Hoje no Magreb, amanhã… – a luta contra a multiplicação da pobreza

EVOLUÇÃO DE PREÇOS DE “COMMODITIES” – 2008 a 2010

PRODUTO
(1)
Dez.2008
(2)
Dez.2009
(3)
Dez.2010
(4)
Δ%
2010 v 2008
(5)
Δ% médio anual
2000-2010
(6)
Trigo (Argentina) $176,00 $240,00 $302,00 71,59% 15,45%
Milho (Argentina)  $150,95 $178,00 $261,00 72,90% 13,32%
Arroz (Tailândia) $551,00 $606,00 $536,80 -2,58% 12,61%
Açúcar (©/lb) $11,75 $23,53 $27,98 138,13% 15,97%
Óleo de soja  $738,00 $935,00 $1.322,00 79,13% 19,17%
Óleo de girassol  $759,00 $986,00 $1.454,00 91,57% 21,03%
Crude ($/barril) $41,50 $74,90 $90,10 117,11% 20,78%

UNCTAD, Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento, publica neste “site” informação da evolução de preços das chamadas “commodities”. Dos produtos abrangidos, seleccionei o trigo, o milho, o arroz, o açúcar, os óleos de soja e de girassol,assim como o petróleo para o estudo de preços constante do quadro apresentado. 

Antes do mais, devo acrescentar algumas observações e destacar a expressão e efeitos de aumentos de preços demonstrados, a saber:

  • Os valores do quadro referem-se a cotações em dólares (USD) por tonelada, excepto os casos do açúcar cuja cotação é  cêntimos do dólar por libra peso (0,45 kg) e do petróleo, cotado em dólares por barril.
  • Todos os preços devem ser considerados para entrega na origem, significando, portanto, haver um incremento de custos de transporte até aos mercados de destino – daí a importância do impacto dos preços do “crude”.
  • Os dados do quadro revelam que, entre finais de 2008 e 2010 (2 anos), à excepção do arroz com uma quebra de – 2,58%, os incrementos foram substanciais; o preço do trigo, sendo o que menos subiu, aumentou 71,59%; o petróleo passou a custar + 117,11%, ao atingir o preço médio de $ 90,10 / barril – actualmente, lembre-se, está a ser cotado a $ 105,00 em Londres.
  • Se dilatarmos a análise para o período entre 2000 e 2010, as taxas médias anuais de crescimento dos preços registam valores percentuais de dois dígitos –  vide coluna 6 do quadro.

O fenómeno de subida dos preços em causa tem, naturalmente,  justificações. Uma, muito citada, é o efeito do desenvolvimento económico e social dos países emergentes, com China e Índia à cabeça. A melhoria das condições de vida das respectivas populações gera mais intensa procura de matérias-primas, cereais, e petróleo. Ao furtar-se aos riscos do mercado de acções, obrigações e outros produtos, na Wall Street por exemplo, os investidores deslocaram as aplicações para o mercado de “commodities”, nas bolsas de Chicago e Roterdão. A conjugação destes factores determina o movimento inflaccionista dos preços.

No cenário descrito, tornou-se impossível a regimes tipo tunisino (Ben Ali) e egípcio (Mubarak) sustentar políticas de subvenção de bens essenciais (pão, por exemplo) e políticas de emprego para absorver pesados contingentes de jovens, alguns licenciados, a viver em situações de pobreza. Hoje no Magreb, amanhã noutras paragens, os efeitos da desgovernada globalização são funestos. E, portanto, não é de admirar que em outras “Tunísias” e “Egiptos” haja explosões sociais de complexa solução.

Comments

  1. É isto mesmo! Há outro aspecto interessante. As pessoas têm uma completa inabilidade para lidar com a função exponencial. Pura e simplesmente não conseguem alcançar as consequências. Por isso acham perfeitamente natural que tenhamos crescimentos exponenciais, ano após ano, do consumo de combustíveis, do consumo de comida, inclusive do crescimento das economias (esta palestra ilustra muito bem este problema). Esquecem-se apenas do pormenor acessório da terra não ser infinita.

    Normalmente em resposta a esta observação falam das mãos invisíveis, mas em termos internacionais já andamos com esta dinâmica desde 2007 e não parece que tenha fim à vista.

  2. carlos fonseca says:

    Helder, cada ‘post’, no final, dá-nos sempre a sensação de que poderíamos ter feito melhor. Mas este, além de tudo, deu-me imenso trabalho, na compilação de dados e ainda, por cúlpa própria, na inserção do quadro – o Jorge soube das dificuldades.
    Porém, acho que é elucidativo e reflecte o que dizes: “a inabilidade das pessoas para lidar com uma função exponencial, num espaço, a Terra, que é finito”. Bela observação.

  3. Mas então como alimentar tanta população ?

    Quais as propostas do autor ?

    Que tal se cada país procurasse produzir alimentos o mais possivel em vez de os importar ?

    • carlos fonseca says:

      Questionar é uma metodologia ancestral, proveniente da Grécia Antiga. Dos tempos do verdadeiro Sócrates. Hoje não consegui aceder ao oráculo de Delfos, mas, ainda assim, vou tentar dar algumas respostas:
      1) Como alimentar a população? Respondo com outra pergunta: como evitar que milhões morram à fome e da falta de cuidados médicos – a SIDA em África, Ásia e até na Europa matou já milhões?
      2) Proposta do autor? Sou eu? Se sim, impedir que o processo de globalização se desenvolva sem supervisão intergovernamental do sistema financeiro (off-shores, bolsas encorajadoras de especulação, maior tributação dos lucros da banca, deixar de salvar bancos com dinheiros públicos e criar novos bancos com o mesmo dinheiro investido…) e com a total desregulação do sistema económico global (os produtos multinacionais geradoras de desemprego por efeitos de deslocalização seriam sujeitos a elevadas taxas aduaneiras nos países em que os encerramentos fabris tivessem lugar, tributação alta para produtos oriundos de países que praticam intensivamente o “dumping social” – China e Indía, p.e. -, no seio da Europa haver verdadeira harmonização na produção agrícola e pesqueira, para que a PAC deixe de ser instrumento dos países mais poderosos, impedimento pela OMC do sistema de tarifas alfandegárias dos EUA ajustadas a proteccionismos da agricultura, elevadas taxas de impostos sobre os negócios de futebol, criação de legislação internacional para eliminar a corrupção, sob a égide da ONU, do FMI e do Banco Mundial)… enfim, eis um rol de ideias que, contudo, não esgotam os temas a tratar.
      3) Quem está em melhores condições para lhe responder à 3.ª questão é justamente quem exerce ou exerceu funções governativas na generalidade dos países; em Portugal, p.e., seria interessante saber a opinião de Cavaco Silva, Guterres e seguintes, sobre os objectivos que tinham em vista com as políticas de extinção das produções agrícolas e pesqueiras, a troco de subsídios; e aproveitaria ainda para questionar por que razão dizimaram a indústria nacional (a CUF e associadas, a Siderurgia Nacional, a Covina…) a troco da instalação da produção amovível do unidades estrangeiras de têxteis e calçado. Eles, e respectivos ministros, estarão mais bem habilitados do que eu para lhe responder. Usará, certamente, a sua frontalidade para os confrontar. Espero.

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