A catequese e a sexualidade infantil. Um manifesto

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Hoje em dia sabemos a verdade. Sacerdotes célibes abusam às crianças. Antes, sem saber deste latrocínio, deste abuso ou crime de pedofilia, escrevi isto.

No seu texto inédito Pragtamisme et Sociologie, (manuscrito na minha posse) proferido na Universidade da Sorbonne de Paris, durante o ano de 1913-1914, o velho socialista e materialista histórico, Émile Durkheim, comentava que os velhos deuses estavam mortos e que a religião estava em vias de mudança.

Mas, acrescentava, nem tanto assim, porque todo o ser humano precisa de ritos, ideias, ética, interação moral, orientação na criação dos seus descendentes. Donde, a Religião, seja ela qual for, pelo menos define as relações emotivas e pedófilas (o meu acréscimo) entre pais e filhos, voir mães, pais, filhos, filhas. A nossa língua não tem ainda um conceito para designar estas relações, apenas excepto ascendentes e descendentes, palavras sem música e indefinidas. Era o que eu pensava antes de saber da existência da pedofilia[1], incesto[2] e adultério[3], que não são definidas na catequese, por conveniência de sevicio.

Nem o Catecismo de Wojtila, 1992, menciona esta atividades criminosas, excepto o adultério. Max Weber entre 1904 e 1915, ocupou o seu tempo em definir esses conteúdos entre Xiitas, Budistas, Luteranos, Calvinistas, Cristãos Koptos, Cristãos Arménios, Cristãos Romanos. E são estes os que nos interessa entender melhor, por sermos, por um lado, um País em debate sobre a educação sexual da infância, e por outro, um País de Concordata entre o Estado Vaticano e o Português. E, no entanto, os cristãos romanos falam pelo seu grupo nos lugares de mando, sem separarem o seu dogma dos interesses da população. Bem sabemos que se ensina, como optativa, uma disciplina que pode ser ou Educação Cívica ou Estudos Religiosos, como sabemos também que a Igreja Romana tem decidido ensinar as suas ideias conforme são decretadas no Vaticano. Os Cristãos Romanos não podem pensar na forma de serem pais, ou ainda, se querem ou não sê-lo.

Desde 1566, quando o Papa Pio V publicou o Catecismo de Trento, a família passou a exemplo do que fizeram Martinho Lutero, o Rei James Tudor da Inglaterra e Jean Calvin, uma regulamentação obrigatória, escrita em línguas faladas pelo povo e ensinadas ao povo desde o primeiro dia do seu entendimento. Diz o Código de Direito Canônico de 1983, no cânon 97, # 2, que toda a criança tem uso de razão, a partir dos sete anos de idade, logo, tem deveres[4]. E esse primeiro dever está definido nos artigos 2196 até ao 2246, incluindo – no artigo 2201- dentro dos deveres de família, como a base da união da vida social, a semente da interação, a obediência à autoridade civil, porque à Eclesiástica já está dita no Capítulo II do catecismo denominado da Igreja Católica, artigos 50 a 68, com minúcia e muita história sintética. Estes artigos não dão muita opção à liberdade individual, tal como ela é definida pelo mesmo texto e pelo de Direito Canónico, que define obedecer ao Código Civil e aos outros Códigos que governam as nossas vidas, artigos 1877 a 1917, com minúcia também.

Nada escapa à gestão da vida social para os teólogos que organizaram este, como outros, catecismos, para a sua conveniência libidinal. Assim, pergunto-me, porquê Françoise Dolto, essa terapeuta falecida recentemente, escolhe falar num dos seus livros, L’Évangile aux risque de la psychanalyse, Seuil, 1977, da parábola do Filho Pródigo que Lucas no capítulo XV do seu Evangelho, Versículo 11 a 32 reproduz como imitação de Jesus: o filho mais novo vai embora, pede ao seu pai a sua parte de bens, delapida-a, e volta a casa pobre e mal ferido; o pai faz uma festa para o receber que, o irmão mais velho critica ao dizer que ele trabalhou e nunca desobedeceu nem fugiu e não é comemorado. O pai diz que  ama-lo, mas que o filho que voltou, é a ovelha recuperada para o redil. Como as crianças abusadas, os abusadores estão, com justiça, em tribunal. De facto, Françoise Dolto analisa com cuidado as semelhanças entre o pai e o filho mais velho, o tempo largo gasto juntos, com objetivos de vida e trabalho serem semelhantes, e, por ser justo e verdadeiro, reconhece no filho que volta, a sua própria maneira de agir, de responsabilidade retomada e que o mais velho não tinha por causa de ser silencioso e subordinado, sem uma ponta de debate com o seu adulto. Dolto escolhe Lucas, Wojtila o João Paulo II e os seus teólogos, escolhem Mateus e Paulo de Tarso para falar de família, obediência, subordinação. Mas, os delitos são ocultados, excepto Freud em 1906 e 1923. Aliás, Wojtila define o bem como comum desde que todo seja feito como Barnabé diz na Epistola 4, parágrafo 1: no vivais isolados…como se já fosseis justificados;reuni-vos para procurar em conjunto o que é de interesse comum; ou na Encíclica Gaudium et Spes de Paulo VI, dos anos 60 do Século XX: o direito de agir conforma a própria consciência, direito à salvaguarda da vida privada e à justa liberdade, mesmo em matéria religiosa? Donde, um bem comum contraditório, como contraditória é a rejeição ao Socialismo e ao Capitalismo, Artigos 2425 a 2443, que desdenha formas económicas de mais-valia, embora aprove a propriedade privada, manda aos ricos a assistir aos mais pobres, sem mandar repartir os recursos entre todos. Vida sexual? Até há pouco, o catecismo usado era o de Montini o Paulo VI, porque o de Wojtila admite o amor entre pessoas do mesmo sexo, apesar de definir que a intimidade sexual é para fazer filhos; não pune a masturbação que, durante Séculos, era o pecado mais confessado, e não condena o amancebamento, ou seja, viver em união sem o Sacramento do Matrimónio. Mas de pedofilia e de incesto, ninguém fala, melhor dizendo, ninguém  atreve-se a falar.

O que entendem as crianças deste conjunto de contradições, sem contar com as carícias dos celibatários que lhes ensinam o que é mais conveniente para a vida do grupo social em que habitam. Esta conveniência vê-se logo na comemoração de Fátima e o esquecimento da Imaculada Conceição, padroeira de Portugal, desde que a guerra da recuperação da Liberdade e Soberania Portuguesa, ganha em Vila Viçosa, história que poucos parecem conhecer, por Fátima ser um sentimento e a Imaculada, um facto. O meu maior medo é esse: o ensino da lógica de História, que denomino religião, por pessoas entregues a predefinições, dogmas de fé, ideias nunca provadas e ensinadas a crianças cujo dever, dizem os Romanos que nos governam, é a produtividade e o conhecimento para organizar empresas, sem referir a venda de filhos para pedófilos e ocultam o mais comum dos crimes, o incesto. Que o povo não ouve?

Mas, meus senhores, porque tivemos mais de duas semanas uma Assembleia da República a debater o que se ensina e quem? Que sabem os senhores deputados, de esquerda e direita, dos textos usados neste artigo? Como consideram os que devem curar, entender, tratar, dar argumentos, a religião? Será como essa frase de Feürebach de 1842? Será entregar-se a mãos desconhecidas, mas milagreiras, que fazem das rochas, pão? Frase do criador da psicanálise, que Freud soube usar como Dolto e outros e recuperar essa fraternidade e igualdade prometida a todos nós desde o começo da nossa era.

As crianças andam em péssimos lençóis se, pessoas como eu, ateias, não se interessam com as bases do pensamento cultural que incluem e permitem os crimes mencionados e abandonam o processo de ensino a hierarquias que a Concordata e os nossos poderes hierárquicos, mandam. Que não digo mais do sexo? Mas, não está ele dentro disto tudo, por acaso? Haja um Deus que nos proteja deste debates desinformados que a Assembleia usa para nos deixar nas mãos de uma teologia mais velha que o Concílio de Trento de 1542. Aos meus filhos, ensino eu: aprendem a pensar comigo e eu, com eles. É o que se devia discutir dentro dos poderes, antes de benzerem com a espada ou com a cruz. Apenas nos anos e que famosos da sociedade aparecem como pedófilos, é que a lei e os tribunais, como os fiscais, interessam-se nos cromes referidos, julga, leva o caso a tribunal e aos felones à cadeia e a tribunal, no julgamento mais cumprido da história do direito em Portugal.

A catequese é a atração dois mais novos, por meios de parábolas, para depois usar os seus corpos como satisfação erótica. Os pais que leiam este texto, atenção como o que acontece na transferência de saberes divinos e o erotismo que os mais novos acordam nos adultos. Será uma obrigação saber o catecismo num povo católico romano, mas, atenção com os abusos dos catequistas cristãos que abusam dos (as) catequizados. Pais que deviam antes entrevistar aos que ensinam e apenas depois, enviar ou não aos seus descendentes a aprender o estudar em colégios privados, como Salesianos e Maristas. Não sou eu quem julga, são os fiscais e os tribunais. Todos sabemos os casos, não é preciso distinguir. É dever de pais e mães, se são tão crentes, tomar atenção para onde enviam aos seus filhos a prender ou catequeses ou ciência.

 


[1] Em tese, define-se Abuso Sexual como qualquer conduta sexual com uma criança levada a cabo por um adulto ou por outra criança mais velha. Isto pode significar, além da penetração vaginal ou anal na criança, também tocar seus genitais ou fazer com que a criança toque os genitais do adulto ou de outra criança mais velha, ou o contacto oral-genital ou, ainda, roçar os genitais do adulto com a criança.

[2] Incesto é a relação sexual ou marital entre parentes próximos ou alguma forma de restrição sexual dentro de determinada sociedade. É um tabu em quase todas as culturas humanas, sendo por isso considerado um tabu universal. O incesto é punido como crime em algumas jurisdições, e é considerado um pecado pelas maiores religiões do mundo. Na maior parte dos países ocidentais o incesto é legalmente proibido —– mesmo que haja consentimento de ambas as partes.

[4] Grande engano. O que sabe uma criança de pedofilia ou de incesto? Podem brincar a ser pais e mães. O seu uso da razão não tem estes conceitos, daí é que a catequese usa aos mais novos para objetivos sexuais, como tenho observado na minha etnografia.

Comments


  1. pragmatisme? pragma… é que pragtamisme…

  2. Tito Lívio Santos Mota says:

    sempre achei que pior, muito pior que a proteção dada aos padres pedófilos, foi o facto de a defesa da família como exemplo inatacável de modelo de referência moral e social, ter conseguido esconder o facto de a maioria dos atos pedófilos terem lugar dentro das famílias.
    Ainda hoje, o impacto mediático de casos de pedófilos isolados postos em primeiras páginas e na abertura de telejornais (quando não começam pelo futebol, mas adiante) escondem o mais das vezes esse facto dramático.
    A pedofilia mais frequente e a mais difícil de combater passa-se no quadro familiar.
    Não que não se devam denunciar os “Casa Pia” e outros casos escandalosos e retumbantes. Mas se estes servem para dar uma falsa ideia do fenómeno (do crime) então torna-se urgente rever a maneira como são tratados tais casos e a maneira como a nossa sociedade acaba por abandonar a maioria das vítimas em nome do “sagrado” da família.

    Tito Livio Santos Mota
    PS: continuo à espera que rebente enfim o escândalo da pedofilia existente em orfanatos católicos como a Casa do Gaiato.
    sabe-se que são realidade mas, estranhamente, nunca mais saem ao conhecimento público.

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