Charles Romuald, está-se mesmo a ver, era meu primo, e já nem perco tempo a discutir com os incrédulos. Não tive a sorte de conhecer o Charles, o Carlitos, “el Morocho”, nem sequer ninguém que o tivesse conhecido, ele pertencia a um ramo da família que partiu para a América do Sul e já não voltou de lá. Mas reconheço-lhe certos traços de família, uma proximidade genética que vai muito além da cor dos olhos ou de um sinal no rosto. Não nos restaram provas dos laços de sangue que nos unem aos Romuald, daí a impossibilidade de calar os cépticos, e bem as procurei, a essas provas que eu não sabia de que forma poderiam revestir-se, por Buenos Aires, não tanto naquela que havia sido a sua casa, mas sobretudo nos alfarrabistas, entre volumes picados pela humidade, empilhados pelo chão, enfiados em caixotes, cobertos de pó em estantes carunchosas, sabendo da improbabilidade estatística mas acreditando no poderoso feitiço do acaso. Não poderia ter estado um documento ali, à minha espera, todos esses anos? E não seria eu impelida para esse livro, sem saber ao que ia, cumprindo o inevitável, destinado encontro? [Read more…]
Há filmes que nos marcam (1)
Há filmes que nos marcam, com cenas que nunca se esquecem.
“Scent of a woman” é uma autêntica galeria de cenas inesquecíveis.
A conversa entre Al Pacino e Gabrielle Anwar e o tango que se segue: mais que uma lição de dança, uma lição de vida.
PS e PSD: as cabeças da hidra
Hoje, há razões para comemorar, porque estamos perto de confirmar o óbito político do pior Primeiro-Ministro da Democracia portuguesa, o que não era um título fácil de atingir, tendo em conta que a concorrência era grande (e ser pior do que Santana Lopes era um desafio a que Sócrates não soube resistir).
Hoje, continua a não haver razões para comemorar, pois, ao que tudo indica, o PSD voltará a governar, o que constituirá uma mera alteração de siglas e uma continuidade de políticas. Depois de ter PECado em conjunto com o PS, o PSD irá a correr assinar os papéis que confirmam a união de facto, tumultuosa, é certo, mas não é o tango a dança que retrata essas relações em que o amor tem aparências de ódio? [Read more…]
E se lá tivesse ido falar portunhol?
«Sócrates: críticas de Passos Coelho em Madrid não honram “boas tradições da política portuguesa”», no Público
Poesia & etc. – Gira, gira…
Às vezes não vejo os vídeos que acompanham os textos e, portanto, compreendo que, relativamente aos vídeos que coloco, haja leitores que façam o mesmo. No caso de hoje, peço o favor de escutarem esta interpretação do tango «Yira, Yira» por Carlos Gardel, pois é importante ouvi-lo para compreender o que quero dizer:
Num texto de uma outra série, contei-vos os trabalhos que passei para traduzir um livro do grande escritor argentino Ernesto Sábato, («Heróis e Túmulos»). Estudara língua e literatura castelhana, mas a cada passo surgiam vocábulos que desconhecia e que os dicionários, incluindo o da Real Academia, não registavam. Escrevi então ao Sábato dando-lhe conta da minha dificuldade e ele, muito amavelmente, enviou-me um extenso glossário com termos argentinos e, inclusivamente com modismos «porteños», ou seja, bueno-airenses.
Na letra do tango cantado pelo Gardel, existem casos desses. A começar pelo título, Yira, Yira (pronunciado de forma semelhante á do português) – em castelhano dir-se-ia «Gira, gira», pronunciando-se como fonema fricativo velar surdo – velar, por ser articulado junto do véu palatino (os portugueses quando querem falar portunhol, resolvem o problema, transformando o «g» ou o «j» em «r» – exemplo – rúlio iglésias). [Read more…]
A menina Constança
Um dia, em Castelo Branco, apareceu-nos um carrão à porta do Liceu com uma passageira que, para nosso espanto, era uma aluna vinda de Portalegre, segundo se segredava. Aquilo, carro e menina a sair do bólide, deixou a maioria com os mesmos sintomas da Gripe Espanhola, que grassava então .
Era alta e grande, uma mulher para os seus 16/17 anos , nuito vistosa, vestia de maneira que a maioria de nós parecia um pedinte. E com a sorte muito própria que tenho, para mal dos meus pecados, teve que aterrar na minha turma.
Na minha turma vegetava o José Jacinto Beato, que tirava duas cadeiras por ano e o Pratas que ainda tirava menos, eram os mais velhos e os mais incorpados. Tinham mais dois, três anos que os normais, chamesmo-lhes assim, o que naquela idade é uma calamidade. Terceiro (no físico, que não na burrice) estava este vosso amigo que lá ía acompanhando os seus ídolos que namoravam e arranjavam uns bailes, numas casas do pai do Freixo (esse do pato que fala sozinho, o ventríluco da TVI).
Bem, o nosso professor, Moura Pinheiro, (o tio-avô da jornalista, segundo julgo saber) homem de muitas idades, com o seu ar de quem nem todos os dias batia bem a bola, vá de reunir os três para a conversa a querer saber qual de nós namorava a menina Constança. Que não, nenhum de nós namorava, se nos viu a acompanhá-la era só isso, companhia. Pois sim, pá, quero ver qual de vós é que a “engata” e relatórios frequentes acerca do assunto.
Bem, por aquelas alturas havia os exames, e se na maioria o copianço resolvia a questão, nas orais, e a Inglês, era quase intransponível. Derrotado por esta dificuldade incontornável, pára o carro do Dr. Moura Pinheiro e dá-me uma boleia até ao Liceu. Então, pá, como vai a menina Constança ? E eu ó sr. dr, isto anda mal, agora vou para a oral de Inglês e é chumbo certo. De Inglês? é pá, eu sou o presidente do juri, diz-me o professor, e eu habituado ao desenrascanço, vi logo ali uma hipótese. Ó sr dr. podia ajudar-me, eu estudei bem aqui uns textos e o sr dr. escolhe um destes que eu li com mais cuidado. Qual?, pá? pode ser este dos desportos (ele ao fim de semana ía ver os jogos do Benfica e Castelo Branco, e eu era jogador do BCB).
Eh, pá, lês aquilo bem, pergunto-te qual é o desporto que praticas, se conheces outros desportos, por esta ordem, e andou…olha para mim, com ar maroto e eh, pá, tens que me contar como é isso dos bailes com a menina Constança.
Li o texto com impecável pronúncia Londrina, não percebi mas respondi às duas perguntas, e pode sentar-se, já cá cantava mais uma disciplina, com grande desespero do Beato e do Pratas que chumbaram mais uma vez.
E quanto à menina Constança ? Nunca lhe toquei o que não impediu a descrição de uns tangos “à maneira” braço enroscado na cintura delicada e ” cara na cara” à Buenos Aires!
PS. dedicado ao Beato e ao Pratas que já cá não andam.
A máquina do tempo: Sobre a canção urbana – o fado e o tango
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sei porque estou eu, qual musicólogo encartado, a falar de uma coisa de que nada percebo. Aqui no Aventar, sinto-me na mesa do café onde estamos à vontade para discutir tudo, desde o Borda d´Água ao «Capital» de Marx, passando pela música de Beethoven e pelo Triângulo das Bermudas . Hoje deu-me para o tango e para o fado. Podia ter sido bem pior. Ora vamos lá ouvir a María Lavalle.
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