(foto: Hugo Correia/Reuters)
A mulher, com seus bonitos oitenta anos, cabelo muito curto, brincos, camisola de gola alta, ocupava o canto mais escondido do estabelecimento onde costumo tomar café. Sobre a sua mesa, não vi marcas de pequeno-almoço. No lugar da chávena e do prato, folhas soltas, muitas, manuscritas, espalhadas também sobre as cadeiras ao seu lado, num certo caos caseiro. Um livro aberto completava o quadro, tão real quanto a foto acima. Seria um dicionário?
Levantou-se. Voltou à mesa com o Jornal de Notícias. Movia-se como se estivesse na sua própria casa… Pousou-o dobrado sobre as suas coisas. Ficou a olhar para os títulos da primeira página da edição de ontem. Entretanto, outros clientes esperavam a oportunidade de agarrar o mesmo jornal que sabe bem ler de graça enquanto se toma o café.
Aquela senhora não estava com pressa alguma. Continuava na primeira página do jornal ainda dobrado como se mais nada existisse à sua volta, com todo o tempo do mundo. Estaria interessada na Greve Geral?
Não tive tempo de saber o que dizia o tal diário. Nem esse nem nenhum outro: um dia de muito trabalho. Ainda por cima, coisas que não podia adiar para outro dia nem fazerem outros por mim.
Bebi o café ao balcão e fui trabalhar, pensando nela. Matutando no que aquela mulher pensa disto tudo …
a vida vale exactamente por tudo aquilo que sai do ordinário e nos leva…onde a nossa cabeça e o nosso coração se encontram…que experiência fantástica essa! e que texto maravilhosamente doce para uma imagem tão dura!
obrigada!
Eu é que agradeço a doçura do seu comentário, Lazy Cat!
Uma excelente imagem de um momento unico.