Existe um instrumento linguístico, de comunicação, usado pela classe política, que se sustenta numa lógica já conhecida: quanto mais se falar de um assunto, mais se afasta o interesse por via da exaustão ou, pura e simplesmente, banaliza-se o que deveria ser importante. As pessoas ficam cansadas e desistem. Tanto mais que têm as suas difíceis vidas para viver.
Faz parte dos velhos manuais de táctica de guerra política, as duas principais manobras a fazer quando se quer pôr fim a um certo assunto incómodo: a par de uma outra: cria-se uma comissão de inquérito o mais complexa possível.
Nada de novo, portanto.
A isto, soma-se a manipulação de conceitos, de acordo com as conveniências.
E, assim, temos um jargão, usado e abusado.
Nos últimos 10 anos, nunca a classe política usou tantas vezes o termo “responsabilidade”, ora no singular ora no plural. Usou e usa sistematicamente o termo que define aquilo que nunca é devidamente apurado neste país: obrigação de se responder pelas acções próprias ou de terceiros, ou por aquilo que nos é confiado.
No entanto, não deve haver dia que não haja um político a falar de “responsabilidade”.
Como se pode ver num claro exemplo, partindo daquele mesmo termo, “responsabilidade”, sempre cheio de actualidade:
Aquando das eleições legislativas de 2005, o apelo do PS à maioria absoluta, para fazer face a “tempos difíceis”, foi insistente, e a fórmula era simples:
Maioria relativa = responsabilidade relativa.
Maioria absoluta = responsabilidade absoluta.
No fim de 4 anos de governação com maioria absoluta, ficamos com uma taxa de desemprego na ordem dos 10% (sem contar com os largos milhares que entretanto emigraram), uma dívida pública directa e indirecta asfixiante e um défice de 9,3%.
A “responsabilidade” é de quem?
Não, não é da maioria absoluta do PS. É da “crise do sub-prime”.
Mas só houve governação socialista?
Não, também houve governação social-democrata e com maioria absoluta. E nunca puseram o Estado com o peso certo nem cuidaram de assegurar que a economia nacional crescesse e conquistasse mercados importantes, antes apostaram muito em alcatrão e betão.
Então a “responsabilidade” também é deles?
Não, é só dos socialistas, porque são os que agora estão no poder. E porque no passado houve quem fugisse do “pântano” em que o país tinha caído durante a sua própria governação.
E nos sociais-democratas ninguém fugiu?
Sim, logo após umas eleições para o Parlamento Europeu, rumo a um cargo que iria dar muito prestígio a Portugal na União Europeia. Embora a imagem do país na União não pareça ser a melhor.
Afinal de quem é a tal “responsabilidade”?
Do outro. É sempre do outro.
Percebem agora como funciona o jargão político?
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