Francisco Manuel Lumbrales Sá Carneiro nasceu em 1934 no Porto, morreu em 4 de Dezembro de 1980 em Camarate, concelho de Loures.
Licenciado em Direito, exerceu advocacia na comarca do Porto. Entre 1969 e 1973, integrou a Assembleia Nacional, como Deputado independente da Ala Liberal. Foi um dos fundadores do PPD, em 1974, e o seu primeiro Presidente.
No I Governo Provisório, foi Ministro Adjunto sem Pasta. Tentou desde cedo «clarificar» a situação política, vincando, em Novembro de 1975, que era possível e mesmo necessário governar sem o PCP. Esteve na Assembleia Constituinte e foi eleito Deputado nas 2 primeiras Legislaturas da Assembleia da República.
Em 1979, criou a AD, juntamente com o CDS e o PPM. Nas eleições legislativas de 1980, vence com maioria absoluta e torna-se o Primeiro-Ministro. O seu Governo, o VI, ficou marcado pelas difíceis relações com o Presidente da República, Ramalho Eanes.
Ao mesmo tempo, era alvo de fortes críticas de parte da sociedade portuguesa, então muito conservadora, pelo facto de estar separado e a viver com outra mulher.
Fez o último discurso na Assembleia da República no dia 22 de Novembro de 1980, solicitando um voto de confiança ao Governo:
«O Sr. Primeiro-Ministro (Sá Carneiro): -Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao apresentar o pedido de um voto de confiança, o Governo tinha a consciência de que cumpria os seus deveres perante o Parlamento e de que contribuía assim para o prestígio da instituição parlamentar.
O Sr. Manuel Moreira (PSD): – Muito bem!
O Orador. – Não esperávamos, evidentemente, encontrar aqui uma oposição eufórica ou entusiasmada, dado que no dia 5 de Outubro ela fortemente definhou: definhou o PCP, definhou o MDP/CDE e até a FRS teve menos votos do que o Partido Socialista.
Sabíamos não encontrar uma maioria triunfalista, porque não o somos na Aliança Democrática, e sabemos interpretar e assumir uma grande vitória eleitoral como a de 5 de Outubro mais como uma responsabilidade acrescida face à nossa geração, ao nosso povo, ao nosso país e à comunidade internacional, do que como motivo de triunfalismos ou tentativas de esmagamento que nunca saberíamos praticar, mesmo nós que fomos objecto de tentativas de esmagamento quando outros estiveram no Poder.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
Mas não supúnhamos encontrar aqui uma oposição tão ressabiada, tão recalcada-de facto, isso foi uma surpresa. E deixando ide. lado afloramentos de recalcamentos mesquinhos de que importa não curar, debrucemo-nos sobre o significado do recalcamento político da oposição que aqui aflorou.
Não foram manifestamente razões constitucionais, porque mesmo certos rabugentos ayatollahs da Constituição…
Risos do PSD, do CDS e do PPM.
… não conseguiram apresentar argumentos válidos para atacar a nossa iniciativa no plano constitucional, pese embora àqueles que, esquecendo a Constituição a que tanto se dizem afeiçoados, nos vieram há pouco dizer que uma moção de confiança tinha de ter como substrato aquilo que o Governo se propunha fazer, quando a Constituição diz claramente que a moção de confiança incide sobre uma declaração de política geral, que eu fiz aqui anteontem como Primeiro-Ministro.
Aplausos do PSD, do CDS s? do PPM.
Não foram frustrações constitucionais as razões do ressabiamento e do azedume da oposição-e o Sr. Deputado Ferreira do Amaral há pouco já falou nas razões desse azedume.
O que à oposição doeu – e aqui se traduziu – é que o Governo não se tivesse demitido, porque ela queria que assim fosse para oferecer ao seu candidato a oportunidade de uma procissão para formar Governo, de uma cerimónia de propagando eleitoral presidencial, e foi por isso que a aposição tanto protestou porque o Governo não se demitiu e o seu candidato não pôde ter mais essa cerimónia abusiva de propaganda eleitoral presidencial. Eis a razão.
Aplausos do PSD. do CDS e do PPM.
A oposição também queria – e viu frustrados esses seus desígios- transformar este debate num debate de campanha presidencial. Acusam-nos agora do contrário, o que é, pelo menos, risível. Pois não foi um Sr. .Deputado do Partido Socialista que disse aqui, salvo erro no primeiro dia, que o que verdadeiramente estava em jogo neste debate eram as eleições presidenciais? Acaso não o terão ouvido os seus colegas de bancada? Isso era o que o oposição queria e é o que nós não fizemos.
E esses recalcamentos e esse azedume foram a tal ponto que em relação a um partido cujo líder disse em 1975 que Portugal jamais seria uma democracia parlamentar – podemos compreender que esta moção de confiança, acto parlamentar, o tenha de tal modo incomodado, mas já não se percebe tão bem que da banda do Partido Socialista, no entusiasmo do apoio presidencial, se tenha dito, saltando por cima do marxismo-leninismo e indo direito ao banquismo, que o que contavam não eram os votos – disse-o esta manhã o Sr. Deputado Almeida Santos. Se não foi,como não foi, um lapsus linguae, foi, com certeza, um lapsus presidencialista.
Risos do PSD, do CDS e do PPM.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: De facto, não são as eleições presidenciais o que está em causa neste voto de confiança que o Governo solicita ao Parlamento. E ainda bem para a oposição, porque se fossem as eleições presidenciais o que estava em causa, quando chegássemos à altura da votação se calhar além dos votos da Aliança Democrática haveria alguns votos de outra bancada da oposição.
Aplausos do PSD. do CDS e do PPM.
O Governo agiu dentro da Constituição, segundo a praxe que é possível, corrente, aconselhável e, tal como disse no primeiro dia deste debate, segundo o que aconselhava o interesse nacional e o pragmatismo. Acusar esta ataúde de cesarismo é realmente querer desfigurar completamente a realidade. Não ouvimos aqui esta manhã o Vice-Primeiro-Ministro lembrar que num regime parlamentarista puro como é o da Grã-Bretanha, o Governo não se demite depois das eleições se estas confirmarem a maioria anterior?
E, a propósito de cesarismo, tanto ouvi dele falar aos Deputados do Partido Socialista que me lembrei do que este partido em matéria de cesarismo dizia do general Eanes em 1978.
Risos do PSD, do CDS e do PPM.
Naturalmente estavam a pensar nisto, porque cesarismo não há nenhum da nossa parte, mas sim uma atitude constitucional, democrática, correcta e prestigiante para o Parlamento, que assegura o exercício de funções de um Governo plenamente legitimado pelo resultado eleitoral de 5 de Outubro. As oposições pretenderam desfigurar o debate, mas não as acompanhamos nessa linha e a resposta que lhes damos não pode deixar de ser irónica: assegurar a estabilidade, continuar o progresso, desenvolver a justiça social, unir os Portugueses. E tivemos condições de estabilidade do Governo da Aliança Democrática nestes meses passados -estabilidade política e social- e resultados concretos. Foram aqui postos em causa alguns casos, mas recordarei apenas que nos últimos dez meses, desde Dezembro de 1979, o índice de preços do consumidor sofreu apenas um aumento de 9,2 %, o que equivale a uma taxa anual de 11,1%. O desemprego de que aqui também se falou diminuiu, pois os pedidos de emprego nos últimos nove meses, até Setembro deste ano, diminuíram, .passando de 305,7 milhares em Dezembro de 1979 para 269 milhares em Setembro. As ofertas de emprego no mesmo período passaram de 7,5 milhares para 13,4 milhares, quase o dobro. Em Dezembro de 1979 o total de desempregados estimava–se em 344 008, l % da população activa, e no final no l.º semestre a taxa de desemprego tinha baixado 0,5 %, situando-se em 7,6 %.
Não me vou alongar na citação de mais números nem em outras análises económicas e sociais, porque o tempo é escasso e cumpre concluir.
Aqui se ouviu dizer da parte de uni deputado do Partido Comunista, visito que praticamente não falou de outras coisa a não ser de eleições presidenciais, que era quase certa a vitória do general Ramalho Eanes à primeira volta. É evidente que não se pode deixar de sorrir quando, vindo do mesmo partido da parte do Sr. Carlos Brito, apresentado como candidato, se ouviu dizer no último fim de semana que havia um perigo sério da vitória do general Soarres Carneiro à primeira volta
Muito se quis aqui pôr em causa a comunicação social. É uma táctica habitual das aposições quando pressentem a derrota. Já o haviam feito antes de 5 de Outubro, continuam a fazê-lo agora e mais ou menos no mesmo esquema que se tem reproduzido a propósito de outras situações: primeiro fala o Partido Comunista, depois segue o Conselho da Revolução e depois o Sr. Presidente da República reforça a mesma tecla. É a isso que temos assistido a propósito da comunicação social, o que também nada augura de bom para o candidato apoiado pelas aposições.
Foi-se ao ponto de criticar -permita-se-me essa nota- a ausência do Primeiro-Ministro, e isto da banda de quem, se olhasse para a sua bancada, veria que os seus leaders parlamentares ou o seu leader partidário máximo pouco tinha aqui estado presente.
O Sr. Vital Moreira (PCP): -Este cavalheiro está a perder qualidades!
O Orador: – Mas isto são pormenores a que não se devam sequer certas rabujices de quem não tem coragem de dizer as coisas frente a frente e na altura própria.
Aplausos do PSD. do CDS e do PPM.
Importa concluir, descurando aquilo que outros vão dizendo entredentes e as frustrações aqui expressas, com a seriedade e elevação que o Parlamento merece e que a maioria justifica e que aqui praticou. Essa é a responsabilidade que temos para com o nosso país: continuar com a confiança do Parlamento o caminho de segurança, de estabilidade e de modernização, trabalharmos sem demagogias, sem atender às provocações que nos vão lançando pelo caminho, com os olhos postos, acima de tudo, na nossa qualidade de portugueses, no nosso país e no bem de todos os Portugueses.
Assim faremos se a Assembleia nos der a sua confiança.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
O Sr. Presidente: – Srs. Deputados, encerrado que está o debate do voto de confiança solicitado pelo Governo, cumpre fazer a suspensão estabelecida por consenso e que será de trinta minutos.»
Nas vésperas das eleições presidenciais, no dia 4 de Dezembro de 1980, partiu para o Porto, numa acção de apoio ao General Soares Carneiro, que concorria contra Eanes.
O avião em que seguia caiu pouco tempo depois da descolagem, em Camarate, matando todos os tripulantes. Para além dele próprio, faleceu o Ministro da Defesa, Adelino Amaro da Costa, a sua companheira, Snu Abecassis, e outras 5 pessoas. Até hoje, não ficou cabalmente esclarecido se o acidente constituiu apenas isso ou foi provocado por uma bomba no interior. A segunda hipótese parece ser a mais provável, mas a ser assim, o alvo não terá sido ele, mas antes o Ministro da Defesa.
A sua trágica morte valeu-lhe, na história do Partido, um estatuto de mito e um exemplo cuja herança todos os candidatos a líderes se esforçam por reivindicar para si próprios.
Parabéns. Biografia breve, correcta, sem alterar factos históricos.