Portugal ainda é, em grande parte, Coimbra e o resto é paisagem. Bastava alguém envergar uma capa e uma batina para passar a ser doutor. Uma pessoa podia andar matriculada anos a não estudar e isso seria suficiente para se ser doutor. Ainda assim, nesses tempos, a expressão “tirar um curso” significava ‘concluir uma licenciatura’.
A licenciatura é, ainda hoje, meio caminho para um orgasmo. Há pessoas que perdem força nas pernas e reviram os olhos, sempre que ouvem o nome antecedido de um “doutor”. Não me espantaria que existisse uma tara sexual qualquer que consistisse em alcançar o clímax por ouvir menções a títulos académicos. Aposto, até, que, nos prostíbulos, haverá quem o exija, do mesmo modo que há quem goste de ser insultado ou agredido fisicamente (conta-se mesmo que, no auge, mais de um cliente terá gritado eferreá em vez de chamar por algum ser superior).
E é natural que uma pessoa, de tanto pagar para ouvir, até possa convencer-se de que entrou numa casa para obter favores, sexuais ou outros, e tenha saído de lá licenciado. Ora, se há casas que são conhecidas pelo pagamento de favores, sexuais e outros, são as sedes e as delegações dos partidos políticos.
Ser político é, aliás, a capa e batina de hoje: entra-se na política e, por defeito, passa-se a ser doutor. Além disso, o esforço que um jotinha faz para entrar numa universidade (acto diferente de entrar para a universidade) já é tão grande que merece, no mínimo, uma equivalência. A universidade, com todos os seus defeitos, é um local em que existem livros e pessoas a investigar e a pensar, actividades que esgotam um jotinha só de imaginar.
Mesmo assim, tendo em conta o prestígio e o gozo, há jotinhas que tentam obter diplomas universitários, havendo notícias de um que chegou a ir a uma aula. Os mais inteligentes, no entanto, passam por umas universidades privadas, dirigem-se ao balcão e tiram de lá um curso.
Antigamente, um curso superior era pior que uma lapa: uma pessoa saía da universidade e ficava licenciada para sempre. Hoje, há gente tão distraída que até perde licenciaturas e mestrados. Talvez isto se deva à fraca qualidade da roupa: um homem vai pela rua, com a licenciatura no bolso e aquilo cai no chão. Quando volta atrás, que ainda agora tinha aqui um curso, já não o encontra, porque as pessoas não são sérias e ficam com o que até era dos outros em vez de irem entregar à esquadra mais próxima.
É por distracções destas, perfeitamente naturais, que um adjunto de Costa pode ter confundido quatro cadeiras com um curso e que um chefe de gabinete talvez tenha pensado que não ir à universidade dava direito a duas licenciaturas.
Assim, a expressão “tirar um curso” passou a ter outro significado: hoje, significa tirar o curso do currículo onde tinha sido posto.
O meu grande medo, neste momento, tendo em conta que sou tão distraído como um jotinha, é descobrir que, afinal, não tenho uma licenciatura. À cautela, já peguei nas minhas habilitações e fui escondê-las num armário, não venha alguém tirar-me o curso.
De qualquer modo é absurdo chamar doutor a uma pessoa que concluiu uma licenciatura. Já isso sempre foi um indicador do gosto português pela bajulação.
Apesar do artigo falar de uma coisas relevante, começar com Portugal é Coimbra e o resto é paisagem é um tiro no pé, é bairrismo exagerado…. Se Coimbra desaparecesse por artes ocultas, nem se ia notar muito…
A culpa pode ser do autor do texto, pessoa que até é das minhas relações, mas fiquei com a impressão de que, neste caso, Coimbra é a origem do mau hábito de dar demasiada importância aos títulos académicos. De qualquer modo, não há como um tripeiro para imaginar bairrismos.
Acuso o toque do bairrismo, mas isso é um mecanismo de defesa contra o centralismo bacoco. Como diria alguém que nºo me recordo, o Porto (e o resto do país) só esteve bem quando Lisboa está mergulhada na confusão. E de facto, é por causa de Coimbra ter tido durante demasiado tempo o monopólio do ensino superior que se gerou a demasiada importância ao Doutor. Foi mau para o País, e também para Coimbra, que continua presa à tradição e uma imagem mítica de cidade do conhecimento e da tradição que já morreu… Afinal, os descobrimentos ocorreram com a Universidade em Lisboa…
Ora ainda bem que acusou o toque: sou um coimbrão que vive e trabalha, há mais de vinte anos, no Grande Porto. Como, ainda por cima, na minha adolescência, saltei de cidade em cidade, aprendi, talvez por defesa, a ver sempre o copo meio cheio, ou seja, as coisas boas de cada sítio. Por isso, apesar de gostar muito da cidade em que nasci e em que viria a estudar no Secundário e no Superior, não tenho nada de bairrista. No que respeita à (auto-)imagem das pessoas que têm (ou gostariam de ter) estudos superiores, Coimbra, com todos os seus encantos, é uma espécie de maldição, mas a História de qualquer país é feita de maldições como esta, o que não nos impede de dizer mal e de conhecer. Pelos vistos, veja lá, estamos de acordo 🙂
Há 40 anos que chegou a Gabriela, e desde então a principal fonte da cultura têm sido as telenovelas brasileiras. Doutor é sinónimo de pessoa poderosa, endinheirada, ou aldrabona.
E o governo dá o exemplo.
Os governos e as televisões nacionais desistiram da cultura portuguesa.
Por isso fizeram o Acordo Ortográfico, para sincronizar a escrita com o país da telenovela.
Com a demissão de Dilma, pudemos ver o nível de alguns dos eleitos, deputados e candidatos políticos brasileiros, e pudemos concluir que estamos a aproximar-nos rapidamente do nível brasileiro.
Quando os partidos do “arco” são meras associações de delinquentes, a tentar subir na vida, é inevitável que os governos se transformem em bandos de incompetentes, desonestos e irresponsáveis, organizados para roubar o país e o estado.
O Primeiro Ministro devia aproveitar os conselhos do BE e do PCP, para ir saneando o PS e o Governo. O risco é não sobrar ninguém.
Compreende-se o sentido do texto com uma critica politica/social oportuna realizada à mentira sobre habilitações académicas.
A mentira é sempre uma mentira e desde logo socialmente condenável.
As notícias políticas recentes estão relacioandas com dois casos deste tipo.
Ora, no caso a falta de verdade beneficiou os “infratores” porque se arrogaram de um “estatuto” que realmente não tinham.
Assiste-se em Portugal a um exagero quanto ao uso deste estatuto.
Contudo não me choca que quem é licenciado e como prevê, creio as normas possa usar o “título” de dr.
As pessoas honradas não podem ser confundidas ou prejudicadas com este tipo de situação do uso indevido de habilitações que não se tem.
Atenção aos interessados, no caso do chefe de gabinete do Sec da Juventude e desporto, Nuno M. A. Félix, o despacho de nomeação (Despacho 7248/2016, de 02/06/2016) é claro no que toca às habilitações do senhor em causa: frequência dos cursos A e B. Se se demitiu foi para não ver o seu nome enxovalhado por jornais que não prestam nem para embrulhar castanhas. Fez mal o Sr. Nuno Felix..