medidas, mormente de modernização e de agilização, que quem as lê fica com a ideia que os socialistas têm estado na Oposição e não na governança.

Nada do que agora o PS propõe realizar, foi feito ao longo dos últimos 6 anos. Pela simples razão de que muito pouco – pois nada seria sempre impossível, por muito pouco que fosse -, foi feito em matéria de Justiça.

Efectivamente, os dois mandatos da Ministra Francisca Van Dunem, reduzem-se a 6 anos perdidos. Nada mais. E, talvez por isso, o PS nem se recorde, que esteve a governar nesses mesmos 6 anos. Prometendo, agora, tudo quanto havia prometido antes e mais um par de botas. Ainda que em matéria de taxas de justiça, apenas ambicione reduzir nos casos em que “importam valores excessivos”.

Ao fim de 6 anos, aperceberam-se que há “valores excessivos”. Lindo!

A verdade é que uma maioria absoluta, acaba com quaisquer desculpas: a Justiça só não se aproximará do povo e cumprirá a sua missão, se não houver vontade política.

Por isso, é bom que se deixem de merdas e arregacem as mangas. Se não for por convicção, ao menos que seja por vergonha. Se ainda houver, uma ou outra.

Comments

  1. POIS! says:

    A justiça bem pode ser apresentada como o paradigma dos serviços do Estado preconizados pelos liberais.

    Com efeito, instalou-se um progressivo princípio do utilizador-pagador, à maneira liberal, num mundo onde atuam uma data de privados a que se tem obrigatoriamente de recorrer (e que, á boa maneira “liberal”, arranjam modo de destruir completamente uma possível concorrência entre si(*) e em que, para evitar uma possível inconstitucionalidade no acesso, se dão umas borlas exclusivamente a pessoas que vivem na estrita pobreza. Basta uns laivos de rendimento um pouco acima do mínimo para passar a ser rico e a ter de pagar tudo do seu bolso.

    E tanto paga a empregada de limpeza como um qualquer milionário, o pequeno comerciante ou uma multinacional. Uma “flat rate” perfeita, o orgasmo dos liberais em ação!

    Há muito que estudos realizados, por exemplo, pelo Observatório Permanente da Justiça, chamam a atenção para a progressiva privatização dos próprios tribunais, na medida em que estes se tornam, muitas vezes, em balcões ao serviço das grandes empresas, onde avultam as dos novos “cobradores do fraque”.

    Além das taxas proibitivas (designadas de “terroristas” por muitos advogados), o que mais desencoraja qualquer um de recorrer ás vias judiciais é o de nunca saber, a mais da incerteza do desfecho, a quanto tudo lhe vai ficar no fim. Ou seja, sabe-se como tudo começa, mas ninguém pode prever como acaba.

    Tem razão o J. Teixeira, e é urgente a criação de um Serviço Nacional de Justiça, tendencialmente gratuito, ao serviço dos cidadãos que pagam impostos. Eu trocaria, de bom grado, o pagamento de mais alguns euros pela existência desse tal serviço.

    (*) Que duvido que fosse socialmente benéfica, mas o certo é que não existe.

  2. JgMenos says:

    Perdedor/ pagador é um bom princípio de justiça, se a Justiça for confiável.

    • POIS! says:

      Pois…”perdedor-pagador”?

      Grande ideia, sim, senhor!

      Assim, até se podia financiar a justiça de outra maneira: com um sistema de apostas. A malta apostava no resultado e ganhava uns cobres!

      Podia chamar-se “Tribunacard”.

      As casas de apostas (Betclics e tal…) propunham as “odds”, por exemplo:

      Estado-Rendeiro: Vitória do Estado 4,5; Rendeiro, 2,3; empate 1,02. A tendência é para o empate, adivinha-se prolongamento e penalties.

      Venturoso Quarto Pastorinho – Família Coxi (reprise): Pastorinho 500,05; Família Coxi 1,01; empate: 0,00.

      Estado-Sócrates: Estado 100,5: Sócrates 1200,60; empate: 69,69; Advogados: 1,01;

      Pagava-se a justiça e faziam-se fortunas! Quer melhor?

  3. ARSantos says:

    Na mesma lógica dos aumentos salariais percentuais devem as coimas, as taxas de justiça, etc. ser também percentuais. Simples.

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