Ela está aborrecida, entediada, fartinha de aturar chatos. O queixo apoiado na mão, a unha do dedo pequenino a roçar os lábios, o olhar perdido no vazio, e os caracóis louros a pender sobre os ombros.
Pigarreio. Repito: Boa tarde.
Ela rola os olhos, desde o infinito por onde eles vagueiam, e encara-me, com uma expressão de asco e de infelicidade, e pergunta em tom monocórdico: Tem cartão-cliente?
Não tenho.
Vai tocando no monitor com as unhas pintadas de um vermelho muito polido, mas onde se notam pequenas marcas de mordidelas. Suspira.
Aproxima-se o rapaz da caixa do lado.
– Troca-me por duas de cinco.
– Não tenho.
– Anda lá, tenho que dar uma de cinco ao cliente.
– Porra, Zé, já te disse que não tenho! Não me pagaram nada em dinheiro hoje, deves achar que as notas nascem aqui! Pensas que eu ando a dar o pito?!
Ele encolhe os ombros e volta ao lugar com cara de poucos amigos.
No mesmo tom monocórdico de há pouco, ela pergunta-me:
– São cinco euros e vinte cêntimos, como é que vai pagar?
Sem sombra de embaraço, olha-me com impaciência, e eu fico a pensar que talvez não tenha ouvido bem.
Todas perguntam pelo “nosso cartão” como se pertencessemos todos à confraria.