Estados Unidos das Bananas

Documentário do canal alemão DW “On Bananas and Republics” sobre o império construído pela empresa United Fruit Company (UFC), considerada a primeira grande multi-nacional. Como esta empresa dominou diversos países da América Central, tomou conta das respectivas infraestruturas e colocou os governos e militares desses países ao seu serviço. A tomada de posse dos caminhos de ferro, telégrafo e terras por parte da UFC. A estratégia do não pagamento de impostos, pioneira no agora omnipresente “planeamento fiscal”. A história de como a revolta dos trabalhadores na Guatemala foi transformada num problema político dos EUA, tendo conduzido a uma guerra civil que durou 36 anos. A forma como a UFC montou uma história sobre a Guatemala, sem paralelo com a realidade, como forma de conter a revolta aos países vizinhos onde ela operava. A dívida dos países da América Central como instrumento de consolidação de poder da UFC. A expressão”República das Bananas” cunhada por O. Henry em 1901 para descrever o regime das Honduras e países vizinhos onde empresas como a UFC podiam fazer tudo o que queriam.

Imagem do documentário “On Bananas and Republics” (clicar para ver)

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Futebol e Ditaduras

Anda muito na moda bater na selecção da Coreia do Norte porque o regime político que ali vigora é uma ditadura. Não concordo. Sendo certo que as vitórias na bola beneficiam por regra os governos, sejam democráticos ou não, confundir um país e um povo com o regime que suporta não faz o meu género. É a mesma lógica dos embargos: quem se lixa é sempre o mexilhão.

Por outro lado a Coreia do Norte não é o único país que vive em ditadura presente no campeonato do mundo. Por exemplo as Honduras vivem há  um ano as consequências de um golpe de estado, onde com a cumplicidade do velho dono do quintal se trava uma guerra diária entre a resistência e o governo, que alcançou o poder através de uma farsa a que chamaram eleições. Todos os dias os esquadrões da morte torturam e assassinam elementos da resistência, dizendo depois que se trata de lutas entre os traficantes de droga.

Sobre a selecção hondurenha escreve o meu amigo Fabricio Estrada

Nuestros jugadores buscan en su interior y se saben habitantes de una nación artificial, donde los premios, la imagen sobredimensionada y el nacionalismo decimonónico los separa de la historia de exclusión y represión vivida por la clase social de la cual provienen; saben que en las graderías no está apoyándolos el pueblo prisionero por la oligarquía, sino que quienes corean ¡viva Honduras! Son los que machacan sin piedad, los que lanzan a las hordas militares contra sus madres, contra sus hermanos, contra sus primos… los mismos gritones que bendicen el racismo y la vanidad.

Y sin embargo, lo que ellos convocan es el olvido histórico, aunque esta historia se esté gestando ahora mismo, aunque ésta se encuentre a 16,000 kilómetros de distancia.

La conexión espiritual con nuestra selección nacional de fútbol se ha roto. El espíritu que nos levanta en las adversidades es como una lupa que concentra la luz sobre un objetivo, y definitivamente, en esta ocasión, la luz del pueblo hondureño oprimido está concentrada en pasar a otra fase muy distinta de la que aspiran los Ferraris, los Callejas y los Atalas.

La buena vibra -que sí existe- se ha quedado adentro, muy adentro de esta Honduras revolucionaria.

Apesar de tudo isto, hoje vou torcer pelas Honduras contra a Espanha. Porque prefiro os pequenos aos grandes. Porque a selecção do estado espanhol é mimada demais para o meu gosto. E porque é das poucas coisas que posso fazer pelo povo hondurenho, mesmo sabendo que o campeonato que joga, o da resistência à ditadura, não se disputa na África do Sul.

Honduras: grandiosa despedida do companheiro Manuel Zelaya

Terras de sol e não poder ver de frente o sol…
Terra de homens e não poder ver de frente o homem.
(Seferis)


Ontem, mais de 350 mil membros da Resistência marchámos em Tegucigalpa até ao fim da pista do Aeroporto Toncontín, no sítio onde Isis Obed Murillo, o nosso primeiro mártir, morreu naquele fatídico 5 de Julho de 2009.

Antes da saída do companheiro Manuel Zelaya, a actividade cultural organizada por Artistas em Resistência, fez mais uma demonstração da vitalidade com que assumimos a luta.

O momento da descolagem do avião foi comovedor, um inesquecível marco histórico pelas centenas de reacções que provocou, palavras de ordem, lágrimas, promessas de vencer e de refundar um novo país, no meio da despedida do primeiro presidente desterrado, em pleno século XXI, na América Latina.

E como demonstração, o acto simbólico da passagem da faixa presidencial para três representantes da Resistência: o jovem David Montecinos, Dionisia, a «Avó da Resistência» e Juan Barahona, dirigente da FNRP (Frente Nacional de Resistência Popular). A ex-ministra do Trabalho, Mayra Mejía, foi a encarregada de lhes entregar a faixa.

Enquanto o Estádio Nacional se enchia de militares, as ruas de Tegucigalpa voltaram a sentir o peso da Resistência Hondurenha, cada vez mais fortalecida e decidida.

O nosso caminho para a Constituinte ganha mais força!

Até à Vitória,
SEMPRE!

( Texto de Fabricio Estrada, fotos de Léster Rodríguez e de Mayra Oyuela)

Cara ou coroa?

O post de João José Cardoso sobre Miguel Sousa Tavares obrigou-me a algumas considerações.

 O Dr. Miguel Sousa Tavares tem uma habilidade, já muito antiga, para dar uma no cravo e outra na ferradura. Parecendo que é uma virtude, dado que pretende mostrar uma independência que não está nem do lado do cravo nem do lado da ferradura, não o é.

 E não o é, porque quem padece é o pobre bicho. Neste caso, eu não me importo de passar por bicho, e de a minha mente passar por ferradura.

 O Dr. Miguel Sousa Tavares não é um intelectual de meia tigela, como tantos outros. Se o fosse, eu não lhe daria o martelo nem submeteria a minha mente às suas marteladas. Por não o ser, e por escrever bem, eu leio-o, umas vezes com gosto e outras com desgosto. Com gosto, não pelo facto de estar de acordo com as minhas ideias, e com desgosto, não porque esteja em desacordo com as minhas ideias. [Read more…]

As Honduras muito bem explicadas a Miguel Sousa Tavares

Recordo que a pergunta do tal referendo que Zelaya tentou organizar era “¿Está de acuerdo que en las elecciones generales de 2009 se instale una cuarta urna en la cual el pueblo decida la convocatoria a una asamblea nacional constituyente?”; ou seja, a questão a referendar era se, no dia das eleições gerais (as tais que ocorreram na semana passada) deveria também ser votada a eleição de uma assembleia constituinte. Ora, tal nunca poderia servir para Zelaya se candidatar a um segundo mandato, como MST escreve: mesmo que a tal constituinte retirasse a proibição constitucional da reeleição, isso ocorreria já sob um novo presidente.

no Vento Sueste

A máquina do tempo: a XIX Cimeira Ibero-Americana de Lisboa, as Honduras e o bicentenário da independência

 

No próximo ano celebra-se o bicentenário de uma parte das nações latino-americanas. Essa luta de libertação foi particularmente empolgante pela grande solidariedade que existia entre os diversos povos e forças envolvidas na luta pelas independências nacionais. Por exemplo, os generais argentinos O’Higgins e San Martín atravessando a cordilheira dos Andes para libertar o Chile ou Simón Bolívar, nascido em Caracas, actual capital da Venezuela, avançando desde o norte do subcontintente, indo pela Venezuela e Colômbia, passando ao Equador para atingir o coração da América Latina e ali implantar uma nova nação – a Bolívia. Solidariedade que actualmente não se verifica, como se vê na posição que cada país da região toma face à grave crise hondurenha.

 

Neste momento, dois séculos depois dessa épica fraternidade, existe uma profunda divisão entre os países latino-americanos. Ilustrando bem essa divisão, no rescaldo da XIX Cimeira Ibero-Americana realizada no Estoril, e que terminou na passada terça-feira, salienta-se o facto de a crise nas Honduras, ter dividido os delegados das 22 nações representadas. A presidência portuguesa obteve uma declaração que condenando o golpe nas Honduras conseguiu reunir consenso. Porque os estados americanos de língua espanhola e portuguesa não se entendem quanto a este recente episódio da queda do presidente Manuel Zelaya, em 28 de Junho, e da não-legitimação das eleições .

 

A «Declaração de Lisboa» e os termos em que foi redigida, condenando «as graves violações dos direitos e liberdades fundamentais do povo hondurenho», mas não assumindo qualquer posição quanto à farsa das eleições de 29 de Novembro, demonstra bem a gravidade da divergência entre povos outrora irmãos. A clivagem faz-se entre os países que, alinhando a sua posição pela dos Estados Unidos – Panamá, Costa Rica, Colômbia e Peru – legitimam a vitória de Porfírio Lobo, e aqueles que consideram essas eleições aquilo que evidentemente foram – «uma paródia», como a classificou Cristina Kirchner, a presidente da Argentina; além deste país, recusam liminarmente a legitimação, o Brasil, a Venezuela, o Equador a Bolívia e Cuba.

 

Há depois os que assumem uma posição intermédia, apadrinhada por Espanha. José Rodríguez Zapatero reconheceu que se realizaram as eleições, conforme estava constitucionalmente previsto, mas em «circunstâncias anómalas». O Brasil, o gigante do hemisfério, apresentou a postura mais firme, recusando o resultado de umas eleições fraudulentas. Para que a beligerância dos discursos atingisse grandes proporções, faltou a voz de Hugo Chávez que não veio ao Estoril. Raúl Castro também não apareceu, fazendo-se representar pelo ministro dos Negócios Estrangeiros, Bruno Rodríguez.

 

Todos os representantes presentes na cimeira do Estoril se comprometeram a colaborar no sentido de possibilitar um «diálogo nacional nas Honduras e a devolução do regime democrático ao povo hondurenho». Entretanto, em 27 de Janeiro, Porfírio «Pepe» Lobo toma posse e termina a hipótese do tal diálogo. Manuel Zelaya continua a ser o presidente constitucional, teoricamente em funções, embora na realidade esteja desde 22 de Setembro refugiado na embaixada brasileira em Tegucigalpa. Por aqui se vê como foi pífia a decisão da cimeira.

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Em resumo: não se chegou a acordo quanto às Honduras, nem quanto ao clima, um dos assuntos em que se deveriam ter centrado as conversações ibero-americanas, quando faltam poucos dias para abrir em Copenhaga a conferência da ONU sobre as alterações climáticas. Condenando a falta de resoluções concretas, activistas da Greenpeace escalaram durante a manhã de segunda-feira, dia 30 de Novembro, a Torre de Belém, para chamar a atenção dos líderes ibero-americanos. O protesto foi reprimido horas depois pela polícia, que deteve nove militantes da organização ecologista.

 

Entretanto, notícias da madrugada de hoje dão-nos conta da decisão do Congresso hondurenho ter votado contra o regresso de Zelaya à presidência para terminar o seu mandato. Dos 128 deputados, 78 votaram contra a restituição do mandato presidencial a Manuel Zelaya e 11 a favor, abstendo-se os restantes. Cada deputado pôde justificar o seu voto. Muitos dos que votaram contra, alegaram pretender «fortalecer a democracia», aludiram à «paz e tranquilidade do país», congratularam-se pela «limpeza» e pela «transparência das eleições». Alegou-se também a grande influência que Hugo Chávez exercia sobre o mandatário deposto. A palavra «pátria» entrou em quase todas as declarações de voto.

 

Por aqui se vê o que valem as palavras – gente que está a minar, a destruir a liberdade e a democracia na sua pátria, a apoiar o resultado de umas eleições que foram tudo menos transparentes e que uma grande parte da comunidade internacional se recusa reconhecer como legítimas, usa o nome dos valores que traiu para justificar a traição.

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Voltando à próxima passagem, em 2010, do Bicentenário das primeiras independências de países latino-americanos, Ricardo Lagos, presidente da República do Chile entre 2000 e 2006, e que preside actualmente, com o escritor mexicano Carlos Fuentes ao Foro Ibero-América salienta num artigo publicado, sábado, 28, no El País, esta característica da luta de libertação dos povos da América Latina, colonizados até então pelo estado espanhol e por Portugal – a grande solidariedade entre os países irmãos que nasciam da extinção do império colonial espanhol. Chama-se esse texto «Uma nova independência» e termina assim:

 

«Celebramos estes 200 anos entendendo que agora, mais do que a afirmação da identidade nacional, devemos enfrentar em conjunto um processo de integração e, através desse processo, entender que nos reencontrámos com Espanha e Portugal para nos ajudarmos mutuamente na construção de um mundo melhor. Nesse contexto, as cimeiras ibero-americanas são determinantes no esforço por construir o início de uma comunidade de nações que, dos dois lados do Atlântico, compartilham ideias, história, língua e valores comuns. A partir da
,
essa comunidade entende que no século XXI temos um futuro para construir em conjunto. O bicentenário constitui uma oportunidade para renovar os laços de uma história que tem mais de 500 anos.»

 

Alusiva a essas figuras épicas e com base no XX poema do livro IV de «Canto General», de Pablo Neruda – (Los Libertadores), deixo-vos com a «Cantata a los libertadores», composta pelo argentino Raúl Mercado. É uma maravilha, o poema de Pablo e a música de Mercado, que dedico aos patriotas hondurenhos.

 

O’Higgins, para celebrarte

a media luz hay que alumbrar la sala…

 

 

 

Honduras: os ditadores brincam às eleições

A ditadura golpista hondurenha montou ontem uma farsa eleitoral. Na falta de votantes inventaram votos. Na falta de candidatos da oposição inventaram-se os golpistas como rivais.

Num país onde não há liberdade de expressão nem sequer governo legítimo a fraude e a farsa têm o apoio dos mesmos Estados Unidos que foram no mínimo coniventes com o golpe de estado.

Tudo como dantes no velho quintal americano.