Como homem de Esquerda, no Domingo, gostaria de comemorar duas coisas eventualmente incompatíveis: a derrota do socratismo e a inexistência de uma maioria absoluta PSD-CDS.
Se, do ponto de vista programático, pode haver diferenças entre o PS e o PSD e o CDS, na prática, os seis anos de socratismo foram anos de políticas de direita, pelo que não há diferença nenhuma entre estarem uns ou outros no poder. Aliás, PS e PSD souberam entender-se imediatamente, quando foi preciso escolher o caminho das políticas que estão, agora, plasmadas na troika, o texto que, na realidade, corresponde ao programa de governo de qualquer um dos dois partidos.
O PS tem mantido, ao longo dos anos, uma divisão de personalidade, virando à direita, quando governa, mostrando-se de esquerda, na oposição. O socratismo manteve essa característica, mas foi muito mais longe na apropriação dos aparelhos de Estado e do aparelho partidário, com base em clientelismo, em incompetência (quando não má-fé) e em mediocridade. Aliás, se o PS perder, mesmo que Sócrates se demita (o que não está garantido), o cheiro perdurará por muito tempo. Não me apetece imaginar o que será se ganhar.
É certo que a vitória do PSD não me preocupa menos, pois também já deu provas sobejas de incompetência em tempos idos, bastando lembrar que devemos a Cavaco Silva, entre outras benfeitorias, a destruição das pescas e da agricultura. Mais recentemente, pudemos confirmar a falta de carácter de Durão Barroso e o apoio desastrado a um desastrado Santana Lopes, com o CDS a manter uma reserva cínica que não disfarça a cumplicidade.
Os votos que forem para o Bloco e para o PCP enfraquecerão o PS, é verdade, mas o PS e a Esquerda serão derrotados pelos votos flutuantes do centro que Sócrates terá, finalmente, afugentado. A clique socrática mostrou incompetência e arrogância, afastando-se da Esquerda e afastando, também, eleitores de Esquerda.
No Domingo, festejarei a derrota de Sócrates e lamentarei a vitória da Direita, o que trará uma melhoria relativamente às duas últimas eleições em que lamentei a vitória de Sócrates e a da Direita. É fraco consolo, mas já não é mau se mudarem as moscas.
Resta à Esquerda, enquanto não chega ao governo, vigiar e protestar, ao mesmo tempo que deve reflectir sobre os seus próprios erros, erros de forma e de conteúdo. Resta à Esquerda continuar a preocupar-se com os direitos sociais e laborais, esse empecilho para o capitalismo desavergonhado que governa o mundo de braço dado com a especulação descontrolada e com os defensores dos privilégios dos que sempre foram privilegiados.
Qualquer voto no Bloco de Esquerda ou no Partido Comunista é, portanto, um voto útil. Qualquer outro voto é um voto na Direita.
Completamente de acordo.
Como eu me arrependo de não ter votado em Ferreira Leite… ao menos era direita que nos aguentava. Acho eu. Melhor que estes dois… ou três.
Quando é a esquerda põe as cartas sobre a mesa e nos informa o que é que fariam ao país se porventura tomassem o poder? Saiamos da EU e da Nato? O que acontecia à propriedade privada? O que acontecia aos Bancos, aos empresários? O que é que aconteceria à oposição? E à democracia? E à Constituição? E à liberdade? E à Igreja? Legalizava o consumo e o tráfico de droga? E à Justiça, e à Administração Interna e ao Sistema Prisional? E à imigração?
Desconfio de que o Artur julga saber as respostas para essas perguntas todas. Espero que é que a Esquerda nunca tome o poder e que chegue lá através de eleições.
Entretanto, foi fácil ver o que a Direita tem feito no poder: obedece na UE e na NATO; ataca o sector público e defende os privilégios dos privados; não fiscaliza os bancos e os mercados; faz tudo para não cumprir a Constituição e para retirar direitos e liberdades aos desfavorecidos; baixa a cerviz diante da Igreja. And so on…
Por não saber a resposta é que perguntei. Mas pensei que a esquerda soubesse. Esqueça por um minuto os defeitos da direita.
O que lhe pedia é que me desse um vislumbre de um day after esquerdino. Quais são os projectos que vocês têm para nós? Como é que nos iriam proporcionar a felicidade, a justiça, a liberdade e a fraternidade?
Num país que é governado quase ininterruptamente pela Direita desde 1926, é difícil esquecer os defeitos e esteja descansado que, apesar de tudo, consigo distinguir Ditadura de Democracia, pelo que não estou a meter Salazar e Cavaco no mesmo saco.
Com a Esquerda, pode contar, pelo menos, com a negação de todos os defeitos que apontei à Direita. Embora eu não seja a Esquerda, lá vai a minha opinião:
– Não me parece que seja possível sair a correr da NATO e não me parece aceitável sair da UE (o que, aliás, já foi afirmado pelo Louçã);
– a propriedade privada deve ser respeitada, mas os privilégios abusivos devem ser fiscalizados e combatidos;
– os bancos e os empresários devem ser obrigados a contribuir para o bem comum e devem ser obrigados a respeitar os direitos dos trabalhadores;
– a democracia, a Constituição e as liberdades têm se ser respeitadas;
– deve haver liberdade de culto e não deveria haver nenhuma disicplina de Moral e Religião nas escolas do Estado;
– a legalização de tráfico e de consumo tem dado bons frutos nos países em que foi adoptada;
– a Justiça tem de ser célere e rigorosa e o sistema prisional deve ser simplesmente rigoroso e humano
– a imigração é um factor de enriquecimento de um país: o principal é incluir e não rejeitar.
– não se deve comer crianças ao pequeno-almoço ou matar velhinhos com injecções atrás da orelha.
O meu receio é precisamente este: a esquerda não é você, ou seja a esquerda não têm no seu seio apenas pessoas moderadas como me parece ser o seu caso. Infelizmente, no século passado, sempre que a esquerda assumiu a liderança do rebanho, os moderados foram depressa perseguidos ou desautorizados. A esquerda é muito permeável à tentação de abusar do poder. Nem você nem nenhum dos intelectuais de esquerda nos podem garantir que a esquerda em Portugal seria diferente.
A esquerda funciona bem enquanto for uma espécie de DECO. Agora governar, seria certamente uma catástrofe.
A maioria das ditaduras surgiram através do aproveitamento do apoio popular a grupos que defendiam causas justas e importantes, tais como aquelas que enunciou no seu comentário. Depois de alcançado o poder, a musica foi outra.
Vejo que o caro Artur não é nem uma pessoa viajada nem uma pessoa culta. Acontece que a esquerda funciona bem no governo. Para dar um caso mais concreto e digno, aponto o caso do Chipre, onde está um PC no governo já há um tempinho e onde o Presidente da República é um militante desse mesmo PC e um ex-secretário-geral. Por isso, se calhar, antes de pôr a cassete da má e feia esquerda a tocar, sugiro que faça um upgrade, já nem digo para MP3 que é capaz de ser demais para o Artur, mas para CD ou DVD… Vai ver que, com um pouco de sentido crítico e uma pesquisa mais aprofundada, vai gostar de aprender mais sobre essa coisa estranha que é a esquerda.